Médicos unidos em forte greve para salvar as carreiras e o SNS
A greve convocada pela Federação Nacional dos Médicos (FNAM) começou com 95 por cento de adesão, demonstrando «unidade avassaladora» por «um plano de emergência para salvar as carreiras médicas e o SNS».
Esta política de Saúde provoca uma fragmentação progressiva do SNS
Anteontem, dia 1, o arranque da greve foi assinalado com uma concentração junto do Ministério da Saúde, durante a qual a presidente da FNAM salientou que «o Serviço Nacional de Saúde não pode esperar mais». Joana Bordalo e Sá, em declarações aos jornalistas, reafirmou as críticas à proposta escrita, que o Governo finalmente enviou às organizações sindicais, na madrugada de 27 de Julho, e rejeitou também o prosseguimento das negociações no mesmo formato, que não propiciou nenhuns avanços nos 15 meses já volvidos.
A concentração, com centenas de médicos, acompanhou a entrega no Ministério de um documento com os princípios da contraproposta da FNAM, «à altura das necessidades dos médicos e do SNS». Como a federação salientou, num comunicado que emitiu ao final da tarde, esses princípios contemplam «um aumento salarial digno, transversal, para todos os médicos e que compense a perda do poder de compra da última década e a inflação», um horário semanal de 35 horas, a reposição das 12 horas semanais como horário normal em serviço de urgência, a recuperação do «regime de dedicação exclusiva, opcional e devidamente majorado» e a inclusão do internato no 1.º grau da carreira médica.
Na proposta do Ministério da Saúde, a FNAM tinha já deixado claro, a 31 de Julho, cinco pontos que merecem rejeição:
– manteras 40 horas semanais de trabalho, com aumento do limite diário para nove horas e«aumento ilegal do limite anual do trabalho suplementar para 300 horas (em vez das actuais 150)»;
– prever um «aumento irrisório do salário-base para a generalidade dos médicos» (entre 0,4 e 1,6 por cento);
– criar um regime de dedicação «que não valoriza igualmente todos os médicos» e que implica perda de direitos dos médicos e potenciais riscos para os doentes, «ao alterar os descansos compensatórios após o trabalho nocturno, nos médicos hospitalares, ou condicionando a prescrição de exames e receitas, nos cuidados de saúde primários»;
– manter 18 horas de urgência no horário normal, não deixando «tempo para as consultas e cirurgias de que os doentes tanto precisam»;
– incluir o trabalho ao sábado como actividade programada.
A FNAM lembrou que «os médicos em Portugal são dos mais mal pagos da Europa e com condições de trabalho cada vez mais precárias», enquanto «as políticas de Saúde actualmente em curso, a que se somam episódios onde a prepotência administrativa e o unilateralismo negocial falam mais alto do que o interesse público, resultam numa fragmentação progressiva do SNS».
A greve comprova«a unidade avassaladora da classe, nesta luta em defesa da dignidade que a profissão merece», e é«uma demonstração gritante da necessidade de um plano de emergência para salvar as carreiras médicas e o SNS», sublinhou a FNAM.
PCP solidário critica Governo
Uma delegação do PCP marcou presença na concentração, anteontem à tarde, reafirmando a solidariedade do Partido para com a luta dos médicos. Bernardino Soares, do Comité Central – acompanhado por João Pimenta Lopes, também membro do CC e deputado no Parlamento Europeu –, observou que os médicos «estão a defender os seus direitos e isso é justo, porque perderam remuneração real nos últimos dez anos». Numa breve declaração, notou ainda que «estão, como eles próprios dizem, a defender os direitos da população e a sobrevivência do SNS».
Já o Governo, «quando está a degradar as condições de trabalho no SNS, sabe que está a empurrar para fora dos serviços públicos mais médicos e também outros profissionais», o que «é muito negativo para o nosso País, para a população e, em particular, para aqueles só têm Saúde se houver SNS».
«A intransigência e obstinação do Governo PS, perante as justas reivindicações dos profissionais de Saúde, é uma deliberada opção de enfraquecimento do SNS», acusara o PCP, na véspera do início da greve. Numa nota de imprensa, o Partido contrapôs que «o Governo sabe que é possível garantir mais médicos e outros profissionais de Saúde no SNS», para o que bastaria «aprovar as propostas de valorização dos profissionais de Saúde que o PCP tem vindo sistematicamente a apresentar».
«Todas as propostas apresentadas até aqui pelo Governo assentam no aumento do número de utentes em lista, ou na dependência da remuneração de critérios de desempenho voláteis e incertos, ou na obrigatoriedade de aumentar o número de horas extraordinárias e o horário laboral, isto é, no aumento brutal da carga de trabalho dos médicos» afirma-se na nota de 31 de Julho.
O PCP considera que, «neste contexto, a apresentação pelo Governo de uma proposta de aumento da grelha salarial em 1,6 por cento, depois de muitos anos de perda real de salário, assume contornos de provocação para os médicos do SNS».
Para o SNS, os comunistas defendem«outra política, onde é essencial a valorização e a dignificação dos profissionais de Saúde, condição indispensável para garantir a todos o direito à Saúde que a Constituição consagra».