Liberalização da aviação: a quem serve?

João Pimenta Lopes

Na passada semana, reunimos com trabalhadores e a administração da NAV Portugal (empresa pública do Estado, com relevância estratégica na prestação de serviços de navegação aérea), em torno dos desenvolvimentos das negociações em curso sobre o terceiro pacote de liberalização da aviação, o Céu Único Europeu 2+. Uma proposta apresentada em 2013 e que tem encontrado resistências nos Estados, em particular pelo que compromete da soberania na gestão dos espaços aéreos nacionais.

Em 2019, o Parlamento Europeu relançou o debate renovando o mandato e relançando negociações. A pretexto de melhorias ambientais, optimização de rotas, e contrariar a pretensa fragmentação dos prestadores nacionais de serviços de navegação aérea (em Portugal, a NAV), o objectivo real é o a privatização destes prestadores e o aprofundamento do caminho de liberalização do sector da aviação.

A ser implementada, em Portugal, teria como consequência provável a privatização da NAV, separando o controlo do tráfego aéreo, que passaria a ser centralizado e atribuído por concurso, de outros serviços agora prestados como a operação das aeronaves em pista. Propõe-se ainda a criação de uma taxa única de rota (o valor cobrado por sobrevoo de um espaço aéreo nacional), prejudicial para a operação em Portugal que tem valores mais competitivos.

Acrescem, e de forma não menor, a perda de soberania nacional, com a concentração de poderes na Comissão Europeia e a perda de soberania sobre o espaço aéreo nacional, a par de riscos para a segurança, decorrentes da redução do efectivo operacional, com a perda de milhares de postos de trabalho no espaço aéreo europeu, além da degradação das condições laborais. Importa referir que a optimização de rotas e as melhorias ambientais sempre foram possíveis no quadro de convenções internacionais de aviação, nomeadamente da chamada Convenção de Chicago, garantindo adequados níveis de segurança, a fluidez do tráfego aéreo e a adopção de medidas de gestão do tráfego aéreo, congestionamentos e atrasos.

Se alguma coisa o processo de liberalização na aviação demonstra, com a concentração da operação em grandes operadores, visando companhias de bandeira como a TAP, ou os processos de privatização das infraestruturas aeroportuárias (em Portugal, a privatização da ANA à Vinci), é o prejuízo geral na operação, de que é exemplo o caos nos aeroportos no verão passado, ou os sistemáticos atrasos em terminal que a ANA/Vinci impõe à TAP, com prejuízos para a sua operação/reputação. Perdem os passageiros, perdem os trabalhadores do sector, perdem os Estados, ganham as grandes multinacionais e potências da UE.

A reversão do processo de liberalização e a recuperação do controlo público do sector da aviação confirma-se como sendo cada vez mais premente.




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