PS e partidos à direita recusam fixar preços dos bens essenciais
Fixar os preços de bens alimentares essenciais, visando pôr um travão na especulação, eis o sentido de um projecto de lei que o PCP submeteu no dia 12 à apreciação do Parlamento. O desfecho foi o chumbo às mãos de PS, PSD, IL e Chega.
A grande distribuição acumula lucros nunca vistos com a especulação
Com a criação de um regime de preços máximos, a aplicar a um cabaz de produtos tidos como base essencial da nossa alimentação, definido ficaria «um preço de referência para cada um dos produtos, com base nos custos reais e numa margem não especulativa, proibindo a venda a um preço superior sem justificação atendível», explicou na apresentação do diploma da sua bancada o deputado comunista João Dias.
Desta forma, explicitou, às autoridades públicas seriam conferidos «os meios necessários para intervir sobre as margens e os preços praticados pela grande distribuição». Margens e preços que são, no fim de contas, os dois principais factores responsáveis quer pelo «duro golpe no rendimento disponível dos portugueses», quer pelo esmagamento dos «preços pagos aos produtores e que aniquilam o pequeno comércio».
Esta era assim uma medida do maior alcance que seguramente ajudaria a melhorar a situação dos trabalhadores e da generalidade da população, confrontados que estão com um aumento brutal do custo de vida, derivado, por um lado, da vertiginosa subida de preços – a maior dos últimos 30 anos -, e, por outro, da «queda, em termos reais, dos salários».
Dura realidade a que todavia não se mostraram condoídas as bancadas que inviabilizaram a proposta comunista. Foi sobretudo chocante a postura inconsequente da bancada do PS, com um discurso mistificador e farisaico – «o combate à inflação e a mitigação dos seus efeitos constitui um vector fundamental da estratégia da acção do Governo», disse o deputado Sérgio Ávila – a não bater certo com a argumentação de que as propostas em debate (além da comunista esteve uma do BE, também chumbada) «não têm consequência prática sobre os preços de bens transacionáveis». Descartou assim qualquer fixação dos mesmos sob a alegação de «que em mercado global» uma tal medida «não tem nenhum efeito». Tese compartilhada por todas as bancadas à direita do hemiciclo.
Razão teve João Dias ao afirmar que o Governo, em vez de ter uma intervenção decidida na regulação dos preços dos bens essenciais, bem como dos serviços essenciais, «opta por assistir como se de uma múmia se tratasse à perda do poder de compra dos portugueses, favorecendo e deixando que a especulação galope, contribuindo para a acumulação de lucros fabulosos e para a distribuição de dividendos, exibidas pelos grupos económicos como se de troféus de tratassem».
Sobe tudo, menos os salários
Sistematizado por João Dias foi o quadro de aumentos de bens e serviços essenciais que tem agravado as condições de vida dos trabalhadores e da população em geral. À cabeça surgem destacadas as subidas dos preços dos produtos alimentares, que aumentaram em média 18,9%, mas também os produtos energéticos e outros serviços fundamentais, cujo aumento atingiu os 23,7%.
As estimativas apontam, no caso do cabaz de alimentos essenciais, para ter havido um aumento em média entre o início e o final do ano passado de mais 33,51 euros, ou seja, de 183 euros passou para 217 euros.
Aumentos que nalguns produtos atingiram percentagens exorbitantes, como sucedeu, entre outros, com o arroz carolino ( 53%), a polpa de tomate (64%,), a alface (42%), a cenoura ( 42%), a couve (39%), a batata (35%), os lacticínios (23,7%, em média), o leite meio-gordo (42%), o quilo de carne (21,1%, em média), a pescada (41%).
Uma realidade preocupante que coexiste simultaneamente com a queda até Setembro de 2022, em termos reais, de 4,7% das remunerações brutas médias mensais por trabalhador, lamentou João Dias, lembrando ainda que tais aumentos não foram parar aos pequenos produtores e agricultores – esses viram os seus rendimentos reduzirem-se em 12% -, ficaram, sim, na «especulação da grande distribuição que acumula lucros nunca vistos».