Privatizações prejudicam o País mas garantem milhões aos accionistas

O PCP não de­siste de re­cu­perar os CTT para o con­trolo pú­blico e vol­tará em breve a propor isso mesmo, pela sé­tima vez, na As­sem­bleia da Re­pú­blica. A ga­rantia foi dei­xada pelo Se­cre­tário-geral do Par­tido, para quem só a luta dos tra­ba­lha­dores e dos utentes po­derá ga­rantir este des­fecho.

Paulo Rai­mundo fa­lava, dia 15, na sessão pú­blica Res­gatar o ser­viço pú­blico postal: con­trolo pú­blico dos CTT, que teve lugar nas ins­ta­la­ções da Voz do Ope­rário na Graça, em Lisboa. A au­di­ência era, no es­sen­cial, com­posta por mem­bros das Or­ga­ni­za­ções Re­pre­sen­ta­tivas dos Tra­ba­lha­dores do sector e do Mo­vi­mento de Utentes dos Ser­viços Pú­blicos.

O dia es­co­lhido também não podia ser mais sim­bó­lico: data de 15 de De­zembro de 1997 a di­rec­tiva da UE que li­be­ra­lizou o sector postal. Ora, após duas dé­cadas e meia de li­be­ra­li­zação e nove sobre a pri­va­ti­zação dos CTT, o ba­lanço é de­sas­troso: «os preços dis­pa­raram mais de 70% desde a pri­va­ti­zação, o cor­reio deixou de ser dis­tri­buído numa base diária e deixou de ser con­fiável. São dias, às vezes se­manas, para re­ceber uma carta, são os avisos dei­xados na caixa de cor­reio sem qual­quer con­tacto, são as cen­tenas de es­ta­ções e postos dos CTT en­cer­rados, as filas in­ter­mi­ná­veis para re­ceber a re­forma ou com­prar um selo», de­nun­ciou o di­ri­gente co­mu­nista, sin­te­ti­zando o que antes tinha sido dito por vá­rios dos tra­ba­lha­dores, di­ri­gentes sin­di­cais e utentes pre­sentes.

Para Paulo Rai­mundo, os CTT pri­va­ti­zados «con­se­guiram fa­lhar em todas as normas de qua­li­dade e fi­a­bi­li­dade», pe­rante a cum­pli­ci­dade do Go­verno, e pu­seram em causa a pró­pria co­esão na­ci­onal, com o en­cer­ra­mento de de­zenas de es­ta­ções e postos de Cor­reio.

Pior para quase todos

A li­be­ra­li­zação do ser­viço postal e a pri­va­ti­zação dos CTT pre­ju­di­caram também os tra­ba­lha­dores: hoje, são não apenas muito menos do que em 2013, quando se deu a pri­va­ti­zação, como tra­ba­lham em pi­ores con­di­ções.

Em vá­rias in­ter­ven­ções re­feriu-se a falta de tra­ba­lha­dores para cum­prir o ser­viço, o en­cer­ra­mento de Cen­tros de Dis­tri­buição Postal e o alar­ga­mento dos giros, os cortes no far­da­mento e na se­gu­rança no tra­balho, o au­mento da re­pressão nos lo­cais de tra­balho e a perda su­ces­siva do poder de compra dos sa­lá­rios. Se esta é a re­a­li­dade nos CTT, nas de­mais em­presas do sector, re­sul­tantes da li­be­ra­li­zação, a si­tu­ação não é me­lhor: pre­ca­ri­e­dade, baixos sa­lá­rios, sub­con­tra­tação.

Mas também o Es­tado perdeu com o ne­gócio, feito à me­dida dos in­te­resses dos ac­ci­o­nistas, entre os quais se contam o grupo Cham­pal­li­maud. Até à pri­va­ti­zação, os CTT en­tre­gavam anu­al­mente ao Es­tado mi­lhões de euros em lu­cros, que agora vão parar aos grupos pri­vados.

E não é tudo: a gestão pri­vada está a de­la­pidar o riquís­simo pa­tri­mónio her­dado da em­presa pú­blica, cri­ando até uma em­presa pró­pria, a CTT IMO, que tem como única fi­na­li­dade «gerir» (leia-se, des­pa­char) o pa­tri­mónio imo­bi­liário dos CTT, em muitos casos edi­fí­cios onde, até há pouco, fun­ci­o­navam es­ta­ções e postos de Cor­reio que tanta falta fazem às po­pu­la­ções.

Quem ga­nhou então com a li­be­ra­li­zação dos Cor­reios e com a pri­va­ti­zação dos CTT? Paulo Rai­mundo res­pondeu: «os de sempre, ga­nhou o Grupo Cham­pal­li­maud, ga­nharam os res­tantes ac­ci­o­nistas dos CTT e ga­nhou o pro­jecto fe­deral da União Eu­ro­peia, que pro­move a des­truição de todos os ins­tru­mentos na­ci­o­nais de so­be­rania».


Nú­meros de um de­sastre

Em 2009, eram os CTT ainda uma em­presa pú­blica, havia cerca de 900 es­ta­ções dos Cor­reios e 1990 Cen­tros de Dis­tri­buição Postal. Em 2021, já com o pro­cesso de pri­va­ti­zação (e de­gra­dação) bas­tante avan­çado, so­bravam 582 es­ta­ções e 1804 CDT. Os giros pos­tais pas­saram de 6697 para 4684 e o nú­mero de tra­ba­lha­dores, que era su­pe­rior a 13 mil, está hoje re­du­zido a 10886.

Já os di­vi­dendos dis­tri­buídos aos ac­ci­o­nistas são tantas vezes su­pe­ri­ores aos pró­prios lu­cros: em 2016, foram dis­tri­buídos 72 mi­lhões de euros (com lu­cros de 62 mi­lhões) e em 2017 os ac­ci­o­nistas em­bol­saram 57 mi­lhões, face a lu­cros de 27 mi­lhões.



Mais artigos de: Em Foco

O que é estratégico tem de ser público

O con­trolo pú­blico de em­presas e sec­tores es­tra­té­gicos é um dos ele­mentos cen­trais da po­lí­tica pa­trió­tica e de es­querda que o PCP propõe ao País, pelo que pode re­pre­sentar no in­cre­mento da pro­dução na­ci­onal, na pla­ni­fi­cação de­mo­crá­tica do de­sen­vol­vi­mento eco­nó­mico, na va­lo­ri­zação dos tra­ba­lha­dores e na pró­pria co­esão na­ci­onal. Os casos dos CTT e da Galp es­ti­veram em de­bate em duas ses­sões em que par­ti­cipou o Se­cre­tário-geral do Par­tido, Paulo Rai­mundo.