Gil Teixeira Lopes – a Arte enquanto força vital

Manuel Augusto Araújo

Gil Teixeira Lopes dedicou-se à gravura, pintura e escultura

Um dos primeiros gestos do homem, quando se começou a conhecer como homem, foi gravar a sua presença num suporte físico. A natureza destruiu a maioria dessas marcas, outras resistiram de que são exemplo as gravuras de Foz Coa. Milhares de anos decorreram até os métodos de gravação se sofisticarem e a gravura ganhar alforria instituindo-se como uma das principais áreas das artes visuais, apurando-se em técnicas que se especializaram em várias disciplinas que tanto se autonomizaram como se hibridizaram, com a vantagem e a virtude das gravuras se reproduzirem em séries determinadas pelos artistas, dando um enorme contributo para a democratização das artes.

O poder de atracção que a gravura exerceu em vários artistas fez com que alguns a elegessem enquanto o foco principal da sua prática artística, ainda que não descurassem outras experiências que acabavam por contribuir para o seu enriquecimento formal, induzindo mesmo a introdução de novas técnicas para melhor explorarem a criatividade.

Portugal tem alguns artistas que optaram em quase exclusivo pelas técnicas da gravura ou para quem a gravura foi preponderante enquanto meio principal para expressarem o seu universo estético e imaginativo.

Gil Teixeira Lopes é um desses artistas que tem uma marca muito pessoal, de uma raríssima inventiva, reconhecida internacionalmente onde foi multiplamente premiado nas mais importantes exposições de gravura em todo o mundo. Nenhuma técnica de gravação lhe era estranha e o seu contributo para a sua evolução é inestimável. Como foi inestimável o seu labor de professor da Faculdade de Belas-Artes de Lisboa introduzindo inumeráveis de alunos na aptidão instrumental enquanto suporte da expressão artística em que pedagogicamente os induzia.

São centenas as suas gravuras e milhares as provas em que se reproduziram. Em todas podemos descobrir o artista que as produziu, até pelo seu extraordinário apuramento técnico só ao alcance de alguns. Em todas nos deslumbramos com as imagens que traduzem a inquietação que impulsionava uma inesgotável imaginação e o seu poder fecundamente inovador.

Gil Teixeira Lopes, embora tenha na gravura a sua mais ampla e mais extensa obra artística nunca deixou de pintar e foi ainda atraído pela escultura. Toda a sua obra é sempre um original mesmo quando recupera uma ideia já com anos ou de apenas horas, para a acrescentar, modificar, alterar.

A sua paixão pela arte e pelo trabalho em projectos artísticos só sofreu pausas quando, em 1971, começou a sofrer gravemente de doenças do coração cuja primeira manifestação mais aguda, alguns anos mais tarde, foi uma longa e quase fatal paragem cardíaca. Esses saltos no escuro foram sendo resolvidos, provisoriamente resolvidos em quatro intervenções cirúrgicas que acabaram numa última com um transplante de coração. Entre essas mortes quase anunciadas, Gil Teixeira Lopes renascia com uma indómita vontade de se dedicar à sua arte com um vigor e uma assinalável produtividade. Era a arte que lhe insuflava vida. Era a arte que o fazia renascer. Era a arte que lhe despertava os sentidos, lhe iluminava e alicerçava os caminhos que transpunha para as chapas da gravura, para as telas, para os bronzes.

Em 10 de Novembro, aos 86 anos, sucumbe este grande artista para quem a arte foi a força nuclear que o ligou intensamente ao mundo e à vida. Deixa-nos uma obra extensa, multiforme e de enorme valor estético que merecia ser recuperada numa exposição que a celebrasse.




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