Dia Mundial da Ciência para a Paz e o Desenvolvimento
A ciência não serve todos por igual nem está apenas ao serviço da paz
Sob proclamação da UNESCO, desde 2002 que se celebra a 10 de novembro o Dia Mundial da Ciência para a Paz e o Desenvolvimento. A lógica de celebrar este dia «tem as suas raízes na importância do papel da ciência e dos cientistas para as sociedades sustentáveis e na necessidade de informar e envolver os cidadãos na ciência», tendo esta celebração como objectivos: «fortalecer a conscientização pública sobre o papel da ciência para sociedades pacíficas e sustentáveis; promover a solidariedade nacional e internacional pela ciência partilhada entre países; renovar o compromisso nacional e internacional para o uso da ciência em benefício das sociedades; chamar a atenção para os desafios enfrentados pela ciência na obtenção de apoio para o esforço científico.» Este ano, o dia celebra-se ainda com o tema: Ciências Básicas para o Desenvolvimento Sustentável.
Parece redundante dizer «ciência para a paz e o desenvolvimento», mas, infelizmente, não é. Toda a medalha parece ter o seu reverso e bastará recordar os impressionantes avanços na física nuclear dos anos 30 e 40 do séc. XX, que nos levaram a compreender como se formam os elementos químicos no Universo e a podermos ver detalhadamente o interior do nosso corpo com uma ressonância magnética, levaram também ao desenvolvimento das terríveis armas nucleares.
Mas se a invenção e uso de utensílios e instrumentos, a técnica, quase se perde nos tempos — antecedendo ainda o homo sapiens, permitindo-nos desde há 12000 anos sedentarizarmo-nos cultivando a terra —, é com a Revolução Científica do séc. XVI, e o Iluminismo que se lhe seguiu, que adquirimos uma capacidade de compreender e transformar o mundo tal que a técnica, a tecnologia, já só evolui a par com a ciência.
Porém, como está explícito na proclamação da UNESCO, a celebração deste dia não é a comemoração de um marco histórico. O dia celebra-se como uma necessidade de fortalecer, de promover e de consciencializar. E essa necessidade existe porque a ciência não só não está ao serviço de todos por igual nem está só e apenas ao serviço da paz.
Os detentores dos meios de produção detêm, inescapavelmente, as maiores aplicações da ciência e o seu uso. Controlando igualmente os Estados, controlam os seus investimentos e as suas políticas, autoalimentando-se. Empurram para erário público todo o financiamento da ciência básica, como a matemática, a física, a química e a biologia, apropriando-se dos produtos das ciências aplicadas — que sabem que não subsistem sem as primeiras —, cujo posterior benefício para a humanidade traz uma etiqueta com um preço, fazendo com que aqueles que são detentores apenas da sua força de trabalho o paguem duas vezes. A UNESCO sabe-o, mas não o pode verbalizar.
Enquanto nos maravilhamos com as recentes imagens das poeiras junto a estrela em formação dos «pilares da criação», na nebulosa da Águia, a 6500 anos-luz de distância, obtidas com o telescópio espacial Webb, comemoremos este Dia Mundial da Ciência para a Paz e o Desenvolvimento conscientes do muito que ainda há por fazer. Conscientes que a crise climática não existe por incapacidade de uma resposta atempada da ciência, mas sim porque o capitalismo não é verde! Conscientes que a ciência não está apenas ao serviço da paz, porque o capitalismo não é pacifista! Conscientes que a ciência não está ao serviço do desenvolvimento de todos, porque o capitalismo não é socialista!