Combate à pobreza: das palavras aos actos
Aumenta a pobreza e o empobrecimento de largas camadas da população
A 17 de Outubro assinalou-se, mais uma vez, o Dia Internacional para a Erradicação da Pobreza. O que se pode destacar é que algumas das iniciativas anunciadas visaram a «glorificação» dos pobres e do «dever de os apoiar», em vez de assumirem um claro propósito de promover o combate, a prevenção e a erradicação deste grave flagelo social.
A origem desta data remonta a 17 de Outubro de 1987, por iniciativa do padre francês Joseph Wresinski, com a realização em Paris de uma grandiosa manifestação, cuja repercussão a nível mundial foi tal que a ONU reconheceu a data como mais um dos muitos dias internacionais.
O agravamento da pobreza em todo o Mundo conhece novos e mais graves desenvolvimentos, uma realidade cada vez mais distante de um caminho que vise a sua erradicação.
Ao assinalar esta data, o Movimento Erradicar a Pobreza denunciou, designadamente a mais profunda revolta pelo retrocesso civilizacional que representa o elevado número – mais de 260 milhões de pessoas – que em todo o mundo passaram à situação de pobreza extrema (já não é o limiar da pobreza). E não pode deixar de referir dados das Nações Unidas que apontam que nos dois últimos anos o índice de desenvolvimento humano regrediu.
Em Portugal, as últimas estatísticas sobre a pobreza datam de 2021 e evidenciam que no ano anterior dois milhões e 302 mil residentes encontravam-se no chamado eufemisticamente «risco de pobreza», ou seja, numa situação de pobreza. E, destes, mais de 600 mil viviam numa situação chamada de «privação severa», o que significa altamente carenciados.
A realidade social não deixa margem para dúvidas de que os pobres estão mais pobres e que muitos que ainda não o eram passaram a sê-lo, ainda que invisíveis nas estatísticas.
Aumenta a pobreza, mas igualmente o empobrecimento de largos segmentos da população face ao acentuado agravamento das desigualdades na distribuição do rendimento.
Em contrapartida, só as contas das duas maiores cadeias de distribuição em Portugal, no primeiro semestre deste ano e relativamente ao ano anterior, viram os seus lucros aumentados em conjunto na ordem dos 90%. A desculpa é a guerra!
Opções e propaganda
Os salários e as reformas continuam a perder poder de compra face a uma inflação que começou a disparar a partir de Novembro de 2021, e que em Agosto último, relativamente ao mesmo mês de 2021, já ia nos 8,9%, o que são a prova provada do aumento da pobreza.
A meia pensão e os 125 euros para os trabalhadores, decididos pelo Governo, não repõem o poder de compra perdido, porque esse só poderá ser enfrentado com o aumento geral dos salários das reformas e das pensões e não dispensa a fixação de preços de bens e serviços essenciais. Medidas que o Governo optou por não tomar.
Os relatórios do INE relativos a 2021 destacavam o aumento do número de pessoas que viviam em alojamentos com falta de espaço, abrangendo 10,6% da população, o que significa quase um milhão e 100 mil pessoas.
Perante este panorama dramático para milhões de pessoas no nosso país, convém recordar que esteve em discussão pública, até 25 de Outubro de 2021, um documento da Presidência do Conselho de Ministro, intitulado Estratégia Nacional de Combate à Pobreza 2021-2030, que no seu ponto 2.1.4. comprometia-se expressamente a promover uma Agenda do Trabalho Digno no sentido de combater a pobreza no trabalho, reforçar o combate à precariedade. E, no ponto 3.1.8., a orientação era a promoção de uma política salarial adequada, ancorada na promoção da negociação colectiva e sustentada por instrumentos que permitam diminuir a taxa de risco de pobreza dos trabalhadores e trabalhadoras… através da promoção de melhores salários.
Quando olhamos para a acção do actual Governo e para o Orçamento do Estado para 2023, a pergunta que surge é: que aconteceu à estratégia de combate à pobreza? A resposta é clara: cumpriu a sua função mediática e a mais não é obrigada.
Como dizia a minha avó, a vergonha estava lá, mas era verde e veio um burro e comeu-a.