Energia: tudo pelo mercado, um garrote às famílias
Há largos meses que a questão da energia está na ordem do dia. Os preços crescentes no sector energético, tomado por grandes grupos económicos que, no nosso país, repartem entre poucos um monopólio natural, concertando a operação num mercado desregulado, com aproveitamentos e acções especulativas várias, aumentando lucros numa escala tão escandalosa que levam a própria Comissão Europeia a reconhecer a evidencia de “super lucros” sobre os quais admite alguma forma de intervenção.
A resposta recente tem colocado a exigência de redução de consumos (sobretudo de gás), a diversificação de fontes fósseis de energia (transitando uma dita dependência russa para outros actores, mais caros e ambientalmente mais impactantes, como é o caso do gás de xisto dos EUA) e uma aposta em fontes de energia intermitentes, ou seja renováveis (segmento fortemente subsidiado com reflexo directo na factura da energia e que num ano de seca viu reduzir a produção hidroeléctrica em 46% em Portugal). O sacrossanto mercado que tudo resolve é indissociável, afinal, do brutal aumento de preços da energia.
A 9 de Setembro, em reunião extraordinária do Conselho dos Transportes, Telecomunicações e Energia, os ministros admitiram o óbvio. A escalada de preços impõe aumentos na inflação criando dificuldades para as empresas e famílias. E discutiram medidas. Devem ser “temporárias”, preservando o sacrossanto “mercado”. Sem conclusões concretas, convidam a Comissão Europeia a fazer propostas para limitar receitas nos produtores de renováveis e uma “contribuição solidária” dos combustíveis fósseis para “atenuar” impactos dos preços nos clientes. Medidas temporárias, incluindo possíveis limites máximos do preço do gás (de aquisição, não de fornecimento ao consumidor final). Instrumentos de “liquidez” de emergência, para garantir que os lucros das empresas não são comprometidos. No essencial, medidas que não resolvem os problemas de fundo e, claro, muito distantes da necessária reversão da liberalização do sector.
Mais interessantes que estas parcas conclusões são as recomendações de um documento informal de apoio (que afirma que os preços vão continuar elevados até ao final do ano e pelo menos, ainda que de forma mais moderada, até 2024-2025), onde soluções como a suspensão total do mercado, a definição de preços máximos de venda ao público, ou a reintrodução de uma regulação total do mercado são “desaconselhadas”, porque comprometem o mercado, a concorrência ou porque podem promover o aumento de consumos.
Tudo em nome do mercado e dos lucros, mesmo que se mantenha um garrote às famílias e às micro, pequenas e médias empresas. Ou passam frio e comprometem a sua actividade ou esvaziam a carteira. É esta a resposta da UE ao aumento dos preços da energia.