Uma «reforma» que manterá tudo na mesma
Em Março de 2020, a Comissão Europeia (CE) decidiu propor a activação da «cláusula de derrogação de âmbito geral do Pacto de Estabilidade e Crescimento» (PEC). Esta cláusula continua activa e assim deverá manter-se no próximo ano.
Introduzida na legislação orçamental da UE em 2011, no chamado «pacote de seis medidas», esta cláusula permitiria aos Estados-membros um desvio «temporário coordenado e ordenado relativamente aos requisitos normais» do PEC, permitindo-lhes tomar medidas orçamentais para fazer face a períodos de grave recessão económica.
Se, em abstracto, esta activação permitiria aos Estados-membros alguma flexibilidade no estabelecimento das suas políticas económicas e financeiras em períodos de «crise», na realidade, as coisas fiam mais fino: as regras da dita cláusula dispõem que os Estados-membros «podem ser autorizados a desviarem-se temporariamente da trajectória de ajustamento ao objectivo orçamental de médio prazo (...), desde que tal não ponha em risco a sustentabilidade orçamental a médio prazo». Ou seja, na prática, a flexibilidade permitida por esta derrogação é francamente mais limitada do que aquilo que tem sido alardeado. As pressões e chantagens, os diversos procedimentos relativos ao PEC, mantêm-se, por exemplo, através das «avaliações anuais de crescimento» e das «recomendações por país». Portugal foi bem exemplo de que os constrangimentos orçamentais não desapareceram neste período «excepcional», bem pelo contrário.
Em Outubro de 2021, a CE lançou uma consulta pública sobre uma anunciada «reforma da Governação Económica da UE», pedindo sugestões e propostas para alteração do actual quadro legislativo, tendo presente o objectivo de reduzir o défice sem cortar no investimento ou comprometer o crescimento. Deste processo ainda não resultou nenhuma proposta concreta, que tem vindo a ser sucessivamente adiada.
Esta semana, porém, vários órgãos de comunicação social noticiaram que a coligação que governa na Alemanha tinha chegado a um entendimento relativamente à dita reforma. Sem surpresas, este entendimento defrauda a expectativa daqueles que aguardavam uma maior flexibilidade e algum alívio face ao espartilho das regras orçamentais da UE.
Provavelmente, agora que a Alemanha terá decidido, os resultados da consulta pública da CE e da sua profunda reflexão serão conhecidos nos próximos tempos e certamente não irão destoar da posição alemã.
Os deputados do PCP no PE há muito que vêm propondo uma solução para eliminar o pesado rol de condicionamentos associados à governação económica da UE: a sua revogação, a eliminação da densa teia de instrumentos e mecanismos que constrangem a margem de manobra dos Estados na definição e implementação das suas estratégias de desenvolvimento soberano. É por isto que nos continuaremos a bater.