Mercado garantirá lucros, não garante políticas de defesa ambiental

Vladimiro Vale (Membro da Comissão Política)

Percorrendo os jornais das últimas semanas podemos identificar aspectos da ofensiva ideológica na área ambiental.

Problemas ambientais colocam a urgência de mudança de políticas

O jornal Público de 28 de Maio noticiava que gestores de uma área protegida privada procuravam modelos para recorrer ao mercado de carbono como forma de financiamento, «esperando vir a conseguir 100 euros por hectare/ano». Uma acção aparentemente altruísta que acaba a legitimar a ideia de privatização daquilo que deveria ser uma tarefa fundamental do Estado e poderá ter consequências pela sujeição da preservação dos habitats à lógica, às flutuações e às quebras dos mercados.

Pudemos ver noticiado a propósito da Conferência dos Oceanos, realizada em Lisboa, que «o grande objectivo fixado para a Conferência pelo Ministro dos Negócios Estrangeiros foi: “Acredito que Lisboa pode tornar-se numa praça financeira do mar”!» Ou seja, como o PCP denunciou, «para o Governo PS, definir uma política para o mar é colocar-se como facilitador de negócios».

Pudemos também tomar conhecimento que empresas, responsáveis por projectos de energias renováveis em Portugal, foram apanhadas em esquemas de fuga aos impostos através da transferência de activos para empresas sediadas em Malta, o que comprova que a natureza das empresas potencia a transferência de fundos e financiamentos públicos para a acumulação capitalista, afastando-as da sua missão «verde».

Já neste mês pudemos ler notícias sobre a realização do primeiro teste de stress climático do Banco Central Europeu (BCE) ao sector bancário, um exercício exploratório, que aponta para uma estimativa de «perdas conjuntas de cerca de 70 mil milhões de euros para os 41 bancos» com as alterações climáticas. Na mesma página lá aparece um artigo, subscrito por dois membros da comissão executiva do BCE, a reclamar o apoio ao «desenvolvimento de mercados de capitais verdes, necessários para financiar uma economia hipocarbónica». Ou seja, instituem o mercado como o alfa e o ómega das políticas ambientais e legitimam a transferência de fundos para o sistema financeiro, agora sob a justificação ambiental.

 

Alertas do PCP

Em matéria ambiental o PCP tem vindo a intervir no sentido de alertar para que:

  • A urgência de medidas de protecção ambiental não pode ser transformada numa arma para fomentar a aceitação do aumento de exploração à escala de massas e uma forma de legitimar a transferência de fundos públicos para os grupos económicos.
  • A chamada «Ecorregulação» através do mercado é uma falsa solução. Não é mais que uma forma de favorecer a acumulação de capital, desta feita tingida de verde, muitas vezes com efeitos contrários aos enunciados.

  • A natureza de quem explora e gere os recursos naturais altera o seu objectivo imediato, o que faz com que a luta pelo controlo público dos sectores estratégicos se torne numa luta fundamental para criar as condições para que o País possa desenvolver uma política de promoção do equilíbrio ambiental.

  • Fragilizar estruturas públicas de controlo, monitorização e gestão ambiental e de recursos naturais abre as portas à sua exploração ao sabor dos lucros privados.

Para o PCP, os graves problemas ambientais que enfrentamos não se resolvem exclusivamente com recurso à tecnologia, a mecanismos financeiros e especulativos, à taxação dos comportamentos individuais, a mercados e consumo verdes. Alguns destes instrumentos já demonstraram mesmo ser contraproducentes – nos planos ambiental, social e económico.

Os problemas ambientais colocam uma urgência de uma mudança de políticas, que não se esgota na dimensão ambiental, sendo indissociável de uma mudança que se estenda às esferas social, económica e inclua o reconhecimento do direito dos povos ao desenvolvimento.




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