Propostas para travar o aumento do custo de vida
Perante uma plateia de várias centenas de pessoas, o Secretário-geral do PCP defendeu, em Almada, que o aumento dos salários e pensões é a mais «importante e decisiva» medida para «impedir a corrosão» do poder de compra e o empobrecimento acelerado de milhões de portugueses.
Os trabalhadores e o povo não estão condenados ao empobrecimento
Lusa
O PCP não podia ter escolhido melhor local para realizar uma sessão pública «sobre o aumento do custo de vida». Foi na Praça da Portela, uma das mais movimentadas artérias do Laranjeiro, freguesia do concelho de Almada. Ao final da tarde, sentia-se o pulsar da vida urbana, num vai-e-vem de gente, trabalhadores e população em geral, com destinos que ali se cruzam. «Cada dia é um bico d’obra; Uma carga de trabalhos, faz-nos falta renovar», foram palavras – da Fadista Ana Moura, saídas de potentes colunas de som – que ecoaram e que chamavam à atenção para a mensagem:«PCP – Contigo todos os dias».
Nesta azáfama, muitos carregavam sacos de compras, cada vez menos cheios, fruto dos aumentos, cada vez mais sentidos, dos preços. Também a eles se dirigiu Jerónimo de Sousa, especificando: «sobe o pão, o gás e os combustíveis, sobe o leite, os vegetais, a carne, o peixe, a massa, o óleo, a fruta, a renda de casa, a luz, sobe tudo menos o salário, a pensão e a reforma».
«E quem é que está a ganhar com a guerra, as sanções e a escalada do militarismo e da destruição», interrogou, dando a resposta: «Não são os povos», mas sim «o complexo militar industrial, são as grandes transnacionais dos combustíveis e da energia, são os grandes senhores do dinheiro dos mais variados sectores que tudo controlam em roda livre».
Na sua intervenção disse mesmo não ser possível «aguentar esta situação» em Portugal, «quando a taxa de inflação em Abril acaba de chegar aos 7,2 por cento e já se dá como certo o aumento das taxas de juro a iniciar no próximo mês (de Junho), com consequências, nomeadamente nos custos da habitação».
Caminhos do passado
O Secretário-geral do PCP criticou, por isso, a falta de respostas do novo Governo do PS, «com a sua maioria absoluta» e de «mãos livres». «Retomando os caminhos do passado dos governos do rotativismo, que a luta momentaneamente interrompeu em 2015, mais uma vez a opção é de pôr os trabalhadores e o povo a pagar uma crise que, também e mais uma vez, não é da sua responsabilidade», alertou, constatando: «A inflação já há muito que comeu uma parte dos salários e pensões, mas mesmo assim é invocada para travar aumentos desses mesmos salários e pensões, deixando campo aberto à especulação que está na sua origem».
«Esta tese peregrina de que não se aumentam salários e pensões para não agravar a inflação, sabemos a quem serve e para que serve. Ela não é mais do que o regresso dos cortes, agora não por via de uma decisão formal, mas através da real desvalorização dos salários e pensões e, consequentemente, da perda real do poder de compra», acrescentou.
Como exemplo, referiu que os aumentos salariais «já foram absorvidos pela inflação verificada». No caso das reformas e pensões a «situação é ainda mais grave», com a inflação «a ser já entre cinco a 20 vezes superior ao aumento que as pensões tiveram em Janeiro» (entre 0,24 e 1 por cento).
Compromisso de classe
A iniciativa do PCP, moderada por Otília Ferreira, da Comissão de Freguesia do Laranjeiro-Feijó, contou com a presença, entre muitos outros, de Luís Palma, da Comissão Concelhia de Almada e presidente da Junta da União de Freguesias do Laranjeiro-Feijó, Daniel Figueiredo, do Executivo da Direcção da Organização Regional de Setúbal (DORS), Jorge Feliciano, do Executivo da DORS e responsável pela Comissão Concelhia de Almada, Bruno Dias, do Comité Central (CC) e deputado na Assembleia da República, e Armindo Miranda, da Comissão Política do CC.
No final e após as intervenções, deu-se a conhecer que no próximo sábado, 28, a partir das 10h00, realiza-se, na Praceta Diogo Couto, no Laranjeiro, mais uma edição da Festa da Amizade.
Soluções para o País
No Laranjeiro, Jerónimo de Sousa assegurou que as mais de 300 propostas apresentadas pelo PCP de alteração ao Orçamento do Estado para este ano «podem dar solução ao flagelo do aumento do custo de vida, dando uma particular e prioritária atenção à reposição e valorização dos salários, das pensões e dos rendimentos» e à «regulação e descida dos preços da energia e dos bens essenciais».
Entre outras propostas avançadas na área dos combustíveis, destacou a aplicação de um Cabaz Alimentar Essencial, que «defina um preço de referência para cada um dos produtos, com base nos custos reais e numa margem não especulativa, proibindo a venda a um preço superior sem justificação atendível». «A lista de bens do cabaz é determinada em função da lista de produtos alimentares sujeita à taxa reduzida de IVA de 6 por cento», explicou, reforçando que, com esta proposta, o PCP «dá os meios às autoridades públicas para intervir sobre as margens e os preços praticados na grande distribuição que têm representado um duro golpe no rendimento disponível de quem vive do seu trabalho».
Recuperar salários e reformas
Os comunistas insistem ainda na necessidade de aumentar o salário mínimo nacional, assumindo, desde já, um aumento extraordinário para os 800 euros em Julho e tendo o objectivo dos 850 euros no curto prazo; de recuperar e valorizar os salários dos trabalhadores da Administração Pública; de uma actualização extraordinária para todas as pensões correspondente a 5,3 por cento do valor da pensão, não podendo o montante da actualização ser inferior a 20 euros por pensionista.
Teoria liberal desmascarada
Relativamente aos que «afirmam que o problema está nos impostos», Jerónimo de Sousa desmascarou todos aqueles que pretendem, por um lado, «diminuir as receitas do Estado e com elas atingir, nomeadamente, as suas funções sociais e abrir caminho à sua mercantilização e ao negócio da saúde, da educação, da protecção social que deixaria de existir» e, por outro e no imediato, «deixar campo aberto às margens de lucro sem freio do capital».
«Se houvesse dúvidas sobre isso, basta ver o que se passou e passa com os combustíveis», destacou, lamentando a decisão governamental de não fixar os preços, o que «possibilitou que as gasolineiras engolissem parte significativa do ISP e dessa forma não diminuíram os preços como esperado, aumentando assim, ainda mais, as suas margens de lucro».
«Lá se foi a teoria liberal de que a culpa é dos impostos; a culpa é da gula do capital que se está a borrifar com os interesses do País, dos trabalhadores, do povo e dos micro, pequenos e médios empresários», acusou o Secretário-geral do PCP.
Exemplo do que se fala é também o que se passa com a agricultura e as pescas. «Os pescadores e os agricultores não recebem um valor justo pela sua produção e são pagos, em alguns casos, abaixo dos custos de produção, mas cada um de nós quando vai ao supermercado paga cada vez mais pelos bens alimentares», referiu.
«Sim, isto está mau, mas não é para todos!»
«Vivemos momentos exigentes. O caminho é impedir que os grupos económicos, tal como fizeram na epidemia, aproveitem a situação para atacar direitos, ao mesmo tempo que acumulam milhares de milhões de euros», lê-se num documento do Partido, distribuído aos participantes e a quem por ali passava.
Esta foi, também, uma ideia desenvolvida pelo Secretário-geral do PCP na sessão pública de Almada. Como salientou, «perante a actual situação» existem duas opções: «Ou encaramos como justificável mais um assalto aos salários e rendimentos, para que uns poucos possam lucrar, ou nos organizamos e engrossamos a luta pelo aumento dos salários e das pensões, contra a especulação, a guerra e o militarismo».
Para ilustrar a situação referiu que «os seis maiores bancos portugueses registaram lucros de 617,4 milhões de euros» nos primeiros três meses de 2022 e que a GALP, em 90 dias, arrecadou 155 milhões de euros. Na grande distribuição, tanto a Jerónimo Martins como a Sonae, no ano de 2021, «os lucros cresceram sempre acima dos 45 por cento e assim continuam».
É urgente e necessário...
# O aumento geral dos salários e pensões para impedir a perda do poder de compra;
# A fixação de preços máximos na energia e todos os bens essenciais, em particular dos alimentos;
# A eliminação do adicional ao imposto sobre os produtos petrolíferos e o fim da dupla tributação que se verifica do IVA sobre o ISP e a imposição de preços máximos nos combustíveis;
# A redução do IVA para os 6 por cento no gás e na electricidade;
# O controlo público de sectores estratégicos e produção nacional (indústria, agricultura, alimentação). Só assim é possível assegurar que o País não fique vulnerável e dependente de factores externos que não controla.
Depoimentos
Egídio Santos (trabalhador-reformado): «A maioria dos reformados e pensionistas do Sistema Público de Segurança Social sobrevive com baixas pensões. Dos mais de dois milhões de pobres do País, um milhão é abrangido por pensões mínimas cujo valor nominal médio mensal fica abaixo do limiar da pobreza, que em 2020 foi de 475 euros».
José Pedro Faria (jovem trabalhador): «Oferecem-nos salários de três euros por hora, sem contrato de trabalho, e dizem que não queremos trabalhar. (…) Enquanto os bancos, as grandes empresas, a EDP, a Galp, a Jerónimo Martins, a Sonae, estão a registar lucros imensos, mais do que nunca, eu e muitos outros têm de escolher entre pagar a factura do telemóvel ou comprar um medicamento. (…) A política de direita deixa-nos sem saída. Com estas condições, a única alternativa é emigrar».
José Ligeiro (pequeno empresário): «Quando mais caro estiverem os produtos, mais o Governo – que promete mundos e fundos, mas não dá nada – encaixa em impostos. (…) Fruto da actual situação, diariamente, quando abro a porta vejo pessoas a procurar comida no caixote do lixo. Assiste-se, também e cada vez mais, ao aumento da insegurança».
Carlos Henriques (assistente operacional): «O Governo devia ter vergonha dos salários e das reformas que se praticam. É preciso dar mais a quem trabalha e trabalhou por este País. (…) Em 2020, segundo um estudo do INE, havia um milhão e 200 mil pobres em Portugal, valor que já está em um milhão e quase 500 mil. No entanto, em pleno século XXI, há dinheiro para armamento. Nós queremos é paz, guerra não».