NATO, PIB e interesse nacional

Rui Fernandes

Quanto mais inserção externa, menos capacidade de resposta das Forças Armadas para responder aos desígnios constitucionais

A guerra na Ucrânia reavivou um conjunto de objectivos de há muito consagrados quanto ao papel de cada país no seio da NATO, entre eles a questão dos gastos de cada um com a Defesa Nacional.

Este objectivo desde 2019 que foi objecto de uma planificação visando atingir, em 2024, o valor de 1,66%. Por outro lado, a Lei de Programação Militar em vigor, e que será objecto de revisão este ano, consagra até 2026 um aumento gradual de verbas para aquisição de equipamento. Importa que se tenha presente que «aquisição de equipamento» não é sinónimo de somente aquisição de armas.

Há um vasto conjunto de aspectos que, inserindo-se em gastos com a Defesa Nacional ou, se se preferir, com as Forças Armadas, e contribuindo para o tal objectivo de dois por cento do PIB, podem constituir alavancas importantes para a defesa dos interesses nacionais. Por exemplo, o investimento necessário para modernizar e apetrechar o estaleiro do Arsenal do Alfeite é uma exigência há muito colocada como necessária, depois de anos de desastre pela mão do governo PSD/CDS e outros de ausência de determinação por parte do governo PS.

Sucedem-se os discursos motivacionais por parte do Presidente da República e do Governo sobre as Forças Armadas. Acontece que anos de conversa sem medidas traduziram-se em degradação, acentuado mal-estar e descrédito. Acresce que não só não foram adoptadas medidas, como foram postas em prática outras que avolumaram problemas. É esse ambiente que tem determinado as muitas saídas das fileiras de militares antes de completado o tempo e é esse ambiente que também se traduz na pouca atractividade na captação de efectivos.

Como aceitar que a Tabela Remuneratória dos Militares (como a de outros sectores da função pública) esteja inalterada à cerca de 12 anos? Como aceitar o atraso de muitos meses na consagração das promoções com perda de vencimento pelo novo posto em igual numero de meses e com reflexo anos mais tarde no calculo da sua pensão de reforma? E que dizer dos casos em que o militar falece nesse hiato de meses e as respectivas famílias vêem o calculo daquilo a que terão direito a receber, não pelo posto que o seu familiar teria se tudo tivesse sido processado no tempo próprio, mas pelo posto que tem? Ou que dizer do estado em que se encontra a Saúde Militar? Ou que dizer da ausência de definição quanto ao papel do Cabo-Mor na Armada, depois de tantos anos em que tal posto foi criado? E que dizer, nos Oficiais, em que num ramos uns, de uma dada especialidade, podem aceder a determinados cargos de comando, mas noutros ramos não podem?

Há um mar de problemas sócio-profissionais em que é urgente medidas. Muitas delas requerem investimento.

Investimento sim
mas para exercer soberania

O PCP nunca questionou as verbas para a Defesa Nacional em si mesmas. Aquilo que o PCP sempre fez, e fará, a partir da sua ponderação própria sobre o interesse nacional, foi questionar opções e prioridades relativas. Propor, como o fez há muitos anos, e a título de exemplo, a aquisição de uma esquadra de F16 para dotar o País de meios de intercepção e defesa do seu espaço aéreo. Tal como propôs a aquisição de navios patrulha. E outros exemplos poderiam ser dados.

Portugal é um País soberano e deve exercer a sua soberania e defender os seus interesses. Isso passa por ter umas Forças Armadas com os meios adequados às possibilidades nacionais e dignificadas. Meios que visem esse objectivo e não meios que tenham subjacente a sua inserção na NATO ou noutros processos em desenvolvimento ao nível da UE.

Temos dito e repetido que muitas das opções adoptadas ao longo dos anos, traduziram-se em Portugal ter, prioritariamente, aquilo que não precisa e não possuir aquilo de que necessita. Tal como temos dito e repetido, e a vida tem mostrado, que quanto mais inserção externa, menos capacidade de resposta tem existido para responder aos desígnios consagrados para as Forças Armadas na Constituição da República.



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