Cose e corte orçamental
Os micro e pequenos empresários desesperam com as medidas do Governo
Lusa
Há cerca de um ano, foi aprovada uma proposta do PEV, de alteração ao Orçamento do Estado para 2021, que vinculava o Governo à criação, até ao final de Março deste ano, de uma «linha de apoio à tesouraria para micro e pequenas empresas», num montante de 750 milhões de euros. O Governo PS, igual a si próprio, publicou a 28 de Julho (!) um Decreto-Lei que aprovou a criação da linha com uma dotação de 100 milhões de euros (menos 650 milhões face ao estabelecido), deixando por definir as condições essenciais de qualquer linha de crédito, incluindo os critérios de acesso. Só a meio de Setembro foi publicada a Portaria que a estabeleceu e operacionalizou.
Ou seja, para dar cumprimento a uma medida aprovada em Novembro de 2020, inscrita numa Lei que entrou em vigor no dia 1 de Janeiro, o Governo precisou de sete meses (mais quatro face ao definido) para publicar um Decreto-Lei que diz que irá publicar uma Portaria que efectivará uma medida que se esgota no fim do ano. Parece mentira, mas é verdade e é prática recorrente. Afinal, este Governo tem dado mostras de não querer dar ponto sem nó.
Depois de desenrolado o novelo de diplomas, seria de esperar que a medida correspondesse ao que foi aprovado e que estas empresas poderiam beneficiar de condições mais favoráveis de acesso ao crédito face às existentes na banca privatizada, para reerguer actividades e iniciar a tão propagandeada (e necessária!) retoma da economia. O Governo podia tê-lo feito, mas quem espera que o Governo PS cumpra (e cumpra a tempo e horas) o que está decidido, desespera…
E, mais uma vez, desesperaram os micro e pequenos empresários ao constatar que as condições que o Governo definiu são leoninas e violam, pelo menos, dois artigos da própria Lei do Orçamento (um inscrito pelo PEV e outro pelo PCP). Ao longo do ano, o PCP denunciou e combateu as múltiplas tentativas de subversão das medidas inscritas no Orçamento. Foi por proposta do PCP que foi possível alargar o número de MPME que, precisando, puderam beneficiar dos (insuficientes) apoios públicos.
O Governo sempre fez ouvidos de mercador ao tecer a regulamentação inicial de outras medidas, como o Programa APOIAR, portanto nada disto surpreende quem já se habituou a pomposas apresentações de medidas que na prática excluem centenas de milhares de empresas do acesso às mesmas.
Esta forma de governar é ainda mais grave se tivermos em conta as dificuldades que atravessam estas empresas, depois de quase dois anos de confinamentos e restrições às actividades económicas em que o grosso dos apoios foram para os grupos económicos. O Governo, na sua cegueira de atender aos critérios orçamentais de Bruxelas, está disposto a continuar a condenar à falência milhares de empresas e a arrastar para o desemprego os seus trabalhadores, apesar das consequências sociais e económicas que são previsíveis. Tem valido tudo para poupar uns trocos. Sim, 750 milhões de euros que voltariam aos cofres do Estado são trocos quando comparados com as borlas e rendas dadas aos grupos económicos.
A história desta linha é mais um exemplo na manta de propaganda com que o Governo quer embrulhar a produção nacional e as micro e pequenas empresas. O que o Governo fez inscrever na proposta de Orçamento para 2022 sobre este assunto demonstra a má fé reiterada com que lidou com a execução do OE2021.
O PCP já apresentou na Assembleia da República uma iniciativa para que se revejam os critérios de acesso e as condições que o Governo estabeleceu. Veremos com que «linhas» é que o PS e o Governo se querem coser.