As orientações que não nos servem
O Parlamento Europeu discutiu um relatório sobre a proposta de decisão do Conselho relativa às orientações para as políticas de emprego dos Estados-Membros (EM). Estas «orientações» inserem-se no processo do Semestre Europeu, um processo que usurpa competências soberanas dos Estados, que impõe, condiciona e controla as opções políticas democráticas e soberanas no plano da política orçamental, mas também das políticas públicas sociais, laborais e de investimento.
O Semestre Europeu é reconhecidamente um instrumento de imposição, condicionamento e controlo da União Europeia sobre as políticas dos países, visando a imposição supranacional do neoliberalismo.
Não esquecemos as ameaças, incluindo de sanção, associadas ao Semestre Europeu, que estão na origem do agravamento da crise económica e social, da desregulação e regressão de direitos laborais e sociais, do aprofundamento de desigualdades, da limitação do investimento público ou da liberalização de sectores estratégicos (veja-se o que está a acontecer no sector energético).
O Semestre Europeu e estas orientações andam de mãos dadas com o Pacto de Estabilidade (PEC), cujas consequências são bem conhecidas – para os trabalhadores e para as populações que sentem na pele a aplicação obsessiva de regras e normas orçamentais que muito têm contribuído para a deterioração da situação económica e social em Portugal.
A estas orientações somam-se, no plano social, as directrizes expressas no Plano de Acção do Pilar Europeu dos Direitos Sociais, cujas metas, já o dissemos, são muito pouco ambiciosas: sem referência ao pleno emprego (diz-se que 78% da população entre os 20 e os 64 anos deve estar empregada); a redução da pobreza (e não a sua erradicação); o foco na competência (com a formação a assumir um protagonismo que, como já sucedeu antes, poderá servir para disfarçar o desemprego ou formas de sub-emprego).
Na perspectiva da Comissão Europeia, estas políticas só serão bem-sucedidas se forem acompanhadas pelas chamadas «reformas estruturais» cujos efeitos já conhecemos: promoção da precariedade, dos baixos salários, do nivelamento por baixo dos direitos sociais e laborais ou o aumento da idade da reforma.
Perante este cenário, não é possível, mesmo para os mais crédulos, acreditar numa viragem de orientações ou de políticas. Com as receitas de sempre, os resultados não serão muito diferentes! Afirmando a sua coerência com o PEC, a proposta discutida pelo Parlamento Europeu revela que o seu comprometimento com o neoliberalismo e a exploração dos trabalhadores e do povo se mantêm. Daí não estranharmos a ausência da defesa da gratuitidade dos serviços públicos, do aumento de salários e pensões, da proibição e erradicação da precariedade, da redução da idade da reforma.
O que se exige é a revogação do Semestre Europeu e dos restantes mecanismos que constrangem e condicionam os EM na defesa e avanço dos direitos laborais e sociais, no aumento do investimento público, no financiamento dos serviços públicos e das funções sociais do Estado, na dinamização da actividade económica e no direito ao desenvolvimento económico e social.