Distância, distâncias
Com aquelas letras miudinhas que a RTP costuma usar para dar em rodapé notícias por vezes importantes, foi-nos informado que estaria prevista, ou porventura mais que isso, uma greve dos empregados bancários que teria ou terá por motivo a altura estratosférica, por isso imoral e tendencialmente escandalosa, das remunerações dos banqueiros. A circunstância de entretanto estar anunciado o despedimento de grande número de empregados de um dos maiores bancos portugueses agrava compreensivelmente o impacto da notícia: não consta que o exercício do comércio bancário tenha entrada em tempo de escassos proventos nem que a banca esteja a defrontar qualquer ofensiva reivindicativa de invulgar vigor que possa levá-la a cortar encargos na área do costume, a dos trabalhadores. Na específica matéria das remunerações, e designadamente nas de quem trabalha, não consta que os trabalhadores da banca tenham entrado num período em que arrecadem milhares quase sem limite, nem que a actividade bancária tenha de súbito deixado de ser o bom negócio que os relatórios anuais dos bancos divulgam.
Nem justo nem moral
Dir-se-á talvez que, sendo o negócio bom, isto é, folgadamente lucrativo, por aí se justifica as excelentes remunerações dos banqueiros. A questão é que deve haver uma relação quase natural entre remunerações e méritos, sendo óbvio que os méritos dos banqueiros não permitem que sejam considerados super heróis: a sua acção será eficaz nas favoráveis circunstâncias que se lhes deparam, a eventual ineficácia é que seria de estranhar, fiquemo-nos por aqui. Ou talvez não: talvez devamos ainda considerar um ponto que pode e talvez deva suscitar reflexões: o da remuneração dos gestores estar hipertrofiada relativamente aos seus méritos supostos ou averiguados, sendo certo que a mesma ou semelhante hipertrofia não acontece com os vencimentos dos empregados bancários. A banca está bem? Óptimo. E os empregados bancários não dão nenhuma contribuição para esse bem-estar? Há algum parentesco, digamos assim, entre as quase fabulosas remunerações de alguns gestores e os vencimentos mais ou menos modestos dos trabalhadores? Não é preciso investigar muito para averiguar que não há e que, por não a haver, há nessa situação um desequilíbrio que não é justo nem moral. Isto é: um desequilíbrio que apela para a nossa atenção e talvez para a nossa acção. À distância entre as remunerações dos gestores e as dos empregados não corresponde paralela distância entre competências, e dizê-lo talvez seja um favor feito à gestão. Que nunca nos será grata por essa boa vontade.