Sobre os direitos sexuais e reprodutivos
Foi aprovado, na última sessão plenária do Parlamento Europeu (PE), em Bruxelas, um relatório (não vinculativo) sobre a Situação da saúde e dos direitos sexuais e reprodutivos na UE no contexto da saúde das mulheres, com o apoio e intervenção dos deputados do PCP.
Foi um relatório que causou muita celeuma nos sectores mais conservadores e reaccionários, que mobilizaram uma enorme campanha para que o relatório fosse rejeitado. Os seus argumentos, construídos à medida dos seus objectivos, baseavam-se em três premissas, algumas enganadoras:
1. «a saúde é uma competência dos Estados-Membros»: é verdade! E os deputados do PCP no PE frisaram isso ao longo das negociações do texto final. É por isso que o texto apela aos Estados-Membros (EM) para a promoção dos direitos sexuais e reprodutivos (DSR) e refere a cooperação entre EM na partilha de boas práticas;
2. «a UE quer acabar com os objectores de consciência»: havendo lugares onde os únicos médicos existentes são objectores de consciência, o que se pede é que haja mais profissionais de saúde que não o sejam de forma a que as mulheres possam aceder aos cuidados que procuram;
3. «o aborto não é um direito fundamental»: limitar os DSR à interrupção voluntária da gravidez (IVG) é subestimar outros aspectos essenciais para a saúde das mulheres, como um serviço público de saúde com qualidade e o acesso a serviços de saúde reprodutiva, incluindo cuidados de saúde materna e neonatal; o acesso gratuito a meios contraceptivos; serviços de planeamento familiar; ou a implementação da educação sexual.
Foram estes – mas podiam ser outros – os principais argumentos usados para ocultar que a criminalização da IVG não tem qualquer eficácia no combate ao aborto. Apenas o torna clandestino, desprotegido e perigoso para a saúde física e psíquica e, por vezes, para a própria vida das mulheres, com riscos acrescidos para as mulheres das camadas mais desfavorecidas.
As críticas justas a este relatório passam pela não integração da proposta do PCP pela gratuitidade destes cuidados de saúde e, obviamente, pelas políticas neoliberais, promovidas e apoiadas pela esmagadora maioria dos grupos políticos do PE, que há décadas são responsáveis pelo ataque a direitos laborais e sociais e, consequentemente, pelo ataque aos direitos das mulheres.
Na verdade, os importantes objectivos enunciados neste relatório – ou seja, a concretização prática dos direitos sexuais e reprodutivos das mulheres em cada país –, são contrariados pelas orientações e políticas da União Europeia, que promoveram e promovem a asfixia financeira dos serviços públicos, nomeadamente na área da saúde, contribuindo para o encerramento de maternidades e centros de saúde, para a carência de profissionais de saúde necessários ao efectivo cumprimento destes direitos das mulheres.
Os deputados do PCP no PE valorizam a aprovação deste relatório e denunciam o posicionamento dos sectores mais retrógrados que contra esses direitos se bateram (o PSD e o CDS votaram contra, o que não surpreende já que, em Portugal, em 2015, tentaram impor retrocessos legislativos nesta matéria). Além disso, reiteram a necessidade da luta pela ruptura com as políticas que impedem a concretização do direito das mulheres à saúde, incluindo os seus direitos sexuais e reprodutivos.