Olhar atento das Jornadas Parlamentares do PCP aponta soluções para os problemas do País
Diplomas do PCP centrados na defesa dos direitos dos trabalhadores estarão em debate no Parlamento dia 30. Para a bancada comunista, que «não se engana nas prioridades», este «é um tempo de elevar a luta e a intervenção» e de concretizar medidas que «respondam aos interesses dos trabalhadores e ao desenvolvimento do País».
Na política alternativa defendida pelo PCP está a a verdadeira solução para os problemas nacionais
Disse-o Jerónimo de Sousa ao intervir na sessão de abertura das Jornadas Parlamentares do PCP realizadas esta segunda e terça-feira na Casa do Alentejo, em Lisboa. O Secretário-geral do PCP exortava ao prosseguimento do combate pela «valorização do trabalho e dos trabalhadores», luta que «continua a ser necessária e indispensável para defender direitos e alcançar uma política alternativa em ruptura com a política de direita».
E foi sob esse signo da busca das melhores soluções, através da sua iniciativa e proposta, que decorreram estas Jornadas Parlamentares, cujas conclusões foram dadas a conhecer anteontem, em conferência de imprensa, pelo presidente do Grupo Parlamentar do PCP, João Oliveira.
Realizadas num contexto de agravamento da situação económica e social e do avolumar dos problemas que atingem os trabalhadores e o povo, foi neste plano que a atenção das Jornadas esteve focada, sem contudo perder de vista a realidade na Área Metropolitana de Lisboa e os problemas e necessidades das pessoas que nela vivem e trabalham. E o que os deputados comunistas puderam confirmar, após cumprirem um intenso programa de visitas e contactos, foram duas coisas para as quais logo na abertura dos trabalhos o presidente do Grupo Parlamentar do PCP, João Oliveira, chamara a atenção: uma, as debilidade e vulnerabilidades do País, após mais de quatro décadas de política de direita, que a epidemia veio expor de forma clara, e para os quais continua a não ser dada resposta; a outra, a ausência de combate ao aproveitamento que sectores patronais e os grandes interesses fazem da epidemia «como pretexto para agravar a exploração, liquidar direitos, degradar as condições de vida dos trabalhadores».
Opções erradas
Daí que uma e outra questão tenham estado no topo das prioridades e exigências saídas destas Jornadas, com os deputados do PCP a evidenciarem, desde logo, como a resposta à actual situação epidemiológica não está a ser a que deveria. «Mais uma vez o Governo faz a opção errada no combate à epidemia, centrando-a na restrição de direitos, em vez de dotar a estrutura de saúde pública e o SNS da capacidade de resposta necessária», lamentou o líder parlamentar comunista, para quem «rastrear, testar, vacinar e garantir os apoios sociais» continua a ser a solução para enfrentar a epidemia. Anunciada por si foi também a decisão de agendar na comissão de Saúde o projecto de resolução do PCP orientado para o reforço da Estrutura de Saúde Pública.
Mas o que as Jornadas projectaram também com grande força foi, por outro lado, a exigência de uma resposta à grave situação económica diferente da que tem sido dada pelo Governo, que foi acusado de continuar a «privilegiar a obsessão pela redução acelerada do défice, em vez do necessário investimento público».
Têm faltado medidas de apoio à economia, concluíram as Jornadas, de onde saiu um alerta: «a perspectiva do fim abrupto das moratórias em Setembro pode representar a entrada em incumprimento de milhares de famílias no crédito à habitação, e de milhares de empresas que recorreram a crédito bancário».
Depois de ter apresentado uma proposta que resolvia esta situação prolongando as moratórias, cujo alcance acabou por ficar limitado após alterações na especialidade de PS e PSD, o PCP voltará a apresentar propostas para evitar que, em Setembro, as famílias e as empresas se vejam à beira do abismo, «sem condições para começar o pagamento regular das prestações», garantiu o líder da bancada comunista.
Já quanto às medidas de apoio às empresas, reiterada nas Jornadas foi a posição de que é preciso reforçar os apoios e terminar com todas as discriminações, que têm tratado «como foras-da-lei os empresários que legitimamente decidiram recorrer a regimes simplificados».
Foco absoluto no trabalho
Questão central a dominar as Jornadas – erigida mesmo como «prioridade absoluta» – foi a da alteração da legislação laboral num sentido mais favorável aos direitos dos trabalhadores. Vendo-a como uma «necessidade nacional», para o PCP, como é dito no documento de conclusões, trata-se de corrigir um «desequilíbrio imposto pelos governos PSD/CDS e mantido pelo anterior e pelo actual Governo PS».
Daí que o agendamento potestativo na próxima quarta-feira, 30, incida exclusivamente sobre a alteração da legislação laboral, com o PCP a levar a debate quatro projectos de lei visando reduzir para 35 horas o horário semanal de trabalho, consagrar o direito a 25 dias de férias anuais, combater a precariedade laboral, alterar o regime de despedimento colectivo e do despedimento por extinção do posto de trabalho, revogar o despedimento por inadaptação.
A sua intervenção está porém longe de se esgotar nestas iniciativas. O combate a todas as formas de precariedade continua a mobilizar forças e a ser uma prioridade, como sublinhou anteontem na apresentação das conclusões das Jornadas João Oliveira, que se mostrou muito crítico com o facto de o Governo «insistir em opções que agravam e intensificam este quadro de exploração».
Dado foi o exemplo do Estatuto dos Profissionais da Área da Cultura, com uma «matriz» que mantém e normaliza a precariedade, não respondendo aos problemas principais que estão colocados aos trabalhadores das artes e da cultura. Mas é disso também testemunho o «recorrente recurso à externalização de serviços na Administração Pública, intensificando situações de precariedade, baixos salários e atropelo de direitos», quando, na óptica do PCP, isso não deveria ter sido feito e os «trabalhadores deveriam ter um vínculo» com as entidades públicas para as quais trabalham. Aprovada nas Jornadas foi, por isso, a decisão de requerer a audição na AR da ministra do Trabalho e Solidariedade Social e da ministra da Modernização do Estado e da Administração Pública para abordar esta realidade de desrespeito dos direitos dos trabalhadores.
Combate à corrupção
É já amanhã, 25, que estarão em debate na AR iniciativas legislativas tendo em comum o combate à corrupção. Este foi um tema a que as Jornadas deram uma especial relevância, atestada, aliás, no facto de o seu programa ter incluído reuniões com o Departamento Central de Investigação e Acção Penal do Ministério Público e com a Direcção Nacional da Polícia Judiciária. E que confirmaram o quão necessário é, no quadro do reforço da prevenção e do combate à corrupção, o reforço de quadros, de equipamento, de material, de infra-estruturas e de recursos técnicos especializados daquelas duas entidades.
Os dois projectos de lei que o PCP submete à apreciação do Parlamento têm em vista criminalizar o enriquecimento injustificado e proibir o Estado de recorrer à arbitragem para dirimir litígios de natureza administrativa.
No primeiro caso, sendo como é «uma solução conforme à Constituição», constitui um contributo decisivo para «impedir a ocultação de rendimentos injustificadamente obtidos», valorizou o líder parlamentar comunista.
Já no que se refere ao diploma sobre a arbitragem, questão a que o PCP atribui enorme relevância, o que está em causa – João Oliveira classificou-o de «escândalo de proporções colossais» - é a resolução de diferendos que envolvem centenas de milhões de euros entre o Estado e grandes empresas privadas, respeitantes nomeadamente a PPP, a concessões rodoviárias, ou outros contratos milionários, que são dirimidos não pelos tribunais, nem sequer pelo Centro de Arbitragem Administrativa, mas que «ficam dependentes de decisões arbitrais ad-hoc».
«O que se sabe é que o Estado aceita submeter-se a processos privados de decisão rodeados do maior secretismo e que o erário público sai sempre lesado em benefício dos interesses privados envolvidos», verberou o responsável pela bancada do PCP.
O que fica por dizer...
A situação da TAP, as questões relacionadas com a produção nacional (em particular com o problema do défice da balança agro-alimentar, com a pesca e a produção de bivalves no Estuário do Tejo), o desenvolvimento da Península de Setúbal (serviços públicos, mobilidade, acesso a fundos), o potencial do Laboratório Militar de Produtos Químicos e Farmacêuticos, o transporte ferroviário, foram outros tantos grandes temas que estiveram sob o radar das Jornadas Parlamentares do PCP. A eles voltaremos em próxima edição.