Trapalhadas, teimosias e desconsiderações
O Governo não ouve os trabalhadores do SEF acerca do seu próprio futuro
Lusa
Diz a sabedoria popular que o que começa mal tarde ou nunca se endireita. Assim parece estar a acontecer com tudo o que rodeia o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF).
Em finais do ano passado, o Governo anuncia uma reestruturação do SEF, num quadro em que estava acossado pela retoma mediática do inconcebível caso que resultou na morte de um cidadão ucraniano no aeroporto. Desse anúncio e da sua explicitação mais desenvolvida, percebeu-se que não se tratava só de tornar mais nítida a separação entre a componente administrativa e a componente policial, como consta do programa do Governo, mas o esfrangalhar pela PSP, GNR, Registos e Notariado e PJ de todo o serviço actual.
Uma coisa seria o sublinhado mais nítido entre a componente administrativa e a policial, pegando por exemplo no restante e integrando-o numa Polícia, ficando como componente do mesmo. Outra coisa completamente distinta é a atomização.
Passaram meses desde essa altura e sai uma resolução do Conselho de Ministros que plasma esse mesmo objectivo. Ao longo de todo esse tempo, nunca o Governo chamou as estruturas sindicais do SEF para qualquer conversa sobre o futuro do SEF, ou seja, sobre o seu futuro enquanto trabalhadores. Os mesmos que são saudados pelo seu trabalho em Odemira, nos aeroportos ou no âmbito internacional, são os mesmos que depois são desconsiderados no aspecto mais básico que tem a ver com o seu futuro como trabalhadores.
Ficou entretanto notório que o Governo pretende tratar tudo isto à margem da Assembleia da República. Argumenta com o facto de o SEF ser um Serviço de Segurança e não uma Força de Segurança e que, por isso, tal matéria não é reserva absoluta de tratamento da Assembleia. Acontece que as medidas que o Governo quer adoptar não mexem só com o SEF. Não se trata de adoptar uma nova orgânica interna no SEF ou entre este e outros serviços da Administração Pública. As medidas que o Governo pretende tomar interferem também com a PSP e a GNR.
Decisão inaceitável
Em face de toda a situação, uma das estruturas sindicais do SEF decidiu marcar paralisações, reclamando serem ouvidos pela tutela sobre o seu futuro. Em face disso, o Governo decide pela requisição civil, argumentando com o estado de calamidade, a pandemia, a fiscalização das fronteiras e controlo sanitário nas mesmas. Não exigiu ou impôs serviços mínimos, pura e simplesmente suspende inaceitavelmente os direitos. Aliás, esta não é a primeira paralisação do SEF em estado de calamidade. No início de Maio houve uma e tudo decorreu dentro da normalidade. O que mudou? Deixa-se aos leitores a fácil resposta.
No conjunto da argumentação utilizada para justificar tal decisão, ficamos também a saber que é o SEF que faz controlo sanitário. É uma função do SEF? Não deveria ser uma função de estruturas ligadas à saúde? É o pessoal do SEF que tem de controlar passaportes e vistos, verificar se os testes negativos e se é falso ou verdadeiro o documento que o comprova, etc? É adequado um problema de saúde ser tratado junto dos cidadãos por uma força de segurança?
Mas há aquilo que não foi dito. Por exemplo, não foi dito que esses mesmos profissionais ainda não receberam o subsídio atribuído ao denominado pessoal da linha da frente. Não foi dito que há ainda profissionais destes, que estão em contacto com centenas de cidadãos, que ainda não foram vacinados.
Voltando ao início, o que começou mal prossegue agora acrescidamente mal.