Direito ao cumprimento dos horários, sim! Manipulação sobre «desconexão laboral», Não!
O trabalhador tem direito legal a um horário de trabalho devidamente definido
O Livro Verde sobre o Futuro do Trabalho elaborado pelo Governo do PS e apresentado na passada semana, para além das matérias relacionadas com o Teletrabalho e as Plataformas Digitais não se esqueceu, invocando a conciliação da vida profissional com a vida pessoal e familiar, do que chamam Direito à Desconexão. Mais parece que com isso descobriram a pólvora na defesa dos direitos dos trabalhadores e alguns dirão «bem pensado!» Não podiam estar mais equivocados.
A luta pela redução da jornada de trabalho levada a cabo pelo movimento operário atravessou os séculos XIX e XX. Em Portugal, com a Revolução do 25 de Abril de 1974, foi conquistado o direito a um horário de trabalho de oito horas diárias, significando que as restantes 16 se destinariam ao lazer, ao tempo para a família e ao tempo para descansar. Uma luta que continua hoje, no século XXI, por horários dignos e por tempo para viver, dando continuidade à reivindicação universal avançada em 1886 pela Associação Internacional do Trabalho (AIT) e traduzida na fórmula 8x8x8 – oito horas de trabalho diário; oito horas para lazer, convívio e cultura e oito horas para dormir e descansar –, reivindicação ainda hoje válida.
E agora, pela mão do Governo PS e de outras forças políticas, pretendem dar aos trabalhadores o direito a desligar os seus instrumentos de trabalho, entenda-se, telemóveis, computadores e outros instrumentos tecnológicos, fora do seu horário de trabalho para poderem fruir do tempo com a família e para descansarem. Fundamentam ainda que já vários ordenamentos jurídicos europeus inscreveram na sua legislação laboral este «direito», articulado sempre com a qualidade de vida, direito à intimidade e direito ao descanso.
O direito à desconexão laboral, ou direito a desligar, como muitos referem, é agora apresentado como o alfa e ómega dos direitos dos trabalhadores. Mas serve quem e para quê? Na verdade, a evolução digital veio clarificar que serve para adequar a organização do tempo de trabalho aos interesses do patronato, impondo na prática prolongamentos do tempo de trabalho não remunerado e consequentemente um aumento da jornada de trabalho.
Pretendem inscrever na lei um direito que já existe, e se desdobra no direito ao descanso, no direito ao lazer, no direito à conciliação da vida profissional com a vida pessoal e familiar. Fazem-no deixando de parte, de forma consciente, aquela que deve ser a resposta aos problemas de fundo como o cumprimento e a regulação dos horários de trabalho e a existência de uma fiscalização eficaz e um regime contraordenacional que seja dissuasor dos ataques aos direitos dos trabalhadores.
O trabalhador tem direito legal a um horário de trabalho devidamente definido, estando, portanto, implícito que além desse horário tem o direito de não responder a solicitações da sua entidade patronal «desligando-se» (se assim lhe quiserem chamar) do trabalho. Inscrever na lei o «direito à desconexão laboral» é admitir que o trabalhador está permanentemente ligado ao trabalho em jornada contínua. Tal significa um enorme retrocesso naquela que foi e é a luta dos trabalhadores por um horário digno e pelo seu respeito e cumprimento!
É tempo de agir. Garantir horários dignos. Tempo para viver. Tempo para viver em família. Tempo para pais e mães estarem com os seus filhos, acompanharem os seus filhos em todas as dimensões do seu crescimento e desenvolvimento. É um direito do trabalhador e da sua família!