A «derrota estrondosa» que afinal não existiu
Candidatura de João Ferreira
Número de votos similar a 2016
Maior expressão eleitoral
Aumento de votos em 15 dos 20 distritos e regiões autónomas
À medida que iam sendo conhecidos os resultados das eleições de domingo, vários comentadores, dirigentes políticos e candidatos avançaram com uma tese, amplamente difundida noite dentro e nos dias seguintes: a candidatura apoiada pelo PCP teria sofrido uma derrota estrondosa, perdido expressão em concelhos que eram seus bastiões, sobretudo no Alentejo, e milhares dos seus eleitores teriam ido a correr votar no candidato da extrema-direita. Ora, esta tese tem um problema à partida: é falsa e não há qualquer dado minimamente concreto que a sustente.
Comparemos então os resultados eleitorais alcançados pela candidatura de João Ferreira com a que, em 2016, foi assumida por Edgar Silva: o primeiro alcançou 182.998 votos, representando 3,95 por cento, e João Ferreira 180.473 votos e 4,32 por cento. Não só a expressão eleitoral aumentou, de 2016 para agora, como o número de votos foi praticamente o mesmo. Para uma mais ampla compreensão do significado destes números importa referir que votaram no domingo menos 478 mil pessoas do que nas anteriores eleições presidenciais.
Outro dado a ter em conta é a votação obtida em 2016 na Madeira por Edgar Silva (que era, como é, coordenador do PCP na região), que foi aí o segundo candidato mais votado. Comparando as votações no arquipélago, João Ferreira perdeu mais de 20 mil votos em relação às eleições de há cinco anos, o que significa que cresceu significativamente no resto do País – mais de 17 mil votos. Dos aumentos, verificados em 15 dos 20 distritos e regiões autónomas, destaca-se o distrito de Lisboa, onde João Ferreira obteve oito mil votos a mais relativamente a 2016.
Percebe-se o que lhes dói: o progresso eleitoral do candidato apoiado pelo PCP e o quanto ele destrói a tese do «declínio irreversível».
Do PCP... para o PCP
Passemos aos ditos bastiões, de onde o candidato apoiado pelo PCP terá sido varrido, ainda por cima para a extrema-direita. Uma vez mais, os números não confirmam essa ideia, antes pelo contrário. Em Aljustrel, por exemplo, João Ferreira alcançou mais de 25% dos votos, face aos 24,20% de Edgar Silva. Em Évora, os 7,92% de domingo vão além dos 7,17 de há cinco anos, tal como em Vila Viçosa os 8,48% suplantam os 7,91 de 2016.
A lista não termina aqui: no concelho de Cuba, João Ferreira obteve 23,04%, enquanto Edgar Silva alcançara 20,53%; em Mértola, os 21,79% ultrapassam os 20,96% de 2016, tal como em Sesimbra 7,2% suplanta os 6,88 das eleições anteriores. Em Setúbal e no Seixal, João Ferreira obteve 7,37% e 8,55% face aos 7,02 e 8,50 de há cinco anos. Na Marinha Grande, os 8,8% de João Ferreira também foram além dos 7,79 de Edgar Silva.
Noutros desses bastiões, a votação em João Ferreira não alcançou a do candidato apoiado pelo PCP em 2016, mas por pouco. São os casos de Serpa (24,13% no domingo face a 28,08 há cinco anos), Mora (20,72% em João Ferreira e 24,75% em Edgar Silva), Avis (28,47% em 2020 e 31,31% em 2016), Alpiarça (19,35% face a 22,43%), Arraiolos (João Ferreira, 19,12%, e Edgar Silva 19,41%), Beja (14,44% há dias e 14,55% há cinco anos), Santiago do Cacém (11,05% agora e, em 2016, 12,12%) ou Vidigueira (13,44% em João Ferreira e 14,01% em Edgar Silva).
Assim, à pergunta «para onde foram os votos alcançados pelo PCP?», a resposta é simples: para João Ferreira! O resto é mistificação.