Leilão do 5G: são milhões, mas são para eles

Manuel Gouveia

A liberalização das telecomunicações levou ao aumento do custo para os utilizadores

Começou o leilão do 5G. Com os habituais anúncios de receitas de milhões (49 milhões na primeira ronda, 61 na segunda, e vêm aí mais rondas) que os mais distraídos pensam ser uma oferta de generosos grupos capitalistas, e de facto não são mais que adiantamentos feitos por agiotas que amanhã pagaremos com juros inimagináveis.

É que a troco desses milhões está a ser entregue, por 15 anos, mais um conjunto de faixas do espectro electromagnético nacional para operadores privados o poderem explorar, prosseguindo a liberalização do sector das telecomunicações. Uma liberalização que é a responsável por hoje em Portugal se pagar um valor elevadíssimo pelos acesso às telecomunicações (a maioria das famílias paga mais pelas telecomunicações que pela água, a electricidade ou o saneamento), e pelo acesso às redes estar fortemente condicionado pela falta de investimento na universalização, com vastas regiões do País excluídas de um serviço de qualidade.

A grande diferença face a processos anteriores está no combate que este tem merecido por parte do oligopólio que domina o mercado nacional – NOS, Altice, Vodafone – que pretendem: dificultar a entrada de novos concorrentes no mercado, pagar menos pela utilização das novas frequências e ver reduzidas as obrigações contratuais, nomeadamente de acesso efectivo à rede nas zonas não lucrativas.

A violência com que estes grupos monopolistas atacam a ANACOM tem a ver com o facto de se sentirem ameaçado no seu papel dominante. E a abordagem da ANACOM não tem nada de revolucionário, limita-se a aplicar a lei liberalizante quando os actuais detentores do monopólio acham que a liberalização deve terminar com a transferência do Estado para eles do domínio do sector. A ANACOM limita-se a acreditar que promover uma maior e mais justa concorrência e regular o mercado são as mezinhas para todos os problemas.

E é por isso que denunciamos os interesses por detrás da campanha montada pelo oligópolio mas sem aplaudir o que a ANACOM está a fazer, e até tentámos travar o leilão através do Projecto de Resolução «Em defesa de um Serviço Público de Telecomunicações», chumbado na Assembleia da República em Novembro.

É que a mezinha não dá os resultados que promete, e começa a ser tempo de o perceberem aqueles que nela acreditam ingenuamente. Produz ricos mais ricos e não riqueza, promove a precariedade laboral efectiva, leva ao sequestro de quaisquer tentativas de regulação, cria um monopólio privado sobre um sector cada vez mais estratégico, com prejuízo da soberania nacional e reforçando os mecanismos de dominação das massas nas mãos dos que as oprimem.

É preciso a coragem e a vontade de seguir outro caminho: preservar o domínio público sobre o espectro electromagnético, reconstruir uma empresa pública e nacional de telecomunicações, universalizar o acesso às redes, reduzir o custo do serviço, assegurar as necessidades estratégicas do País e valorizar o trabalho e os trabalhadores do sector.




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