Se é o povo quem paga a conta o Novo Banco tem de ser público
PROTESTO O PCP não desiste da nacionalização do Novo Banco, que continua a sorver avultados recursos públicos. A exigência foi reiterada em iniciativas nas ruas de Lisboa e do Porto, ao final da tarde de quinta-feira, 15.
A banca pública é a única possibilidade de garantir o interesse público
Em Lisboa, a acção de protesto e denúncia percorreu artérias centrais da capital, entre a antiga sede do Banco Português de Negócios (BPN) e a actual sede do Novo Banco (NB), entidade a que deu lugar o falido Banco Espírito Santo (BES). De cartazetes ou bandeiras do PCP na mão, atrás de um pano onde se podia ler «Exigimos a nacionalização do Novo Banco», à frente do qual seguia um grupo de jovens percussionistas que nunca parou de se fazer ouvir, dezenas de militantes comunistas entoaram palavras de ordem, como «para a banca vão milhões, para os trabalhadores só tostões», ou «Abril, de novo, banca nas mãos do povo».
O desfile, da Avenida António Augusto de Aguiar até à Avenida da Liberdade, durou cerca de 45 minutos e não deixou ninguém indiferente. E foi já na placa central situada a escassos metros do edifício do NB que aos manifestantes se juntaram Duarte Alves, deputado do PCP na Assembleia da República, e Jorge Pires, membro da Comissão Política do PCP. Foi também aí que Jerónimo de Sousa deu voz à indignação e reivindicações do Partido.
De resto, o Secretário-geral do PCP começou a sua intervenção justificando que as iniciativas levadas a cabo decorrem da avaliação de que «é preciso acabar com a transferência de dinheiros públicos para salvar bancos privados, quando está confirmado que os problemas que esses bancos atravessaram ou atravessam são, em grande medida, devidos à gestão danosa dos seus accionistas. O que não os tem impedido de se apoderarem de milhares de milhões de euros em lucros e dividendos».
O dirigente comunista recordou que, desde 2008, aquando da «intervenção estatal no BPN, «várias foram as instituições financeiras suportadas pelos recursos públicos com os governos do PS, do PSD e do CDS a utilizarem o Estado e a lei para salvar os banqueiros, a pretexto da estabilidade do sistema financeiro».
«Dinheiro que foi sempre recusado para resolver problemas dos trabalhadores e do País», acrescentou, dando como exemplos propostas do PCP como o aumento das pensões e reformas ou dos salários, incluindo do Salário Mínimo Nacional; de investimento nos serviços públicos, nomeadamente para reforçar o Serviço Nacional de Saúde e a Escola Pública; de apoio às micro, pequenas e médias empresas, à criação e fruição culturais, entre outras necessidades do País», para as quais «os governos do PS, do PSD e do CDS invocaram sempre dificuldades económicas».
Jerónimo de Sousa revelou, depois, quanto já custaram ao erário público as «recapitalizações da banca», fundamentalmente da banca privada (ver caixa), e qualificou a resolução do BES e a separação entre «banco bom e banco mau» de «autêntica fraude política», realizada «com o apoio do Governo PSD/CDS e do então Presidente da República Cavaco Silva» e em «plena intervenção da troika estrangeira e sob o comando da União Europeia (UE)». Mas se esse histórico merece ser adjectivado de «embuste» e confirma as advertências do PCP, «a venda do Novo Banco a um “fundo abutre”, a Lone Star, em 2017, transformou-se num negócio ainda mais ruinoso para o Estado», uma vez que, chamou à atenção, «desde a assinatura do contrato de venda do NB à Lone Star que se sabia que esta iria recorrer a todo o capital [público] disponível».
Ora, «quase três anos passados, confirma-se essa probabilidade, sempre em nome da estabilidade financeira do banco e do sistema financeiro no seu todo», frisou.
Solução de fundo
Neste contexto, é oportuno questionar a razão pela qual «não foi o NB nacionalizado» se «o Estado já injectou na instituição cerca de
9000 milhões de euros». O Secretário-geral do PCP formulou a pergunta e, apontando baterias à questão de fundo, salientou que «a experiência tem mostrado, de forma concludente, que a banca pública é a única maneira de conservar o sistema bancário nacional», já que, sublinhou ainda, «a privatização das instituições financeiras conduz, mais cedo ou mais tarde, à sua aquisição ou domínio, devidamente expurgadas dos activos tóxicos e recapitalizadas, nomeadamente com fundos públicos, por parte dos megabancos europeus, como se verificou na entrega do Banif ao Santander e como se preparam para fazer com a futura venda do Novo Banco».
Já o Governo, prosseguiu Jerónimo de Sousa, «insiste em fugir às suas reais responsabilidades escondendo-se por detrás das orientações da UE em matéria de sector financeiro e procura criar as condições para continuar amarrado aos elementos centrais da política de direita, mantendo a possibilidade do Novo Banco utilizar todo o dinheiro disponível no valor de 3,9 mil milhões de euros, permitindo assim à Lone Star limpar o banco de activos tóxicos e vendê-lo, limpo, sem”osso”, com mais valias significativas».
«A banca pública é a única possibilidade de garantir o interesse público e nacional, de evitar gravosas orientações determinadas pelos centros do capital financeiro transnacional, de limitar as distorções da concorrência pela grande concentração bancária privada, de recuperar uma alavanca imprescindível para o desenvolvimento soberano do País, pelo que se impõe a nacionalização do sector no seu todo», afirmou Jerónimo de Sousa, que voltando ao caso do NB, insistiu, por outro lado, que a sua nacionalização «é a solução mais segura e duradoura, apesar de tardia, capaz de contribuir para, a curto prazo, as famílias e as empresas poderem aceder ao crédito de que necessitam com taxas de juro não especulativas e, desta forma, contribuir para a dinamização da economia nacional».
Aliados pela nacionalização
Ao mesmo tempo que o Secretário-geral do Partido intervinha em Lisboa frente à sede do Novo Banco, Jaime Toga, da Comissão Política do PCP, dirigia-se a dezenas de militantes comunistas concentrados na Avenida dos Aliados, também sob o lema «contra os escândalos da banca e a corrupção, impõe-se a nacionalização».
Jaime Toga explicitou os dois objectivos centrais da iniciativa: denunciar os escândalos e a corrupção dizendo quem são os responsáveis e quem lucra, bem como exigir a nacionalização da banca para a colocar ao serviço do povo e do País.
«Uma nacionalização que não significa meter mais dinheiro nos bancos», mas, considerou igualmente, «se há milhares de milhões de euros públicos metidos na banca, então queremos ter o poder correspondente a esse dinheiro, queremos dirigir e decidir.
«São milhares e milhares de euros que faltam aos trabalhadores, aos desempregados, aos reformados, à Escola Pública e ao SNS», e, assim, «é preciso dizer basta!».
«Basta de usar o dinheiro público para tapar os buracos da banca!», repetiu Jaime Toga, para quem, no que ao NB diz respeito, «se é o Estado quem paga as contas, então o banco tem que ser do Estado!»
Pesada factura
«De acordo com o Banco de Portugal, entre 2008 e 2010, em plena crise do sector financeiro, os sete maiores bancos distribuíram cerca de 2000 milhões de euros em dividendos».
«Entre 2008 e 2015, as operações de recapitalização realizadas nos 8 maiores bancos nacionais foram de 18 456 mil milhões de euros, dos quais 12 250 milhões de euros em garantias e empréstimos do Estado».
Desde a falência do BPN, o Estado português já disponibilizou mais de 20 000 milhões de euros, cerca de 9000 milhões em resultado da resolução do BES e da venda do Novo Banco à Lone Star».
«Desde a assinatura do contrato de venda do Novo Banco à Lone Star que se sabia que esta iria recorrer a todo o capital disponível de 3,9 mil milhões de euros».