O VII Congresso da Internacional Comunista e a luta do PCP pela democracia e o socialismo
PROJECTO O VII Congresso da Internacional Comunista, realizado em Moscovo entre 25 de Julho e 20 de Agosto de 1935, constituiu um momento decisivo para o desenvolvimento dos partidos comunistas e para a vitória sobre o nazi-fascismo. O seu legado político e ideológico mantém, 85 anos passados, flagrante actualidade.
As orientações do VII Congresso da IC mantém em múltiplos aspectos uma flagrante actualidade
As conclusões deste que foi o último congresso da IC (dissolvida em 1943) permanecem, em múltiplos aspectos, bastante úteis para os combates do nosso tempo. Mas comecemos pela história. E, desde logo, pelo contexto complexo, contraditório e em acelerado desenvolvimento em que se realizou, que o levou a proceder a uma significativa viragem estratégica e táctica no movimento comunista.
À entrada da década de 30, o capitalismo debatia-se com uma crise profunda, a mais grave que até então enfrentara. O grande capital, decidido a que os custos da crise recaíssem sobre os trabalhadores e os povos, desencadeou uma poderosa ofensiva, intensificando ainda mais a exploração e atacando direitos e liberdades democráticas. Os partidos comunistas e sindicatos revolucionários, animados pelos retumbantes êxitos da União Soviética na edificação do socialismo, eram os mais firmes obstáculos a estes desígnios, tornando-se alvos prioritários a abater.
O fascismo revelava-se o mais eficaz recurso para concretizar tais objectivos, graças ao seu programa violentamente revanchista, anticomunista e antipopular. A grande burguesia encontrara a sua «tropa de choque» e não tardaria muito até que vários países estivessem dominados pelo fascismo. Dos 22 partidos comunistas existentes na Europa aquando do VII Congresso, só 11 actuavam em situação de legalidade ou semi-legalidade. Os sindicatos revolucionários (e em muitos casos, até reformistas) tinham já sido ilegalizados. Era a própria vida a demonstrar a urgência de adequar a estratégia e a táctica da luta revolucionária à dura realidade desse tempo.
O nazi-fascismo preparava activamente, com a conivência dos países capitalistas ocidentais, o desencadear de uma guerra para esmagar a União Soviética e o movimento comunista e operário.
Contra o fascismo e a guerra
No VII Congresso da Internacional Comunista participaram 513 delegados em representação de 65 partidos comunistas e várias organizações internacionais. A delegação do PCP era chefiada pelo Secretário-geral, Bento Gonçalves. Contando com a presença de muitos dos mais destacados dirigentes comunistas do mundo, o Congresso elegeu como presidente honorário o alemão Ernst Thälmann, que se encontrava preso (e que seria assassinado anos mais tarde no campo de concentração de Buchenwald).
Foram muitos e complexos os temas em debate no VII Congresso da IC. Os seus relatórios mais importantes foram previamente preparados e debatidos com vários dos partidos integrantes da Internacional. Particular importância assumiram os apresentados por Georgi Dimitrov e Palmiro Togliatti, respectivamente A ofensiva do fascismo e as tarefas da Internacional Comunista na luta pela unidade da classe operária e A preparação da guerra imperialista e as tarefas da Internacional Comunista. Dimitri Manuilsky e Wilhelm Pieck apresentaram os balanços da actividade do Comité Executivo da IC e da edificação do socialismo na União Soviética.
A definição de fascismo e a estratégia e táctica mais apropriadas para lhe dar combate preencheram parte considerável dos trabalhos do Congresso. Partindo de reflexões teóricas e experiências práticas que alguns partidos, e a própria IC, foram consolidando nos meses que o antecederam, o Congresso consolidou a definição de fascismo como a «ditadura terrorista aberta dos elementos mais reaccionários, mais chauvinistas e mais imperialistas do capital financeiro».
Se esta é, hoje, uma concepção «clássica», na altura foi não só de um extraordinário alcance político e ideológico, como de enorme utilidade para a luta dos comunistas e, de modo mais geral, para a própria resistência ao nazi-fascismo. No movimento comunista, contribuiu decisivamente para afastar visões erradas e amplamente difundidas que sobrevalorizavam a base social fundamental do fascismo, pequeno-burguesa, face à questão (decisiva!) da natureza de classe do Estado. Ao mesmo tempo, foi determinante para dar combate a teorizações erradas e paralisantes assumidas sobretudo pela social-democracia.
Compreendidas a natureza e dimensão da ameaça fascista e clarificado com precisão o inimigo principal, foi então possível ao movimento comunista definir etapas, fases e alianças e traçar com acerto as tarefas políticas e organizativas mais adequadas: lutar contra o fascismo e os perigos de uma nova guerra tornaram-se tarefas inseparáveis e imediatas.
Ganhar as massas
Assumindo como tarefa central dos comunistas, naquele tempo, a luta contra o fascismo e a guerra, o VII Congresso considerava (numa visão plena de actualidade) que essa luta não podia ficar limitada à participação das vanguardas: era decisivo que nela tomassem parte activa as amplas massas operárias e populares e sectores políticos e sociais diversificados. Como fazê-lo, era a grande questão: a criação de frentes populares e anti-imperialistas, assentes na unidade da classe operária (mas indo muito para lá dela), foi a resposta saída daquele histórico Congresso, cujo alcance projectou-se – e projecta-se – muito para além daquela situação concreta.
Bem vivas na memória estavam as recentes jornadas em França, nas quais a classe operária se uniu e, pela primeira vez, derrotou a tentativa de assalto ao poder pelo fascismo. A frente única concretizou-se aí no combate concreto, apontando o rumo a seguir, não só para a primeira e essencial tarefa de travar o passo ao fascismo, como, daí partir para a luta mais geral por profundas transformações sociais, económicas e políticas: os extraordinários avanços revolucionários e progressistas alcançados no pós-guerra confirmam as potencialidades destas orientações e o empenho que então foi colocado na sua concretização, pese embora incompreensões e atitudes sectárias que persistiam.
A afirmação do papel de vanguarda dos partidos comunistas, evidenciou-se no Congresso, não se confirmava pelas proclamações feitas, mas pelo papel que efectivamente desempenhassem na luta quotidiana da classe operária e pela influência conquistada nas organizações de massas: a orientação de intervir dentro do movimento sindical reformista ou mesmo fascista, foi determinante para que os comunistas e seus partidos reforçassem a sua ligação às massas. E não foi Lénine quem salientara, anos antes, a necessidade dos partidos comunistas ganharem a maioria da classe operária?
Esta viragem ousada operada na orientação da IC acrescentava premência a outra questão, plenamente actual: a da afirmação própria dos partidos comunistas.
O VII Congresso e o PCP
A viragem operada na orientação do movimento comunista no VII Congresso fez-se sentir no PCP, pese embora a prisão de Bento Gonçalves pouco depois de regressar de Moscovo e dos duros golpes desferidos pela repressão na organização partidária até final da década de 30. No próprio Congresso, Bento Gonçalves sublinhara já que, nas condições específicas de Portugal daquele tempo, a frente única tinha de realizar-se «na base da luta pelas reivindicações imediatas da classe operária e das camadas laboriosas da população».
E assim se fez, sobretudo após a reorganização de 1940/41, na qual Álvaro Cunhal desempenhou um papel decisivo. O PCP assumiu e desenvolveu as orientações da IC quanto à unidade da classe operária, à unidade antifascista, à associação entre actividade legal, semi-legal e legal, assumindo-se na prática e inquestionavelmente como vanguarda da classe operária e motor da luta e da unidade antifascistas.
O III e IV congressos do PCP (os primeiros na clandestinidade), realizados em 1943 e 1946, consagraram estas novas orientações; a Revolução Democrática e Nacional, assumida no VI Congresso, de 1965, é um extraordinário exemplo de desenvolvimento criativo das teses leninistas sobre a correlação entre a luta pela democracia e a luta pelo socialismo, que a IC retomou e actualizou no seu VII Congresso. O mesmo se poderá dizer do actual Programa Uma Democracia Avançada – Os Valores de Abril no Futuro de Portugal.
Ensinamentos úteis
Hoje, tantos anos passados sobre este Congresso histórico, as orientações dele emanadas não só mantêm, como em múltiplos aspectos reforçam, a sua actualidade e premência: a crise do capitalismo, a ofensiva imperialista, o aumento da exploração, a ameaça de guerra e o ressurgimento de movimentos e organizações de cariz fascista obrigam os revolucionários a revisitar o VII Congresso da IC.
Particularmente úteis são as que versam sobre a unidade da classe operária, a cooperação entre partidos comunistas e outras forças democráticas e progressistas, o alargamento e consolidação da frente anti-imperialista, a afirmação própria e independente dos partidos comunistas, a definição rigorosa de etapas e fases de luta, e, consequentemente, das tarefas dela decorrentes. Assim, tal como os comunistas que resistiram e lutaram nesses tempos duros, seremos capazes hoje de travar o passo ao imperialismo e à guerra e abrir caminhos de futuro!