Estatuto do Antigo Combatente

Rui Fernandes

Os antigos combatentes são merecedores de reconhecimento não apenas em palavras mas sobretudo em apoios concretos

Foi aprovado no passado dia 23 de Julho o Estatuto do Antigo Combatente (EAC), com a abstenção do PCP. Foi grande o júbilo mediático correspondendo, aliás, à pressa de alguns para a sua aprovação. Uma pressa que se compreende face a um adiar sistemático ao longo de anos, mas uma pressa que em muitos casos ignorou o conteúdo. É útil recordar que a primeira vez que foi suscitado o problema dos ex-combatentes, através de uma proposta para que fosse estudada a situação, foi pela mão do PCP e estará agora a fazer, sensivelmente, 20 anos. Duas décadas em que sectores de extrema-direita e o CDS manipularam, mistificaram, manobraram. Duas décadas em que o PS e o PSD, sozinhos ou acompanhados, foram gerindo as ondas, os ânimos e fazendo passar, de forma mais ou menos clara, a ideia de que o PCP era contra os ex-combatentes (confundindo o ser contra a guerra colonial com o ser contra os milhares de portugueses que em cumprimento do serviço militar obrigatório eram enviados para a guerra) e trocando melhorias concretas para a vida desses ex-militares por lápides, estátuas, paradas, etc., ou seja, foram anos em que foi dada primazia ao simbólico em detrimento do concreto.

Agora, na aprovação do EAC o PCP absteve-se porque, como consta na declaração de voto que apresentou, lamenta que questões essenciais que constavam do seu projecto de lei não tenham sido aprovadas derivado do voto contra do PS e do PSD. Foi o caso:

  1. da gratuitidade do apoio médico e medicamentoso em doenças raras ou crónicas;

  2. do Complemento vitalício de pensão, no montante de 50 euros mensais, a atribuir aos antigos combatentes beneficiários do complemento especial de pensão ou do acréscimo vitalício de pensão previstos nas Leis n.º 9/2002, de 11 de fevereiro e 3/2009, de 13 de janeiro;

  3. da pensão mínima de dignidade, que visava garantir faseadamente que nenhum antigo combatente auferisse pensão inferior ao salário mínimo nacional.

É que a verdade é que a Lei n.º 9/2002, de 11 de Fevereiro, aprovada na sequência de promessas eleitorais feitas aos antigos combatentes, nunca foi cumprida na totalidade, nem pelo governo que a fez aprovar nem pelos governos que se lhes seguiram. A maioria dos antigos combatentes, pouco ou nada beneficiou da aplicação desse dispositivo legal e da Lei n.º 3/2009, de 13 de Janeiro que se lhe seguiu. Muitos antigos combatentes sentiram, justamente, que foram traídos nas suas expectativas. Isso será, provavelmente, aquilo que sentirão muitos agora mas, espera-se, estará clarificado quem lida, como sempre lidou, com seriedade e sentido de responsabilidade para dar resposta aos problema, porque como diz o povo não há mentira que sempre dure nem verdade que não venha à tona.

Como refere a declaração de voto, o PCP saúda os antigos combatentes que, por terem sido sacrificados numa guerra injusta, deveriam ser merecedores de um reconhecimento público não apenas em palavras e gestos simbólicos mas sobretudo em apoios concretos capazes de melhorar as suas condições de vida. Foi esse o princípio que o PCP defendeu neste processo legislativo e é por ele que o PCP continuará a lutar.




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