Tentativa

Correia da Fonseca

Tendo decerto ouvido dizer que no aproveitar é que está o ganho, a direita tentou aproveitar o clima social suscitado pela pandemia do vírus 19 para pôr em questão a realização da Festa do Avante!. Para tanto, brandiu uma aparente semelhança: se, por razões de prudência à escala social, e de natureza económica, aliás a pedido dos seus promotores, estão interditos os festivais musicais que, como se sabe, reúnem ao ar livre muitos milhares de assistentes concentrados em espaços limitados, aí estaria a razão para que a Festa do Avante! não pudesse ser realizada. A manobra surgiu na televisão tal como decerto noutros «media», e também na televisão surgiu o esclarecimento do PCP: a Festa do Avante! não é apenas, aliás nem principalmente, um festival de música, mas sim um evento multidisciplinar em que a música surge como um dos elementos integrantes entre muitos outros. Quem alguma vez tenha visitado a Festa verificou que nela a música é apenas uma componente e que, dentro dos elementos de carácter cultural que a integram, há muito por onde escolher entre exposições, palestras, colóquios e iniciativas afins. E aproveitemos para salientar, de passagem, que também na área musical há na Festa uma grande diversidade, muito por onde escolher, desde o «rock» até à música de concerto que não fica nada mal ao lado do pavilhão onde se vendem milhares de livros ou de um outro onde notáveis pintores contemporâneos expõem quadros seus.

Dos quatro cantos do mundo

Aproveitemos para referir, de passagem, que a diversidade cultural presente na Festa é reforçada pela presença de delegações estrangeiras vindas dos vários cantos do mundo, o que permite uma diversidade cultural que é mais um factor que distingue a Festa do Avante! Não ficarão por aqui as razões por que esta Festa não pode ser confundida com qualquer outra que pouco ou nada exceda a audição de algum tipo de música e por aí se fique, mas talvez que os argumentos ainda que superficialmente já invocados bastem. Em resumo, acentue-se que o carácter e as dimensões da Festa do Avante! são tão específicos e peculiares que até fica mal a quem a pratique essa tentativa de meter no mesmo saco, digamos assim com perdão do plebeísmo, esta Festa e festinhas de índole e dimensão completamente diversas. Bem se sabe, é certo, porque faz parte da chamada sabedoria popular, que em tempo de guerra não se limpam armas, mas a mesma sabedoria não impede a distinção entre armas limpas e armas porcas. Esta tosca tentativa para tentar a proibição da Festa do Avante! a pretexto de que festas são festas e o adequado é interditar todas elas, fechando os olhos a diferenças e índoles diversas, é manifestamente uma tentativa de crime contra a liberdade de manifestação, de criação artística e de actividade política. O que, já se vê, não repugna a sectores da direita como que embriagados pelo ódio ao PCP, à Festa, ao Povo. Mas que têm de ter paciência.




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