Concurso da DGArtes coloca em causa a produção cultural nacional
INVESTIR Jerónimo de Sousa visitou o Teatro dos Aloés, na Amadora. Na conversa com os anfitriões ressaltou a clara insuficiência dos apoios anunciados pela Direcção-Geral das Artes no concurso bienal lançado dia 11.
O Governo tem de deixar de ver o apoio às artes como uma despesa
Na terça-feira, dia 22, pelas 10h45, começou a visita do Secretário-geral do PCP às instalações do Teatro dos Aloés, nos Recreios da Amadora. Dezenas de actores da companhia residente esperavam a delegação, de que faziam também parte Ana Mesquita, deputada na Assembleia da República, Jorge Pires, membro da Comissão Política do Comité Central, e Miguel Soares, membro do CC.
A companhia dos Aloés foi uma das 50 estruturas culturais e artísticas que assinaram uma carta endereçada ao primeiro-ministro, tomando posição pela necessidade do reforço da verba atribuída ao apoio às artes. À pertinência desta questão acrescenta-se o facto de haver candidaturas que foram consideradas elegíveis, mas não irão receber qualquer tipo de apoio.
Ana Mesquita, que já tinha contactado anteriormente com a equipa do Teatro dos Aloés, afirmou que «esperámos sempre que estas situações não piorassem e cá estamos nós, hoje, com uma avaliação de 79,75 por cento», «uma coisa absolutamente absurda, porque equivale a dizerem às estruturas que têm um óptimo projecto, mas que não há dinheiro para lhes darem».
No decorrer da visita, vários dos actores apresentaram à comitiva comunista algumas das suas preocupações e anseios diários, desde a precariedade da sua situação laboral à falta de estabilidade que não é garantida pelo método de apoio e financiamento actual. Foi notado em vários momentos que trabalhar, produzir cultura e criar é cada vez mais complicado, quando «não se sabe o que é que o dia de amanhã reserva». Neste momento são várias as estruturas que não sabem se conseguirão manter a actividade ou se terão, forçosamente, de «baixar o pano» de vez.
Jerónimo de Sousa, em breves declarações, considerou que os resultados do concurso bienal acabam por ser «a confirmação daquilo que o PCP tem afirmado sistematicamente na AR, no quadro da discussão dos orçamentos do Estado», ou seja, «as verbas para assegurar o direito constitucional de criação, por parte dos homens e mulheres das artes, da música, do bailado, é insuficiente». O Secretário-geral assinalou que «o problema de fundo com que somos confrontados é a política de financiamento do Governo para as artes, que consiste na máxima de “enquanto houver, há, e quando não houver mais, acabou-se”». «Há uma necessidade de deixar de percepcionar o apoio às artes como uma despesa», para o encarar «como um investimento», defendeu.
Jorge Pires, por seu turno, acrescentou que «o valor adequado, que se tem vindo a defender como justo para o apoio à cultura, seria um por cento do PIB e não um por cento do Orçamento do Estado». Salientou «a diferença entre “um por cento do PIB”, que são 2 mil milhões de euros, e “0,3 por cento”, que é o que temos hoje e correspondem a algo parecido com 250 milhões de euros».
O dirigente comunista notou que a actual proposta do PCP, de um por cento do OE para a Cultura, é um passo intermédio no caminho até àquele objectivo. E relembrou ainda a enchente de pessoas da cultura e do povo que afluíram à luta, no passado mês de Abril, por um por cento do Orçamento do Estado para a Cultura.
Carta-aberta
das estruturas culturais
A carta-aberta que meia centena de estruturas culturais entregou ao primeiro-ministro, na sexta-feira, dia 18, abordou as principais questões que afectam as pessoas e a Cultura. Se, por um lado, é verdade que os apoios públicos às artes existem para assegurar a existência de uma diversificada e regular oferta cultural por todo o território nacional (de acordo com os artigos 73.º e 78.º da Constituição), também é verdade que os resultados provisórios dos concursos da DGArtes têm «colocado em causa a manutenção ou o crescimento de um conjunto muito significativo de estruturas», ao mesmo tempo que têm posto em causa a oferta cultural nacional.
Na carta-aberta afirma-se também a necessidade da continuidade dos apoios públicos, pois assim se garante «que o trabalho de criação artística é desenvolvido de forma digna e séria, possibilitando o aprofundar da relação entre o que é produzido e os diversos públicos a quem se destina o resultado dessa produção».
No dia 11, data em que foram anunciados, com semanas de atraso, os resultados do concurso da DGArtes, o PCP comentou: «o orçamento para a Cultura é manifestamente insuficiente e põe em causa o cumprimento do direito à criação constitucionalmente consagrado». Tendo já questionado o Governo em relação ao atraso na publicação dos resultados, e prestado um contributo activo em todas as discussões do Orçamento do Estado nas questões do financiamento da Cultura, o PCP reafirmou de novo a sua preocupação em relação às «dezenas de candidaturas consideradas como elegíveis que ficarão de fora dos apoios públicos».
Estruturas locais em risco
A nova distribuição de verbas públicas destinadas ao apoio à Cultura pôs em causa várias estruturas por todo o País. No entanto, certas cidades e territórios foram especialmente afectados e, em alguns casos, as únicas estruturas profissionais existentes estão em risco de se verem forçadas a cessar a sua actividade.
É o caso do distrito de Évora , como já fez notar a DOREV do PCP, a 18 de Outubro. O que está em causa é o encerramento das poucas estruturas profissionais que asseguravam o, já escasso, acesso à fruição cultural por parte da população.
O PCP também já reuniu com mais de uma dezena de instituições culturais do Porto e do Norte, de forma a perceber melhor a gravidade dos danos do concurso da DGArtes.