Bauhaus, cem anos depois
A arte não está separada da luta de classes
Este ano comemora-se o centenário da Bauhaus. Bauhaus (Bau, construção, arquitectura; Haus, casa) resulta da fusão das duas escolas de artes que existiam em Weimar. Walter Gropius, o seu grande teórico, impõe a Bauhaus como mecanismo didáctico em que a arte e a técnica confluíam enquanto método racional.
Walter Gropius faz uma reforma didáctica fundamental no ensino artístico, em particular a arquitectura, incorrendo num equívoco por estar convicto de que a nova arquitectura internacional impulsionada pela Bauhaus resolveria as contradições entre nacionalismo e internacionalismo ao nivelar as técnicas e as formas e ser instrumento e imagem de uma nova ordem social. Acreditava que as transformações provocadas por essas novas experiências artísticas provocariam uma evolução histórica nas classes dirigentes que se adaptariam a novas tarefas sociais.
É uma atitude ingénua e arrogante, com toda a arrogância e ingenuidade dos intelectuais que se proclamam independentes, se distanciam da rudeza da luta de classes, pensando que a sua suposta superioridade intelectual, cultural e técnica são suficientes para transformar as hierarquias da velha sociedade. O grande equívoco dessa intelectualidade e de Gropius é pensar que a cultura e a arte redimirão o mundo, que o conflito histórico entre o capital e o trabalho são uma questão de técnica e organização. Na prática, Gropius trabalha para as classes dominantes integrado na cultura burguesa, exclui-se de qualquer consideração revolucionária apesar e contra os reais saltos qualitativos que originou nas artes e na arquitectura.
Esse equívoco na Bauhaus é interrompido pelo seu segundo director Hannes Meyer, um arquitecto suiço convidado inicialmente para dinamizar o departamento de arquitectura, o que fez com enorme êxito. Depois, na direcção da escola, obteve igualmente um enorme sucesso. Hannes Meyer, um convicto comunista, propugnava «as necessidades das pessoas primeiro, o luxo depois». Na arquitectura colocava como prioridade o seu carácter social: «Projectar e construir não é um processo estético. Projectar e construir é apenas uma organização: social, técnica, económica. Uma organização psíquica com relação com a envolvente física.»
Dava um salto qualitativo nos princípios da Bauhaus, o que desagradava a alguns mestres, sobretudo às autoridades da Alemanha, onde a deriva para a extrema-direita era visível e os oportunistas demo-liberais e sociais-democratas temiam os efeitos dos êxitos de Meyer na Bauhaus, onde as células comunistas cresciam. Vítima de intrigas de toda a espécie, Meyer demite-se e vai, com muitos dos seus alunos, para a União Soviética trabalhar no primeiro Plano Quinquenal.
A Bauhaus é entregue a Mies van der Rohe, um notável arquitecto, que acentua a sua distanciação à política e à sociedade, como se os produtos culturais fossem em absoluto independentes da produção e da reprodução social da vida. Não a salvaram do ódio dos nazis, que cumpriram os nunca escondidos desígnios dos conservadores alemães, acabando por a fechar. Hannes Meyer é praticamente esquecido nas histórias da Bauhaus apesar do notável trabalho que realizou. Não é um acaso, é o continuado processo da ideologia burguesa reescrever a história para apagar, minimizar, distorcer a intervenção das forças progressistas, o que faz a todos os níveis.