Dois milhões de utentes faltam às consultas porque não conseguem pagar os transportes
VIDA Não há melhor saúde enquanto persistirem obstáculos como o que resulta dos critérios para aceder ao transporte não urgente de doentes. Por isso o PCP quis mudar a lei, mas a isso se opuseram PS e PSD.
Só há melhor saúde com mais e melhor SNS
A alteração proposta pela bancada comunista aos critérios de atribuição de transporte não urgente de doentes esteve em debate sexta-feira passada, 1, tendo sido inviabilizada nesse mesmo dia com os votos negativos daqueles dois partidos. O CDS absteve-se e as restantes bancadas votaram favoravelmente. Diplomas do PEV e BE com igual propósito tiveram o mesmo desfecho.
A justificar este projecto de lei do PCP está a constatação de que não obstante os passos que foram dados nesta legislatura e que reconhece como positivos – redução das taxas moderadoras ou até a alteração nos critérios de atribuição de transporte não urgente (doentes com incapacidade superior a 60%), por exemplo -, a verdade é que tais avanços são insuficientes , subsistindo «problemas que necessitam de ser resolvidos».
A deputada comunista Carla Cruz comprovou-o no debate ao citar um estudo publicado em 2017 que mostra que dois milhões de utentes faltam às consultas porque não conseguem pagar os custos com os transportes.
Dado por si foi o exemplo de um doente que viva em Grândola e que precise de ir ao hospital a Santiago do Cacém: paga entre 60 a 70 euros para a ida e outro tanto para o regresso.
O que está em causa é, assim, o acesso à saúde devido às alterações legislativas da responsabilidade do PS, PSD e CDS – imposição do cumprimento cumulativo dos critérios de justificação clínica e da insuficiência económica - que dificultaram e, em muitos casos, inviabilizaram esse acesso de muitos doentes aos cuidados de que necessitam, consultas, tratamentos, exames complementares de saúde.
Amarras por quebrar
Este não é, pois, um regime justo como defenderam no debate PSD e CDS, enveredando pelo habitual discurso de que os diplomas visam «dar tudo a todos» (Ana Oliveira, PSD), ou que não tiveram em conta uma «boa gestão dos bens públicos» (Isabel Galriça Neto, CDS).
Já o PS, pela voz de João Gouveia, embora reconhecendo a existência de problemas e obstáculos, deu-se por satisfeito com as medidas incrementadas - «há uma diferenciação positiva das pessoas mais vulneráveis», disse –, defendendo que é esse caminho que importa continuar.
«Não chega, é preciso ir mais longe», contrapôs Carla Cruz, inconformada com o facto de não se ir «mais longe» porque o PS «não se desamarrara» daquelas que têm sido as opções da política de direita no que respeita à saúde, ao direito à saúde.
E porque há doentes que não têm capacidade financeira para suportar os custos – e são muitos - , o PCP não desiste do objectivo de garantir o transporte não urgente de doentes a todos os que dele necessitem, sempre que haja motivos clínicos ou económicos (eliminando o carácter cumulativo), seja para a realização de consultas, tratamentos, exames complementares de diagnóstico e terapêutica, cirurgia, internamento, seja para a residência do utente após alta de internamento ou da urgência.
Esse foi o compromisso reiterado por Carla Cruz.