255. Um número de barbárie
O Serviço de Estrangeiros e Fronteiras anunciou a semana passada o resgate de 255 pessoas da Europa de Leste vítimas de tráfico de seres humanos, trazidas para Portugal debaixo do engodo de haver trabalho garantido (e salário, presumiriam os 255), mantidas a trabalhar na apanha da azeitona no Alentejo, com esquemas diversos, designadamente subtraindo-lhes os documentos pessoais, mas sem lhes pagar o salário, depreendendo-se que os trabalhadores apenas teriam assegurado o mínimo para a alimentação e para as necessidades mais básicas.
Tais notícias, à semelhança de outras anteriores, deixam-me sempre com uma questão por resolver. Será que estas pessoas não trabalhavam para ninguém em Portugal? Porque sabe-se sempre que uns estrangeiros abusam de outros estrangeiros, escravizando-os (é esse o termo!), mas há sempre o esforço para que não se diga, para que não se saiba, que azeitonas apanhavam. As herdades não têm dono? Ou os agora detidos, para além de explorarem, até ao limite, estas 255 pessoas, também roubavam a azeitona?
De certeza que não. Estas herdades, esse olival imenso, plantado à boleia de investimentos públicos gigantescos, e que agora cresce à custa da mão-de-obra paga miseravelmente (por muito pouco que o proprietário pague, para o intermediário, pelos vistos, é tudo lucro), têm dono, são geridos por gente que se pavoneia pelas festas da sociedade, que ganha prémios pelo seu empreendedorismo, mas que agora se esconde na sombra, dizendo que nada tem a ver com isso, porque contratam um serviço e não conhecem as relações de trabalho existentes entre aqueles a quem adjudicaram esse serviço e os seus trabalhadores.
Mas será que não há um jornalista sequer que tenha curiosidade de saber quem são os que beneficiam, lá no topo da escala, desta barbaridade que leva o nome de capitalismo?