Comentário

EUA não mudam política para África

Carlos Lopes Pereira

Os Es­tados Unidos anun­ci­aram uma «nova» po­lí­tica para África. Coube ao con­se­lheiro de se­gu­rança na­ci­onal John Bolton, co­nhe­cido pelas suas po­si­ções re­ac­ci­o­ná­rias e agres­sivas, des­tapar as li­nhas da es­tra­tégia de Washington para o con­ti­nente afri­cano, apro­vada a 12 de De­zembro pelo pre­si­dente Do­nald Trump.

Fa­lando na He­ri­tage Foun­da­tion, uma or­ga­ni­zação de di­reita, Bolton de­finiu três pri­o­ri­dades: re­forçar os laços co­mer­ciais com os países afri­canos através de acordos que be­ne­fi­ciem ambas as partes («pe­dimos re­ci­pro­ci­dade, não sub­ser­vi­ência»); conter a «ameaça do ter­ro­rismo is­lâ­mico (de­sig­na­da­mente «o Es­tado Is­lâ­mico, a Al-Qaeda e suas fi­liais, que atacam ci­da­dãos e alvos ame­ri­canos»); as­se­gurar que a «ajuda» norte-ame­ri­cana seja efi­ci­ente e efec­tiva, de acordo com os in­te­resses dos EUA (pondo fim ao au­xílio «im­pro­du­tivo», in­cluindo a mis­sões de paz das Na­ções Unidas. E mais: «Os países que re­pe­ti­da­mente votam contra os EUA nos fó­runs in­ter­na­ci­o­nais ou pra­ticam ac­ções contra os in­te­resses dos EUA não devem re­ceber a ge­ne­rosa ajuda ame­ri­cana»).

Con­tra­riar e se pos­sível im­pedir as boas re­la­ções de co­o­pe­ração da China e Rússia com os países afri­canos é o prin­cipal alvo da es­tra­tégia es­tado-uni­dense. Se­gundo Bolton, aqueles «grandes con­cor­rentes [dos EUA] es­tendem ra­pi­da­mente a sua in­fluência fi­nan­ceira e po­lí­tica em África» e «ori­entam de­li­be­ra­da­mente e de uma ma­neira agres­siva os seus in­ves­ti­mentos na re­gião para terem uma van­tagem com­pe­ti­tiva em re­lação aos EUA».

No es­sen­cial, não há qual­quer mu­dança de es­tra­tégia. Mas o dis­curso de Bolton sus­cita apre­ensão pela ameaça de re­con­fi­gurar ou pôr fim ao fi­nan­ci­a­mento das oito mis­sões da ONU em África, que con­tri­buem para a pro­cura da paz e a re­so­lução de con­flitos e guerras no Sudão, Sudão do Sul, Mali, Re­pú­blica Centro-Afri­cana, Re­pú­blica De­mo­crá­tica do Congo, Saara Oci­dental e So­mália.

Muitos destes con­flitos e guerras, aliás, foram pro­vo­cados pela in­ge­rência dos EUA e seus ali­ados. A pre­texto da luta contra o ter­ro­rismo, o Pen­tá­gono mantém, sob o co­mando do Africom, di­versas bases mi­li­tares, do Dji­buti ao Níger, e cerca de 7.200 efec­tivos em «mis­sões de as­ses­soria» em di­versos países afri­canos.

Bolton pro­meteu agora que Washington vai re­duzir em 10 por cento o nú­mero de tropas es­ta­ci­o­nadas em África e instou os países do con­ti­nente a as­sumir a sua pró­pria de­fesa. O con­se­lheiro da Casa Branca abordou também a even­tual trans­fe­rência para solo afri­cano do co­mando mi­litar dos EUA para África (Africom), que desde a sua cri­ação, em 2007, tem o quartel-ge­neral na Ale­manha.

Uma res­posta ao anúncio da «nova po­lí­tica afri­cana» dos EUA veio do pre­si­dente da Co­missão da União Afri­cana, Moussa Faki Mahamat, fa­lando em Viena, du­rante o fórum Eu­ropa-África. Lem­brou ele que «os in­ves­ti­dores têm os seus in­te­resses, nós temos os nossos, sa­bemos me­lhor do que nin­guém com quem de­vemos fazer co­mércio e co­o­perar».

Com ve­lhas ou novas rou­pa­gens, no quadro da sua es­tra­tégia de do­mínio mun­dial, a po­lí­tica dos EUA em re­lação a África não muda e con­ti­nuará a ser feita de in­ge­rên­cias, in­ter­ven­ções mi­li­tares e ex­plo­ração das ri­quezas do con­ti­nente. Po­lí­tica que en­frenta uma cres­cente re­sis­tência e opo­sição dos povos afri­canos – que con­ti­nuam a lutar pela sua com­pleta eman­ci­pação.

 



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