PCP entrega Lei de Bases para efectivar o direito constitucional à habitação

DIREITOS A habitação continua a ser um problema no nosso País. Contribuir para lhe dar resposta, nas suas diferentes dimensões - esse é o propósito que subjaz à Lei de Bases da Habitação proposta pelo PCP.

A habitação é uma das necessidades básicas do ser humano

Recentemente entregue no Parlamento, o projecto de lei obedece nas suas linhas gerais à preocupação, por um lado, de que a legislação sobre arrendamento habitacional considere o «carácter singular» do «fim último do bem habitação» - estamos a falar da resposta a uma necessidade básica do ser humano -, e, por outro lado, que não ignore o papel chave e insubstituível do Estado na resolução das questões respeitantes a esta matéria.

Esse foi o entendimento dos constituintes de 1976 e, por isso mesmo, classificaram o «direito à habitação como um direito fundamental com a dignidade de direito constitucional», lembram os deputados comunistas na nota preambular do seu diploma.

Infelizmente, o que a realidade mostra é que persistem situações graves e que os problemas de habitação estão longe de estar resolvidos, após quase três décadas de forte investimento na construção de habitação dirigida à aquisição de casa própria e consequente endividamento das famílias junto da banca.

Ambivalência

Neste período assistiu-se à contrastante postura de um Estado que foi omisso na criação de condições para que se cumprisse o preceito constitucional, mas que já não regateou acção e apoios aos privados ligados ao imobiliário e à habitação.

Com o resultado que bem se conhece: «brutal sobreprodução de habitação para venda», substituída, agora, «por processos de revitalização urbana, centrados na reversão do arrendamento e conducentes à expulsão de milhares de famílias e pequenas empresas dos centros das cidades».

Processos, em larga medida, «conduzidos por investidores que, pelo seu poder financeiro e pela escala em que intervêm, comandam completamente o mercado de habitação, particularmente na perspectiva dos preços e na vertente crítica que é a do arrendamento», adverte o PCP, anotando não ser difícil inferir por isso que os objectivos de tais investidores «não são compatíveis com uma política de disponibilização de habitação para a larga maioria da população».

Políticas públicas

Daí que «só a intervenção do Estado, condicionando e promovendo a oferta de habitação, em termos de uso e valor, pode cumprir o preceito constitucional», conclui a bancada comunista, defendendo que essa é uma tarefa que tem de ser levada a cabo pela administração central - através de um Instituto Público Central, que «defina e assuma políticas públicas de âmbito, responsabilidade e direcção nacional» -, e não por qualquer transferência de responsabilidade para a administração local (ver caixa).

Políticas essas que exigem um Estado interveniente, que se assuma como promotor imobiliário e como proprietário, em todos os níveis da criação de solo urbano, da edificação e da reabilitação do edificado, e também do arrendamento.

Garantir esse papel de promoção pública de políticas de solos, de reabilitação urbana e de habitação destinada a largos sectores da população», tal é o desiderato da Lei de Bases da Habitação proposta pelo PCP.

Com a sua criação, trata-se, afinal, de dar passos no sentido do cabal cumprimento do «imperativo constitucional que coloca, como incumbência do Estado, garantir, a todos os cidadãos, uma habitação de dimensão adequada, em condições de higiene e conforto e que preserve a intimidade pessoal e a privacidade familiar».

Especulação e grandes interesses de mãos dadas

Mantém-se por concretizar a ruptura com as opções políticas de favorecimento dos interesses dos grupos económicos e financeiros que continuam a especular com esse bem fundamental que é a habitação, obtendo por essa via lucros incomensuráveis «à custa do endividamento forçado das famílias».

A avaliação crítica é do PCP e o mais recente exemplo que em sua opinião comprova a inexistência de vontade política por parte do Governo para romper com esse quadro de décadas é a própria proposta de Orçamento do Estado para 2019, actualmente em debate na especialidade.

«O Governo continua a deixar a intervenção nesta área nas mãos dos privados e do dito “mercado” que já demonstraram que não resolvem o problema do acesso à habitação, remetendo o Estado para um papel supletivo», declarou na passada semana a deputada comunista Paula Santos em plena discussão do Orçamento do Estado (OE) na generalidade.

É igualmente claro que o Governo mantém uma postura de «desresponsabilização» no que se refere à garantia do direito constitucional à habitação, entende o PCP, pelo que, face à função social que esta cumpre, adverte que «não pode ser tratada como mera mercadoria», sujeita ao livre arbítrio dos tais «mercados».

Mas é na análise concreta da proposta de OE que melhor se afere esta realidade e a justeza das críticas da bancada comunista. Desde logo pelo nível de investimento para a habitação nela previsto, que Paula Santos classificou de «francamente insuficiente», impedindo o «salto quantitativo e qualitativo que a situação exige».

Se o investimento de 40 milhões de euros no Programa 1.º Direito (Programa de Apoio ao Acesso à Habitação) para realojamento de famílias a viver em situações indignas é um «passo importante», a deputada do PCP não deixou de reprovar que o Governo tenha remetido a sua total concretização para as autarquias, quando essa é uma responsabilidade da administração central.

O papel chave do Estado

Ao Estado incumbe um papel decisivo para que seja cumprido o direito constitucional à habitação. Desde logo, no plano da política de solos, cabe-lhe – e este é um objectivo estratégico, na óptica do PCP - «contrariar a especulação imobiliária e dar utilização e gestão pública às mais-valias decorrentes quer de intervenções sobre transformação de uso dos solos quer de planos de densificação e/ ou alteração qualitativa de uso do edificado».

No que toca à reabilitação urbana, na sua proposta de Lei de Bases da Habitação os comunistas advogam que sejam rentabilizadas para esse efeito as políticas e os fundos públicos existentes, entendendo, já no plano do arrendamento, que o desafio está na mobilização do património habitacional público para programas de renda apoiada ou de renda condicionada, bem como no relançar destes programas.

Sobre o combate à especulação, a bancada comunista defende que «importa penalizar, indo até processos de declaração de posse administrativa ou mesmo de expropriação, em situações de catástrofe natural, aqueles que mantêm habitações injustificadamente devolutas».

Agulha no palheiro

Visão igualmente crítica tem a bancada comunista relativamente às opções do Executivo em matéria de arrendamento. «Ao invés de acompanhar o PCP na revogação da lei dos despejos, a solução adequada para travar os despejos e proteger adequadamente os inquilinos, o Governo opta por atribuir borlas fiscais aos proprietários que aumentarem a durabilidade do contrato», verberou Paula Santos. E depois de lembrar que a «política de arrendamento não é política fiscal», mostrou-se convicta de que não é pela atribuição de benefícios ficais a fundos e grupos financeiros, os grandes beneficiários de tais medidas, que «surgirão mais habitações para arrendamento».

Também não é na redução em 20% do valor da renda, tendo como referência o valor de mercado, em troca de benefícios fiscais aos proprietários, como propõe o programa «Arrendamento Acessível», que está a chave que garante o acesso das famílias à habitação

Paula Santos deu o exemplo de uma família que aufira o salário médio: só ficará abrangida por este programa se o valor da renda já com a redução for até 754 euros. Ora, observou, arrendar um T2 em Lisboa anda entre mil e 1500 euros. Donde, encontrar casa com condições de habitabilidade e ajustada à dimensão do agregado familiar é como «encontrar agulha no palheiro».

Concluiu, por isso, tendo presente a própria experiência de outras cidades europeias que adoptaram medidas idênticas, que essa acessibilidade é só para quem aufira rendimentos acima da média.

Não admira, pois, que continue a assistir-se à elitização dos centros urbanos e dos centros históricos, com expulsão das famílias de rendimentos mais baixos e sua substituição por famílias de rendimentos muito elevados.

Processo de gentrificação ao qual as propostas do Governo não põem cobro.




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