UE: visões distorcidas da parentalidade (I)
No final de 2014, a Comissão Europeia retirava a proposta de 2008, de Licença de Maternidade, que previa o alargamento do valor de 14 semanas, definido actualmente pela Directiva 92/85/CEE. Um falhanço que resultava da incapacidade de chegar a acordo nomeadamente no Conselho. Uma evidência de que na UE, a definição de políticas não se faz alinhar pela bitola dos valores sociais e laborais, do aumento dos direitos e condições de vida dos trabalhadores e das populações.
Há um ano, a Comissão apresentava uma proposta de Directiva relativa à chamada conciliação entre a vida profissional e a vida familiar dos progenitores e cuidadores. A proposta, contudo, nomeadamente para a realidade portuguesa, não traz entusiasmo nem se enforma numa visão progressista da paternidade e parentalidade sobre as quais tem particular incidência. Tão pouco visa os necessários apoios familiares que persigam, efectivamente, a inversão das tendências demográficas ou a eliminação das desigualdades entre homens e mulheres. Ao invés, ao condicionar os direitos da parentalidade às supostas necessidades das entidades patronais, a Comissão diz ao que vem.
Percorramos algumas das propostas: Uma licença de paternidade, de pelo menos 10 dias após o nascimento da criança, 15 dias aquém do que está estabelecido em Portugal. Uma licença parental que introduz distorções graves face ao que a nossa lei consagra. Propõe-se que se constitua como um direito individual, de pelo menos 4 meses para cada progenitor, não transferíveis, o que implica que o casal não pode decidir da forma de gozar a licença. Ao contrário do que se garante no nosso País, não é consecutiva ao nascimento da criança, propondo-se que possa ser gozada até aos 12 anos. Ou seja o acompanhamento máximo consecutivo à criança após o nascimento, são as 14 semanas de maternidade da supracitada Directiva (98 dias - em Portugal é de 120, 150 ou 180 dias). Regista-se que na elaboração da proposta, não se faça qualquer referência à recomendação da OMS de que a alimentação da criança seja exclusivamente o aleitamento materno nos primeiros seis meses de vida. Período que deveria condicionar à partida qualquer proposta de cuidados para a parentalidade após o nascimento. Acresce (em negativo) que se propõe que o pagamento da licença de paternidade e de paternidade seja feito ao nível do subsídio de doença (que conhece realidades também muito diversas na UE). Paradigmática a comparação da maternidade à doença. Estes são argumentos para, dizem, contribuir para uma maior igualdade nos cuidados à criança, entre homens e mulheres, e garantir um menor abandono do “mercado de trabalho” pelas mulheres – como se não fossem as discriminações laborais e as violações da lei os principais factores a impor esse afastamento. Não sendo de gozo obrigatório, nem paga a 100%, não se pode garantir que se promova uma partilha mais equilibrada dos cuidados parentais. Por outro lado não se avança na necessária protecção laboral. Refira-se que Portugal, onde a licença é transferível por decisão do casal e paga a 100% até aos 150 dias, é dos países com mais elevada participação dos homens naqueles cuidados.