Tempo de ofensiva
Uma vaga de calor abateu-se sobre o País, nada aliás de inesperado, originando um incêndio florestal de maiores dimensões e consequências bem mais trágicas do que é costume. Um bando de sujeitos de perfil ainda incerto aplicou-se a assaltar o depósito de Tancos e a apoderar-se de um diversificado conjunto de armas capaz de fazer a felicidade de qualquer grupo terrorista. Perante os dois acontecimentos a direita não perdeu tempo a pensar: apercebendo-se de que chegara uma dupla oportunidade de luxo, passou à ofensiva em várias frentes, das quais a mais óbvia é a frente mediática liderada pela frente televisiva. Quanto a esta nem há que estranhar, há anos e anos que a entrada nas redacções é condicionada e adequadamente vigiada, e não se está a falar das funções do porteiro. E as coisas têm vindo a desenrolar-se de tal modo que por vezes quase tem tido o travo de um acepipe, embora um pouco ácido, assistir a um telenoticiário da SIC ou da sua mana mais nova, a SIC Notícias, isto sem desfazermos no mérito e no eventual esforço de outros canais. Afinal, pode não ter sido apenas por amor ao jornalismo em geral e ao telejornalismo em especial que o dr. Balsemão decidiu um dia ter a sua própria operadora de televisão. Não é, necessariamente, que um dia tenha sido assaltado por um sonho berlusconiano de acesso ao poder por via televisiva, mas é factual que a TV não é negócio que gere grandes lucros financeiros, muito antes pelo contrário, pelo que em princípio talvez possa gerar outro tipo de dividendos. Além do prazer da sua posse e da sensação de poder que ela proporciona.
O enorme pecado
Voltemos, porém, ao que é importante: à ofensiva mediática contra o governo que está em curso a partir de dois acontecimentos graves: um incêndio pavoroso e um escandaloso roubo de armas. E, antes do mais, refiramos a culpa maior deste executivo que está a ser tão intensamente bombardeado: não é a da intensa plantação de eucaliptos que aliás tanto deve à drª. Cristas, nem a de algum provável desmazelo nas vedações em Tancos: o seu enorme pecado aos olhos do dr. Passos e sua gente é aceitar os votos dos deputados comunistas (e não só, bem se sabe) em decisivas votações parlamentares. De onde decorre um claro tempo de ofensiva. Porque o Siresp falhou dramaticamente, e nem se diz que foi contratado por um governo anterior custando os (nossos) olhos da cara, pormenores desses não interessam. Porque supostamente terão sido alguns membros do governo que andaram em Tancos a abrir brechas no arame farpado. Porque António Costa ainda não lançou a ministra Constança Urbano de Sousa às labaredas da culpabilização nem o ministro Azeredo Lopes ao fuzilamento político que seria a demissão. Entendamo-nos: relativamente a estes dois factos, o incêndio e o roubo de armas, há responsabilidades governamentais, como aliás qualquer cidadão entende e o Secretário-geral do PCP sublinhou, mas não exclusivamente deste Governo, também pelo menos do que imediatamente o precedeu. Por isso o dr. Passos, que consta que «está atónito», bem podia meter a mão na consciência. Que terá.