A banca e os paraísos fiscais
Desde da última crise financeira que a Comissão dos Assuntos Económicos e Financeiros do Parlamento Europeu tem estado num autêntico frenesim legislativo, produzindo diplomas atrás de diplomas, procurando assim iludir a opinião pública sobre a possibilidade de regular o sistema financeiro e evitar as crises.
O núcleo central da actual reforma legislativa concentra-se no chamado pacote CRD IV («Capital Requirement Directive IV”» que transcreve os princípios dos acordos de Basileia III na directiva 2013/36/UE e no Regulamento (UE) 575/2013. Curiosamente (ou talvez não...) esta directiva substitui duas directivas de 2006 (2006/48/CE e 2006/49/CE) que constituíam a base do sistema de supervisão bancária. Ou seja, duas directivas bem fresquinhas, aprovadas em 2006, mas que foram totalmente inoperantes perante a crise financeira de 2008 e cujos efeitos ainda hoje se fazem sentir!
O Pacote CRD IV procura naturalmente ir mais longe, como quem diz, «agora é que é!». Impõe regras ao nível dos salários dos administradores bem como do seu nível de formação. Retoma depois as habituais patranhas sobre requisitos de capital, gestão de risco e rácios de liquidez. Tem contudo um ponto positivo, que obriga os bancos a publicar nos seus relatórios um conjunto de informações desagregadas por países onde operam (volume de vendas, número de trabalhadores, lucros antes de impostos, impostos pagos, subsídios públicos recebidos, etc.). Esta obrigação foi introduzida no calor dos vários escândalos fiscais através dos quais ficou claro que os bancos e as multinacionais drenavam lucros de forma puramente artificial para paraísos fiscais onde eram tributados a taxas irrisórias ou mesmo nulas.
Uma vez que a directiva entrou em vigor em Janeiro de 2015, só agora é possível compilar os primeiros relatórios país por país relativos ao exercício de 2015. Um estudo recente sobre os 20 maiores bancos europeus revela preto no branco o que já sabíamos: a banca representa um dos principais beneficiários dos paraísos fiscais, seja em proveito próprio, seja no aconselhamento dos seus clientes.(1) Neste relatório, podemos ver que 26 por cento dos lucros dos maiores 20 bancos europeus foram declarados em paraísos fiscais, designadamente em países como o Luxemburgo, a Bélgica e a Irlanda. Os lucros declarados por estes 20 bancos no Luxemburgo (4,9 mil milhões de euros) excedem a soma dos lucros declarados no Reino Unido, na Alemanha e na Suécia. Do lucro total destes bancos, cerca de 400 milhões de euros não pagaram qualquer imposto (ver quadro). Quase 700 milhões de lucros foram declarados em filiais onde não existe nenhum trabalhador, ou seja, em sede fictícias destinadas apenas a declarar proveitos.
Este relatório poderá não acrescentar muito ao que já sabíamos. Tem no entanto o mérito de dar visibilidade a esta realidade, dando mais força àqueles que, como o PCP, se batem neste momento para que esta obrigação de publicar resultados país por país seja alargada às restantes empresas multinacionais. Aumenta assim o escrutínio popular sobre as multinacionais e cresce a compreensão sobre a necessidade de uma resposta de classe para combater estes fenómenos que só pode passar pelo controlo público sobre o sistema financeiro.
País |
Banco |
Lucro (Milhões de euros) |
Impostos (Milhões de euros) |
Áustria |
Santander |
43 |
0 |
Bermudas |
HSBC |
79 |
0 |
Ilhas Caimão |
BNP Paribas |
134 |
0 |
Ilhas Caimão |
Crédit Agricole |
38 |
0 |
Hong Kong |
Barclays |
83 |
0 |
Mónaco |
BNP |
23 |
0 |
Singapura |
Société Générale |
57 |
0 |
Ilhas Jersey e Man |
BNP Paribas |
22 |
0 |
__________
(1) https://www.oxfam.org/sites/www.oxfam.org/files/bp-opening-vaults-banks-tax-havens-270317-en.pdf