Novo rumo para Lisboa
Desde a viragem do século iniciou-se um ciclo desastroso em Lisboa, de alternância entre PSD/CDS e PS. A CDU é a «força capaz de marcar a diferença», assegurou, dia 17, João Ferreira, candidato à presidência da autarquia.
«O solo da cidade tem sido de negócios»
A sala Veneza do Hotel Roma foi o local escolhido para apresentar João Ferreira como o cabeça de lista da CDU à Câmara de Lisboa. A sessão, onde estiveram largas centenas de pessoas, contou com a presença de Jerónimo de Sousa, Secretário-geral do PCP, mas também de Joana Manuel, apoiante da CDU, Inês Zuber e Gonçalo Tomé, do Comité Central (CC) do PCP, António Azevedo, da Juventude CDU, Levy Baptista, da Associação de Intervenção Democrática, Cláudia Madeira, da Comissão Executiva do Partido Ecologista «Os Verdes», e Armindo Miranda, da Comissão Política do CC do PCP. Nomes apresentados por Deolinda Machado, da Comissão Coordenadora da CDU e da Comissão Executiva da CGTP-IN.
Antes teve lugar um apontamento cultural intitulado «Lisboa é a poesia da luta», com a voz de Manuel Diogo, acompanhado à guitarra por David Sacaria. Este foi um momento verdadeiramente enriquecedor, de grande beleza, com o declamar das Crónica de D. João I de Fernão Lopes e dos Lusíadas (Canto IX), de Luís de Camões, mas também: «À Lisboa das Naus Cheias de Glória» (António Nobre), «Pelo Tejo vai-se para o mundo» (Alberto Caeiro), «Tejo que levas as águas» (Manuel da Fonseca), «Lisboa menina e moça» (Ary dos Santos), «Ruas de Lisboa» (Joaquim Pessoa) e «Lisboa» (Eugénio de Andrade).
Seguiu-se a actuação de Maria Anadon, que antes de cantar «De lés a lés» anunciou que nas próximas eleições iria votar na CDU. «Retrato do povo de Lisboa» (Ary dos Santos) e «Uma cidade» (Albano Martins) encerrou o apontamento.
Ultrapassar dificuldades
Na sua intervenção, João Ferreira começou por afirmar que a Coligação PCP-PEV – há vários anos a primeira força no plano autárquico da Área Metropolitana de Lisboa – está determinada «a enfrentar e a vencer todas as dificuldades» e manifestou «confiança» para a próxima batalha eleitoral.
Relativamente aos últimos 16 anos, o candidato lamentou o facto de «o desenvolvimento da cidade» ter sido «deixado nas mãos do promotor imobiliário, à mercê do especulador e de interesses privados». «A cidade foi transformada em produto de consumo», referiu, apontando que a cidade «empobreceu» porque «perdeu gente, que foi empurrada para fora de Lisboa».
A Lei das Rendas do governo PSD/CDS contribuiu para a actual situação. João Ferreira responsabilizou, por isso, Assunção Cristas, candidata à autarquia e, enquanto ministra, a mentora da lei dos despejos. «Em nenhuma cidade deste País ficou tão patente, como em Lisboa, a natureza desumana desta lei», criticou, sublinhando que também a Câmara de Lisboa, gerida nos últimos 10 anos pelo PS, foi «agente activo destes processos».
As críticas do candidato da CDU estenderam-se à situação dos bairros sociais, que estão «degradados, sem equipamentos, sem limpeza, sem transportes», à entrega do património da cidade, ao desmembramento e esvaziamento de serviços municipais e à degradação dos transportes públicos. Sobre a municipalização da Carris, João Ferreira denunciou a «solução perversa» da autarquia, que prevê financiar a empresa «a partir das receitas de estacionamento», ou seja, «quantos mais carros entrarem em Lisboa, mais receitas».
Propostas da CDU
Alicerces de um projecto
de transformação da cidade
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Prevalência do interesse público sobre interesses privados;
- Um planeamento urbanístico democrático e transparente;
- Uma firme orientação no sentido de atenuar e eliminar as exclusões e desigualdades existentes na fruição dos benefícios da vida na cidade;
- Uma política de reabilitação urbana que sobreponha o valor de uso ao valor de troca;
- Uma política de habitação que ajude a atrair população residente e estancar e a inverter a saída de gente da cidade;# Recuperação da vocação produtiva da cidade, devolvendo-lhe a vida para além do turismo; estimulando a diversificação da base económica da cidade;
- Aposta na qualidade e na acessibilidade do transporte público, cobrindo toda a extensão da cidade com uma visão integrada dos diferentes modos de transporte à escala metropolitana; a aposta na intermodalidade, na expansão das redes de cobertura e interfaces, promovendo uma bilhética única, social e integrada com os diversos modos de transporte e seu parqueamento. A reversão da degradação da qualidade do serviço prestado pela Carris. A expansão do Metro à zona ocidental da cidade, em alternativa à densificação da rede na zona central – uma opção mais cara e menos útil;
- Promoção de serviços públicos de qualidade e diversificados, encarados como elementos centrais para o bem-estar e a qualidade de vida na cidade;
- Uma política cultural que se estenda a toda a cidade, sem exclusões, e que não se resuma a um calendário de eventos;
- Uma política desportiva que estimule e democratize a prática do desporto na cidade, dando força ao desporto popular e ao movimento associativo desportivo;
- Uma opção decidida pela defesa, motivação, valorização e estímulo dos trabalhadores do município; a defesa do emprego público, a garantia de direitos e o combate à precariedade dos vínculos.
Força indispensável e necessária
Jerónimo de Sousa dirigiu uma «forte saudação» a todos os presentes, aos membros do PCP, do Partido Ecologista «Os Verdes» e aos independentes que estão com o projecto da CDU, para depois afirmar que João Ferreira – a quem desejou um «bom trabalho» e «êxito» – é o candidato que «dá rosto a um projecto com provas dadas na cidade e no País».
«Inserida no trabalho colectivo que nos caracteriza», a intervenção de João Ferreira, um dos dois vereadores comunistas na Câmara de Lisboa, «questionou e denunciou a política do actual executivo PS» na autarquia, «propôs soluções» e esteve em «contacto estreito com as populações e os trabalhadores, com o movimento associativo, com as forças vivas da cidade», valorizou o Secretário-geral do PCP.
Destacada foi também a sua «competente e qualificada intervenção» enquanto deputado no Parlamento Europeu, ao rejeitar as «imposições que prejudicam o País» e defendendo «a utilização de todos os meios e possibilidades que possam vir da União Europeia, a favor do bem-estar dos portugueses, mas também de Lisboa».
Luta pela alternativa
Jerónimo de Sousa manifestou ainda convicção de que, após o próximo «combate eleitoral», será «possível dar um salto qualificativo na luta pela alternativa no plano local e no plano nacional».
«Temos um passado de realização nas autarquias e um projecto alternativo de esquerda no Poder Local no País que não deixam dúvidas quanto ao sentido e rumo da nossa intervenção na defesa do interesse público e das populações», destacou, afirmando, com toda a convicção, que «a CDU vale a pena» pelo «trabalho positivo e eficaz que desenvolve, pelas suas propostas, pela seriedade, isenção e sentido de responsabilidade que os eleitos da CDU colocam no exercício das suas funções, pela voz que dá nas autarquias aos problemas, aspirações e reclamações das populações».
PCP contra asfixia das autarquias
Na apresentação pública do candidato da CDU à presidência da Câmara de Lisboa, Jerónimo de Sousa, salientando que o PCP é a «força» que continua «na linha da frente» pela «valorização e efectivo reforço» do Poder Local Democrático, anunciou que o Partido vai apresentar, na Assembleia da República (ver págs. 22 e 23), «um conjunto de iniciativas legislativas, que dão corpo a uma política na organização do Estado baseada numa real descentralização».
As medidas do PCP, assegurou, distinguem-se claramente das «propostas avançadas pelo Governo, apresentadas em nome de uma descentralização anunciada vezes sem conta, mas tão pouco consagrada e que apenas tem servido de pretexto para adiar e inviabilizar a efectiva descentralização que se impunha realizar no País».
Assim é também com as actuais propostas apresentadas pelo Executivo PS, nomeadamente a Lei-quadro de transferência de competências para as autarquias. «Uma proposta de lei que não dá garantias, não preenche, não responde ao conjunto de condições indispensáveis», acusou o Secretário-geral do PCP, explicando que «qualquer processo de transferência de competências exige a observação da situação e condições de intervenção das autarquias locais» e que «a realização de atribuições e competências é inseparável das condições financeiras, materiais, humanas e organizacionais à disposição das autarquias». «Descentralização e transferência de competências não são sinónimo. A descentralização envolve não apenas o poder de executar e pagar, mas também, e indispensavelmente, o poder de decidir. Competências sem meios são novos encargos», referiu.
Regiões administrativas
Neste sentido, Jerónimo de Sousa reclamou «uma política baseada na descentralização», inseparável da «instituição das regiões administrativas». A sua concretização, prosseguiu, é «um imperativo constitucional» e «condição para três objectivos essenciais de uma política descentralizadora: dar coerência a uma clara delimitação de atribuições e competências entre os vários níveis da administração (central, regional e local); criar condições para uma política de desenvolvimento regional com a activa participação das autarquias e dos agentes económicos e sociais; garantir a defesa da autonomia do Poder Local».
«Este é mais um combate que não podemos deixar de travar nos próximos tempos e uma razão acrescida para dar mais força à CDU», concluiu.