Pelo fim da caducidade das contratações colectivas

Exigência de dignidade<br>e igualdade

O PCP defende a eliminação da caducidade das contratações colectivas e a reposição do princípio do tratamento mais favorável, entendendo que só assim é possível dinamizar a contratação colectiva, dignificar os trabalhadores e evoluir no sentido do desenvolvimento e progresso do País.

A contratação colectiva tem sido alvo de um feroz ataque das associações patronais

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«O direito de negociação e contratação colectiva é reconhecido aos trabalhadores na Constituição e integra o elenco de direitos fundamentais consagrados em convenções internacionais», afirmou no Parlamento a deputada comunista Rita Rato, que destacou o «papel estruturante» que a contratação colectiva tem na regulação do trabalho» e a sua importância enquanto «instrumento de consagração de direitos conquistados».

A parlamentar do PCP falava na passada sexta-feira, 10, em plenário, no arranque de um debate de urgência requerido pela sua bancada tendo por mote precisamente a contratação colectiva.

Em causa, desde que em 2003 foi introduzido no Código do Trabalho por um governo PSD/CDS (que sucessivas revisões agravaram), está a admissão da caducidade das convenções, assim como a eliminação do princípio do tratamento mais favorável ao trabalhador – sempre em nome de uma falsa dinamização –, alterações que se consubstanciaram num «inaceitável e insustentável bloqueio» à contratação colectiva».

Redução drástica

Um ataque sistemático desde então tem vindo, com efeito, a ser desencadeado contra a contratação colectiva, visando sempre a individualização e precarização das relações laborais, proveniente de quem «nunca se conformou com a perda do poder de ditar as regras nas relações de trabalho» e cedo iniciou o bloqueio à contratação colectiva e a chantagem sobre os sindicatos com a recusa em negociar aumentos salariais sem a redução de direitos.

Os números a este respeito têm tanto de elucidativo como de dramático: se em 2003 a renovação da contratação colectiva abrangia um milhão e 500 mil trabalhadores, em 2013 o seu número era de apenas 241 mil, acrescendo a este quadro, como salientou Rita Rato, a redução significativa dos prazos da caducidade e sobrevigência dos contratos colectivos de trabalho.

O ministro do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, Vieira da Silva, não deixou de reconhecer isso mesmo referindo que se atingiu o ponto mais baixo do número de trabalhadores abrangidos e que essa queda significa que a «contratação colectiva perde como instrumento de regulação do mercado de trabalho».

Parece é não querer tirar as devidas consequências de tal constatação. É que embora afirme que nos seus objectivos está a «melhoria da contratação colectiva» e o «combate à precariedade», a verdade é que diz não ver qualquer contradição entre esse desiderato e a circunstância, segundo ele próprio diz, de «não ser a favor da regressão do princípio da caducidade».

«O princípio da caducidade foi para evitar a cristalização das relações laborais, não é arma para destruir ou impedir a negociação colectiva», alegou. Tese que a vida se encarregou de mostrar não ser verdadeira, com Rita Rato a lembrar no final que a caducidade apenas «serviu ao patronato para impor a retirada de direitos e salários de miséria».

Equação impossível

Antes, já António Filipe tratara de sublinhar – indo ao ponto essencial desta discussão – que «não faz nenhum sentido, do ponto de vista da lógica da contratação colectiva e dos princípios que a presidem, a regra da caducidade que permite ao patronato boicotar a contratação colectiva».

Por outras palavras, «se se quer dinamizar a contratação colectiva isso é profundamente contraditório com a manutenção da regra da caducidade», observou o deputado do PCP, numa visão oposta à do ministro.

Rita Rato voltou à carga e considerou ser essa – a defesa da contratação colectiva, mantendo a caducidade – uma «equação que não é possível».

Não por acaso, aliás, a bancada do PSD fez a defesa da caducidade, dizendo ser este um importante instrumento, posicionando-se em sentido idêntico o CDS-PP, para quem a «esquerda pretende reverter tudo e todos».

Do debate importa entretanto reter, como ideia central, que tal como a contratação colectiva não foi oferta de nenhum governo, mas o resultado da luta reivindicativa a partir dos locais de trabalho, também será a luta que determinará em última instância o desfecho nesta matéria.

Pela sua parte – foi a garantia deixada por Rita Rato –, ao PCP não «faltará empenho e acção» nessa luta ao lado dos trabalhadores.

É que – e foi isto que a bancada comunista pôs no centro do debate – do que se trata é de repor «condições de dignidade dos trabalhadores no direito do trabalho português». Mais, anotou António Filipe, é a «vida das pessoas que está em causa, a reposição de condições de igualdade na negociação colectiva que foram profundamente desequilibradas com a introdução da caducidade das contratações colectivas».

Manobras inaceitáveis

António Filipe citou uma velha máxima do direito – entre o forte e o fraco é a liberdade que oprime e é a lei que liberta – para estabelecer uma analogia com a contratação colectiva, que considerou uma «aquisição histórica dos trabalhadores, uma conquista civilizacional do Estado de direito».

Rita Rato, na sua intervenção inicial, lembrara já que a «contratação colectiva fixa salários, consagra direitos em condições francamente favoráveis aos trabalhadores, muito acima do que está previsto no Código do Trabalho», sendo disso testemunho matérias como, entre outras, o «pagamento do trabalho suplementar e nocturno, pausas, descanso suplementar, subsídio de turno, majoração de dias de férias, feriados e dias de descanso».

O que explica, no fim de contas, por que razão a contratação colectiva tem sido tão ferozmente alvo do ataque das associações patronais e de sucessivos governos.

Isso mesmo está a assistir-se, aliás, nos dias de hoje, não faltando exemplos de chantagem, ameaças e exigências das confederações patronais. António Filipe falou mesmo da existência de «todo o tipo de manobras» por parte do patronato para boicotar a contratação colectiva.

É disso exemplo, denunciou, a alteração aos estatutos realizada pela Associação Portuguesa de Seguros com o intuito de não ser considerada interlocutor válido em matéria de contratação colectiva, deixando assim os trabalhadores sem ninguém do outro lado da mesa com quem negociar as suas condições de trabalho.

Referido por Rita Rato foi, também, o caso da Associação de Têxteis de Portugal que ameaça, por um lado, retirar o subsídio de amas no valor de 50 euros às trabalhadoras têxteis, cujo salário ronda o mínimo nacional, e, por outro lado, não quer reconhecer feriados.

Referenciada foi, ainda, a situação relativa ao contrato colectivo das Cantinas, Refeitórios, Áreas de Serviço e Bares Concessionados, cujas tabelas salariais remontam a 2003, com a respectiva associação patronal (AHRESP) a recusar a negociação de aumentos salariais.

«É preciso acabar com este tipo de manobras, é preciso dinamizar e dignificar a contratação colectiva para que ela seja uma realidade e não apenas um sofisma dos discursos», exigiu António Filipe, realçando ser essa a grande questão que está no centro do debate: «dignificar os trabalhadores portugueses, repondo o princípio basilar do direito do trabalho que em má hora foi eliminado da nossa legislação pelo governo PSD/CDS-PP».




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