Toda a gente tem uma história para contar

Vasco Cardoso

A cobertura mediática à decisão do Governo de liberalização do transporte individual de passageiros constituiu uma grande operação de achincalhamento do sector do táxi visando favorecer junto da população a aceitação da subserviência do País aos interesses das multinacionais, particularmente da UBER.

Instrumentalizando características próprias de um sector marcado pela pequena propriedade, o papel da generalidade dos órgãos de comunicação social foi o de tentar alimentar o mais possível o preconceito. Como li e ouvi de muitos jornalistas e comentadores, quando falamos de táxis «toda a gente tem uma história para contar». Daqui para a frente, foi só construir a narrativa: de um lado os que resistem à mudança, carros velhos e poluentes, do outro, as novas tecnologias e o conforto; de um lado os arruaceiros, os vigaristas, os que dão voltas à cidade para enganar o passageiro, do outro, a educação, o civismo e o preço mais baixo na factura. Querem ou não a UBER? Pergunta o Governo, perguntam os comentadores, pergunta a sempre isenta Fátima C. Ferreira no seu Prós & …

Durante este turbilhão mediático a UBER nem precisou de aparecer. Para quê? Se tinha o Governo, os jornalistas e comentadores a falar por ela, a defenderem o seu serviço, as suas vantagens, o seu rigor perante o fisco (na Holanda e noutros paraísos fiscais, claro!). Com uma lei feita à sua medida, os seus accionistas – Goldman Sachs, Amazon, Google, etc. – só precisaram de deixar correr o marfim, com a crucificação do táxi e as portas prestes a escancararem-se aos seus interesses. A sua força é tal que está há mais de dois anos a operar ilegalmente em Portugal sem que nada lhe aconteça.

De facto, esta não é uma luta entre novas e velhas tecnologias, ou entre um mercado regulado e a livre concorrência. Aquilo que está em causa é a liquidação de todo um sector – que poderia evoluir e ser melhorado – face à concorrência desleal de quem não tem contingente, não tem preços regulados, não tem obrigações fiscais ou responsabilidades perante os seus trabalhadores. Todos têm uma história para contar e Portugal tem muitas de submissão aos interesses mais poderosos e que são de má memória e triste desfecho...




Mais artigos de: Opinião

As catástrofes e a luta de classes

As Caraíbas e os EUA foram afectados pelo furacão Matthew entre os dias 4 e 9 de Outubro. O maior ciclone tropical dos últimos nove anos chegou a atingir o grau 5 na escala Saphir-Simpson, tendo chegado ao Haiti e a Cuba, e passado perto da Jamaica, das Bahamas e da República Dominicana, com...

O taxímetro da coerência

Na luta contra a luta do sector do táxi valeu tudo. Alguma comunicação social até descobriu, nalguns casos pela primeira vez, que havia trabalhadores explorados e que eram explorados pelos patrões... «do táxi». Convergindo, alguns esquerdistas do burgo, dos que se...

A luta está aí

Em nota interna, o presidente executivo do Deutsche Bank, Jonh Cryan, atribuiu a crise profunda em que mergulhou a instituição bancária que dirige às «forças de mercado» que estarão a «tentar prejudicar» a confiança no sector bancário,...

Defesa da soberania<br>e ruptura necessária

No discurso proferido sobre o estado da União Europeia, Jean-Claude Juncker propôs a criação de uma força de defesa comum e de um quartel-general europeu, acrescentando que tal passo deve ser observado como «um complemento à NATO» (sic) e, claro está, reforçados os orçamentos.

Ameaças

O Chefe de Estado Maior do Exército dos EUA, Gen. Milley, ameaçou num discurso oficial: «quero ser muito claro com aqueles que se tentam opor aos Estados Unidos […] vamos travar-vos e vamos esmagar-vos de forma mais dura do que alguma vez vos tenham esmagado» (no YouTube, e citado em...