Guerra na Síria

Mais gasolina para a fogueira

Turquia e Arábia Saudita pretendem enviar tropas para a Síria, iniciativa que os aliados da República Árabe advertem que pode levar a uma escalada da guerra para lá das fronteiras do Médio Oriente.

A Turquia e a Arábia Saudita estão a forçar o envio de tropas para a Síria

Há muito que o conflito na Síria foi internacionalizado. A narrativa que durante anos (e já lá vão quase cinco de guerra) indicou tratar-se de um combate entre «rebeldes» da «oposição» e «regime», afirmando que este último esmagava a expressão armada de um levantamento popular, foi perdendo força à medida que os EUA e os seus vassalos foram sendo denunciados como financiadores dos mercenários.

O argumento do uso por Damasco de armas de destruição massiva, que há cerca de dois anos e meio chegou a ser usado para justificar uma intervenção militar directa dos norte-americanos e respectivos aliados, também já não colhe. Nos próximos dias, a Organização para a Proibição de Armas Químicas (OPAQ) deverá, aliás, confirmar que o ataque em Gouta, em Agosto de 2013, não foi perpetrado por Damasco. Autoridades políticas e militares dos EUA antecipam-se e atribuem agora o uso de armas químicas na Síria e no Iraque ao denominado Estado Islâmico (EI).

O EI avançou imparável no terreno justamente depois das narrativas do «levantamento popular» e das «armas de destruição massiva» se mostrarem ineficazes na «venda» de uma «guerra humanitária». A entrada em cena da Federação Russa, que a pedido do governo sírio iniciou no último trimestre do ano passado intensos bombardeamentos sobre os terroristas, impediu a vitória jihadista. O governo sírio e o presidente Bashar al-Assad garantem que a Síria está à beira de derrotar os grupos armados. O assalto a Alepo e a investida sobre Raqa, erigida capital do califado de terror do EI, mostram que a guerra pode terminar em poucos meses.

É neste contexto que assenta o actual cenário de tentativa de escalada do conflito, não isenta de contradições passageiras.

Incógnitas

A Turquia e a Arábia Saudita estão a forçar o envio de tropas para a Síria. Ambos os países realizam já exercícios militares conjuntos e reúnem tropas e armamento. Os sauditas, após a experiência de combate acumulada no Iémen, anunciam a capacidade de reunir dezenas de estados da região na almejada invasão da Síria. O Irão adverte que não ficará a assistir.

O envolvimento directo daqueles que têm sido os pontas-de-lança do imperialismo no comprovado apoio aos grupos armados, é justificado pelos turcos com a necessidade de impedir que os curdos consolidem posições no território. Os milicianos curdos têm sido determinantes na expulsão dos bandos criminosos da Síria. A Turquia, preocupada com um e outro facto, bombardeia incessantemente as zonas de fronteira com a Síria, operação que visa golpear as forças curdas e impedi-las de barrarem o trânsito de armas e mercenários, acusam a diplomacia e a Defesa da Rússia.

Washington, Moscovo e Berlim criticam a aventura belicista turco-saudita. Os germânicos pretendem que Ancara se foque no estancamento do dramático fluxo de refugiados e sabem que mais guerra significa mais sírios desesperados a tentarem chegar à Europa. Angela Merkel, entretanto, veio defender a imposição de uma zona de exclusão aérea na Síria.

O Kremlin, que no campo militar e diplomático soma vitórias, alerta que a intervenção da Turquia e da Arábia Saudita pode provocar uma escalada do conflito além do Médio Oriente. Os norte-americanos, que apoiam as milícias curdas convergindo nesse aspecto com a Rússia e a Síria, parecem dispostos a aceitar que aquele povo ganhe protagonismo momentâneo à custa do seu aliado na NATO, a Turquia.

Com a evidente debacle do EI na Síria, os EUA necessitam de interromper o ciclo triunfante sírio-russo. Moscovo, aliás, alude a este facto frisando que, paralelamente ao acordo sobre um cessar-fogo, saído da Cimeira sobre Segurança realizada em Munique, as potências ocidentais apelam em público e em privado ao fim dos ataques aéreos anti-terroristas russos, bem como para o estabelecimento de uma «faixa humanitária» entre a Síria e a Turquia. Os recentes ataques a hospitais e escolas no Norte da Síria são atribuídos à aviação russa, embora as Nações Unidas e a Médicos Sem Fronteiras, que geria uma das unidades, recusem confirmar tal versão.

O desacordo conjuntural entre Washington e a Turquia pode indicar que na Casa Branca a prioridade é para salvar o fundamental: alguma implantação do que considera ser a «oposição moderada» síria e a comunicação com a Turquia, ainda que cedendo tacticamente.

 



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