Batatulinas

Jorge Cordeiro

Ao seu melhor estilo Vasco Pulido Valente deu à luz, no jornal que o abriga, mais uma daquelas peças impregnadas de anticomunismo que o deleitam. Sob o título «As desgraças do PCP», Valente sublima as conhecidas frustrações de quantos, como ele, tendo declarado mil vezes a morte anunciada do PCP não vêem confirmadas na vida tão almejada ambição. Olhando para o texto da passada sexta-feira no Público poder-se-ia ser levado a pensar que Valente perdeu a tramontana. Difícil se torna perceber, no meio da densidade de disparates e insultos, o sentido geral da catilinária. Com algum esforço lá se percebe na escassíssima nesga de sobriedade intelectual e política do texto o irreprimível desejo de decretar o declínio irreversível do PCP, a ambição de o ver «a esfumar-se sossegadinho no seu canto» e a esperança que acalenta de «a agonia do comunismo levar à ruína do regime». Da narrativa nada há de sério a reter: a conhecida reescrita da história, o papagueamento de uns quantos dislates sobre o papel e a luta do PCP, o inconformismo com o 25 de Abril e as saudades do fascismo, o recorrente ódio ao regime democrático e à Constituição da República. Aditadas de uns insultos aos funcionários do PCP que segundo Valente seriam vistos como «batatulinas», designação que o autor, lamentando não conhecer a origem do termo, apresenta como significando «fanático burro».

Com toda a assertividade se pode usar, no presente caso, que «vozes de burro não chegam ao céu». Desde logo, porque não é possível olhar para o que Valente escreve sem aquele grau de condescendência directamente proporcional ao caminho percorrido pelos ponteiros do relógio ao longo de cada uma das jornadas que vão fazendo o calendário progredir. Olhando para a prosa, e reconhecendo nela o adiantado da jornada, sempre se dirá ao autor que bem pode conformar-se com a não realização dos seus sonhos, que o PCP aqui continuará não só para lhe desmentir as profecias como também, e sobretudo, para prosseguir aquela intervenção política que tanto rancor provoca nos que vêem os seus interesses de classe dominante comprometidos. Por muito que isso incomode os batatulinas valentes que por aí povoam o País.



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