Perguntas por fazer
Quase tudo o que foi dito e escrito nas últimas semanas sobre o caso BANIF mete algures lá pelo meio duas palavras: União Europeia (UE). O extenso rol de notícias deixou claro, de alguma forma até mesmo para um leitor ou telespectador acidental, que a UE alguma coisa teve a ver com o desenrolar e o desfecho do processo.
A notícia de que a UE «não permitiu» (sic) uma solução para o BANIF que passasse pela sua integração na esfera pública, por exemplo, fez capa de jornais.
Perante isto (mesmo sabendo-se o que é e de quem é a comunicação social dominante-dominada), não pode deixar de surpreender a falta de perguntas, a falta de escrutínio jornalístico sobre as informações que se veiculam, perguntitas simples que sejam. E, já se sabe, sem perguntas escasseiam também as respostas.
Ocorreu a alguém perguntar por que carga de água «não permite» a UE que o Estado português tome conta de um banco no qual enterrou milhares de milhões de euros dos contribuintes, mais do que o valor do próprio banco? Alguém viu algum comentador ou analista encartado perguntar porque não vale desta vez o princípio «quem paga manda» que tanto gostam de invocar noutras ocasiões? E, sobretudo, detalhou que «regras europeias» são essas que, a fazer fé nas notícias, obrigam o Estado a pagar os prejuízos dos bancos privados e a transferir os seus activos e carteira de negócios para um grupo financeiro privado estrangeiro?
Já agora, alguém perguntou quando e quem aprovou essas ditas regras? Em nome de quem? Com que poderes para o fazer? E porque é que só nestas alturas ouvimos falar nas tais «regras», sem ainda assim nos dizerem onde estão escritas?
Um leitor ou telespectador mais avisado poderia talvez acrescentar ao rol das perguntas que ficam por fazer outras, com raízes que mergulham no que há mais de um ano nos andaram a vender os mesmos jornais e televisões que agora difundem as notícias sobre o caso BANIF, aquando da conclusão da chamada União Bancária. Não se disse nessa altura (sem direito a contraditório que se visse, nos tais jornais e televisões) que a legislação então aprovada pela União Europeia significava o fim dos resgates públicos à banca privada? Então e agora o BANIF? E, antes deste (mas já depois da «União Bancária»), o BES?
O significado
da «União Bancária»
Uma simples busca pela internet servirá para encontrar abundantes referências ao que na primeira metade de 2014 se disse a respeito da «União Bancária» – inclusive na campanha eleitoral das eleições para o Parlamento Europeu.
Em contra-corrente com a maré (des)informativa de então, vale a pena revisitar o que disse o PCP sobre esse passo na concretização da gigantesca operação de concentração e centralização do sector bancário na UE a que chamam de «união bancária». Com o avanço deste processo, os Estados perderão o – pouco ou quase nenhum – poder de controlo, regulação e intervenção sobre a banca que ainda detinham vendo assim ainda mais limitada a possibilidade deste sector estratégico ser colocado ao serviço do desenvolvimento económico.
A falsa alegação de que (...) se colocará um ponto final na salvação da banca por parte dos Estados, (...) trata-se de uma manobra para dissimular o facto de serem sempre os povos e os recursos públicos a assumir os incomportáveis custos e riscos da especulação e gestão danosa do sector financeiro.
O avanço no processo de constituição da «união bancária» (...), feito em nome da defesa da União Económica e Monetária e do Euro, acrescentará consequências profundamente negativas às que já hoje os trabalhadores e o povo português vivem.
O desfecho encontrado para o caso BANIF será em parte consequência do conjunto de regras e orientações que deu corpo à «União Bancária». Essa legislação, sublinhe-se, entrou plenamente em vigor apenas no passado dia 1.
Em qualquer caso, nenhuma legislação ou constrangimento externos poderão ser invocados para impedir o povo português de recuperar a soberania sobre este sector estratégico para a economia nacional, recuperando o controlo público sobre a banca comercial e reforçando os mecanismos de controlo e supervisão deste sector. Nenhuma imposição supranacional poderá obnubilar a compreensão dessa cristalina verdade, que o PCP levou ao debate na Assembleia da República, na antevéspera natalícia: «Só a banca nas mãos do povo não rouba o País.»