A Festa vai ao Cinema

Com olhos de ouvir!

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O Cinema pertence, claramente, às formas de Arte cujos vários componentes e dispositivos, criativos e técnicos, agem dialeticamente entre si, da forma mais intensa, ágil e surpreendente.
Não por acaso, o Cinema encontra-se também no número daquelas artes que, de modo significante e privilegiado, mais intervêm e influem sobre a produção, a representação e o movimento das ideias, fazendo-o em graus de rofundidade que vão do puro entretenimento ao ensaio mais elaborado.
Vem a propósito interrogarmo-nos, entretanto, como será que funcionam, neste fascinante e ambivalente processo de fruição e percepção, no que concerne à sua importância e peso relativos, dois dos nossos sentidos essenciais – a visão e o ouvido ou, se quisermos, o ouvido ea visão?
No tradicional Concerto que já se tornou um hábito realizar no Palco 25 de Abril na noite de abertura da Festa do «Avante!», a nossa proposta este ano é a de que prestemos particularatenção à Música no (ou para) o Cinema.
Quer dizer: à Música dos grandes mestres de todos os tempos que o Cinema aproveitou para jogar com as estórias, as imagens, os bonecos, os diálogos, os ruídos ou mesmo outras músicas; ou à Música que os grandes compositores de bandas sonoras inventaram para fazer contrastar emoções, sopesar reflexões ou simplesmente ser ouvida nos próprios locais onde se desenrola a paixão, a intriga ou a luta.
Que o mesmo é dizer: propomos que tentemos «escutar» aquilo que porventura não «vemos» quando vamos ao Cinema.
Com olhos de ouvir!

 

Richard Strauss

Assim Falava Zaratustra, op. 30

(Abertura)

Entre as obras musicais «clássicas» que o realizador Stanley Kubrick utilizou no seu 2001, A Odisseia no Espaço, a abertura de Assim Falava Zaratustra (Richard Strauss) é, pelo simbolismo das imagens a que ficou ligada, das que maior impacte suscitou em todo o filme, enquanto intensa experiência audiovisual. Nesta, a montagem elíptica do plano do osso-ferramenta-arma, arremessado ao ar por um homem-macaco, com o plano de uma estação nuclear fortemente armada deslocando-se em pleno espaço, marca simbolicamente, pela escala e pela associação das duas imagens, um dos seus rasgos mais memoráveis.

Inspirado pelas ideias filosóficas e pela obra homónima de Nietsche, este poema sinfónico é uma das expressões máximas dos postulados estéticos de Strauss, para o qual nenhuma distinção válida haveria que estabelecer-se entre «música programática» e «música abstracta» (ou «absoluta»); e o fragmento que ouviremos neste concerto evoca da melhor maneira uma das sequências iniciais do filme, a ela se adequando inteiramente.

 

2001: Odisseia no Espaço

(2001: A Space Odyssey) EUA, 1968

Real. Stanley Kubrick

(com Keir Dullea, Gary Lockwood,

William Sylvester)

Ao contrário de outros filmes citados neste concerto — cujo pioneirismo cinematográfico é inegável mas cujo conteúdo «científico», mesmo tratando-se de mundos ficcionais, não resiste, por assim dizer, à comparação com a realidade –, dir-se-ia que os dispositivos iconográficos, tendencialmente verosímeis, da antecipação que os argumentistas Stanley Kubrick e Arthur C. Clarke fizeram a partir do conto The Sentinel, escrito por este último, são hoje comprováveis a posteriori, tão verídicas e familiares se nos afiguram as representações dos objectos, das máquinas ou do espaço interestelar: a bem dizer, elas entram-nos amiúde em casa, com o maior dos à-vontades, em qualquer noticiário elevisivo.

O pormenor distintivo – o pequeno «pormenor» que nos ocupa e nos acompanha desde que nos conhecemos e nos estudamos – reside na postura desrazoável que subjaz à materialização desta genial (mas submissa) profissão de fé na supremacia da Máquina sobre o Homem.

 

John Williams

Banda Sonora Original

Exemplo paradigmático da arte e do ofício de John Williams, um dos mais sensíveis e criativos compositores do moderno cinema-espectáculo, este, assim chamado, main theme (tema principal), associado a outros temas «secundários» não menos importantes – citados, recuperados e tratados de múltiplas formas em todos os filmes da série Indiana Jones –, ficou muito justamente associado a uma nova linha de entretenimento, transformado em arte por cineastas como Spielberg ou Lucas. E deu início, de facto, a um conceito estético totalmente renovado de como encarar, elevando-o, o lado funcional deste domínio musical. Ainda por cima, neste caso concreto, a nova partitura de John Williams reforça e corresponde inteiramente à atmosfera mais sofisticada que o terceiro capítulo da série readquiriu, por contraposição a um segundo capítulo que de algum modo desiludira os fanáticos do género.

 

Indiana Jones e a Grande

Cruzada

(Indiana Jones and the Last Crusade)

EUA, 1989

Real. Steven Spielberg

(com Harrison Ford, Sean Connery,

Alison Doody)

O filme original e as suas sequelas constituem como que o regresso ao mundo dos seriais de aventuras dos anos 30/40, aqui revisitado por Steven Spielberg, o criador da série e um dos mais talentosos manipuladores dos mecanismos do género, vindo como outros da formação cinéfila universitária.

Pelos nossos olhos desfilam as inverosímeis aventuras de um herói de banda desenhada, à maneira dos «heróis de cordel» de filme B; já não tosca e pobremente filmadas, a deixar campo livre à imaginação fértil dos miúdos das matinées de todos os Coliseus, Olímpias e Politeamas deste mundo, mas servidas por um prodigioso e eficaz manancial tecnológico capaz de fabulosamente encenar, montar e sonorizar a materialização da própria imaginação.

 

Richard Wagner

A Cavalgada das Valquírias

Quem, pela primeira vez, utilizou A Cavalgada das Valquírias no cinema foi David W. Griffith, em O Nascimento de Uma Nação (1915).

Localizada na Cena I do Acto III da ópera A Valquíria de Richard Wagner (ela própria fazendo parte, como segunda jornada, da sua monumental tetralogia O Anel dos Niebelungos), tornou-se há muito, quando isolada, uma peça célebre e indispensável do repertório concertístico internacional.

Servida por uma orquestração grandiosa e gerando uma intensidade sonora esmagadora, a sua utilização por Francis Ford Coppola numa sequência visual fortíssima – o ameaçador surgimento, detrás de uma montanha (e filmada por uma teleobjectiva!) de uma esquadrilha de helicópteros que vai bombardear uma aldeia vietnamita – tornou-se exemplar da utilização da música no grande ecrã. Desligando-se da sua função original

e «ganhando» progressivamente uma espessura totalmente diversa, ela começa por ser proveniente dos poderosos altifalantes colocados no helicóptero que comanda o cobarde ataque para depois se transformar num comentário e sublinhado musical de um significado terrível.

 

Apocalypse Now

EUA, 1968

Real. Francis Ford Coppola

(com Martin Sheen, Marlon Brando,

Robert Duvall)

Este célebre filme de Francis Ford Coppola — ameaçado, à partida, pelas maiores dúvidas sobre o seu êxito ou inêxito, dada a crueza e sensibilidade do tema — acabou por resultar num verdadeiro monumento cinematográfico, marcado pela desmesura, pela polémica, pela asfixia e pelo espanto. E tem a servi-lo, nos principais papéis, um punhado de grandes actores, tão delirantes quanto demenciais na pele das principais personagens de uma estória cujo pano de fundo é uma agressão iníqua e trágica entre as demais: a Guerra do Vietname.

Entre os principais rumores de bastidores que também ficaram a marcar o filme, citam-se, a título de xemplo, apenas três: a paranóica exigência do ditador Ferdinando Marcos (então detentor do poder nas Filipinas, onde as filmagens se localizaram) de que lhe fossem cedidos alguns helicópteros para atacar forças de guerrilheiros rebeldes (!); o assustador ataque de coração de Martin Sheen, que levou à interrupção das filmagens; ou os caprichos de Marlon Brando (pago a um milhão de dólares por semana), actuando com frequência à margem do script do filme e exigindo ser filmado na maior das penumbras...

 

Camille Saint-Saëns

Dança Macabra op. 40

A utilização da música neste filme, por Jean Renoir, contribuiu em larga medida para a própria complexidade de uma banda sonora de leitura particularmente engenhosa na decifração (por entre ruídos que por vezes os submergem) dos vários níveis e simultaneidade dos diálogos e pelo uso criativo de trechos musicais Mozart, Strauss ou Chopin.

Ao contrário de outras obras incluídas neste concerto, a Dança Macabra op. 40 de Camille Saint-Saëns não tem uma instrumentação muito densa, estando quase sempre em relevo o concertino (1.º. Violino) da orquestra em diálogo com o tutti. Mas o seu próprio carácter narrativo fê-la adaptar-se muito bem a outros enredos e mesmo a outros géneros, como séries de televisão, desenhos animados, teatro, etc.

 

A Regra do Jogo

(La Règle du Jeu) FRA, 1939

Real. Jean Renoir

(com Marcel Dalio, Nora Gregor,

Paulette Dubost)

Imaginando-a mais como um divertimento do que como um manifesto de crítica social, que também o é, o realizador francês Jean Renoir encenou esta fantasia dramática à maneira dos libretos de ópera de Beaumarchais.

Estudo fortemente crítico e irónico da burguesia nas vésperas da guerra, esta obra-prima aborda o enfrentamento de dois mundos – o dos grandes senhores e o dos seus servos – escalpelizados pela fina contundência e genialidade de um grande cineasta.

Um filme incompreendido e maldito no seu tempo e que, depois de ter sofrido inúmeras mutilações e proibições (primeiro, julgado como «desmoralizante» pelo Governo de Vichy; depois, interdito pelo ocupante nazi), constitui hoje, sobretudo após o restauro de 1952, uma obra de culto.

 

Maurice Jarre

Banda Sonora Original

Tendo na sua vasta obra partituras compostas para filmes como Os Olhos sem Rosto (1960, Georges Franju), o seu primeiro êxito internacional, Drama no Espelho (1960, Richard Feischer), a sua primeira presença em Hollywood, e nada menos que três Óscares para Música Original – Lawrence da Arábia (1962), Doutor Jivago (1965) e Passagem para a Índia (1984), todos realizados por David Lean –, Maurice Jarre pertence ao privilegiado núcleo de compositores europeus que melhor souberam aproveitar as condições objectivas e a oportunidade que lhes foi aberta pela capacidade económica dos grandes estúdios para a invenção e construção de bandas sonoras de grande porte.

Em particular, aquela que compôs para Lawrence da Arábia, distingue-se pela insinuante emoção do tema principal, inteiramente adequado à personagem que serve mas também ao fascinante ambiente natural em que a acção do filme se desenrola e, tal como lhe é habitual, o gosto pelas frequentes deambulações harmónicas está mais uma vez aqui presente.

 

Lawrence da Arábia

(Lawrence of Arabia)

GBR, 1962

Real. David Lean

(com Peter O’Toole, Alec Guiness,

Anthony Queen)

Trata-se de um dos filmes mais ambiciosos e conseguidos de um mestre do cinema dos grandes espaços – David Lean –, aqui encenando o percurso e a estória do tenente T. E. Lawrence, quesabemos ter sido encarregado pelos britânicos de levar socorro ao príncipe Faiçal, ameaçado pelos turcos, tendo esta aventura como pano de fundo a partilha do império turco pela França e pela Inglaterra...

Uma interpretação magistral de Peter O’ Toole, na pele de uma personagem real cuja ambiguidade – meio-aventureiro, poeta, mercenário ou ingénuo – tanto a composição do actor como a direcção de Lean nos revelam com grande intensidade emocional.

 

Richard Addinsel

Concerto de Varsóvia

Construído à maneira dos mais célebres concertos para piano e orquestra do período do romantismo (não podendo deixar de nos ocorrer, por exemplo, a memória de opus congéneres de Rachmaninoff), os temas principais desta obra num único andamento ficaram para sempre intimamente ligados ao carácter melodramático do filme de Brian Desmond Hurst.

Exemplo perfeito da utilização ambivalente da música em cinema – alternadamente como música ouvida em cena (já que tocada em público pelo protagonista masculino) e transformada em comentário musical ao desenvolvimento da estória e dos diálogos – Concerto de Varsóvia é, sem dúvida, um dos momentos mais reconhecíveis de todo este concerto de abertura da Festa.

 

Aquela Noite em Varsóvia

(Dangerous Moonlight) GBR, 1941

Real. Brian Desmond Hurst

(com Anton Walbrook, Sally Gray,

Derrick De Marney)

Produzido em 1941, Aquela Noite em Varsóvia tem a chancela da sucursal londrina da norte-americana RKO e o tom melodramático dos filmes patrióticos e de período britânicos. Durante a invasão da Polónia pelo III Reich, um pianista-piloto-de-guerra polaco conhece uma jornalista norte-americana, que viria a reencontrar depois em Nova Iorque, para onde se exilou, com ela casando. Regressado à Europa, alista-se voluntariamente pela RAF britânica, tendo saído gravemente ferido de uma missão suicida contra a aviação nazi durante a Batalha de Inglaterra e recorda, na sua convalescença, os tempos do seu primeiro encontro amoroso na Varsóvia bombardeada.

 

Sergei Prokofiev

Suite: Ivan, O Terrível, op. 116

Dança dos Oprichnicks

Esta composição é um prodígio de intensidade dramática, a exemplo da obra que, com idêntica finalidade, o mesmo Prokofiev escrevera para a banda sonora de Alexandre Nevsky, outra obra genial de Eisenstein. A Suite Ivan, O Terrível, op. 116 só veio a público na sua actual versão após a morte do compositor, como oratória para narrador, solistas vocais, coro e orquestra, reorquestrada por Abram Stasevic.

Ela é igualmente conhecida dos melómanos como música de cena para o bailado do mesmo título criado conjuntamente pelo compositor Mikhail Chulaki e pelo coreógrafo Yuri Grigorovich. O excerto extraído da partitura original do grande compositor russo – Dança dos Oprichnicks sublinha, no filme, as cenas de repressão por parte da guarda pessoal do czar, levando à letra as ordens e as leis por aquele proclamadas.

 

Ivan, O Terrível

(Ivan Grozzny)

URSS, 1945

Real. Sergei Eisenstein

(com Nicolai Cherkasov, Lyudmila

Tselikovskaya, Serafima Birman)

Acabado de coroar, Ivan IV, que pretende limitar os privilégios dos boiardos, prepara-se para fazer face às intrigas do palácio. Depois de casar, leva a cabo as suas intenções e conquista Kazan. Entretanto, de regresso a Moscovo, cai doente e a czarina é envenenada, vítima do levantamento da oposição. Mas a vingança de Ivan, apoiado por todo o povo, será terrível!

No dizer do cineasta francês Éric Rhomer, Ivan, O Terrível «é um drama, é um fresco, é uma arquitectura, é uma ópera, enquanto obra capaz de, separadamente, aguentar a comparação com o mais belo dos dramas, dos frescos, dos monumentos, das óperas deste mundo; e, no entanto, como filme que é, exerce um sui generis poder de fascínio.»

Trilogia deixada inacabada (quanto à sua terceira parte) por Sergei Eisenstein, Ivan, O Terrível é um dos maiores filmes da História do Cinema, uma obra-prima através da qual o realizador como que atinge, quanto ao significado e quanto à forma, o cume das suas inovações.

 

Paul Dukas

O Aprendiz de Feiticeiro

Constituindo um exemplo paradigmático (e, à data, dos únicos) de como associar a música «clássica» à imagem cinematográfica, Fantasia compreende na sua versão original oito sequências de desenhos animados, intimamente ligadas a oito peças de grandes compositores, entre os quais Tchaikowsky, Beethoven, Mussorgsky ou Schubert.

Por exemplo, a conhecida peça que ouviremos neste concerto – o scherzo sinfónico O Aprendiz de Feiticeiro, do compositor francês Paul Dukas – foi utilizada para uma das melhores sequências do filme, a terceira, na qual o celebérrimo Rato Mickey (qual criatura escapando ao criador) se solta do mestre Yen-Sid e dá largas à sua própria magia.

 

Fantasia

EUA, 1940

Real. James Algar, Walt Disney

Convocando a arte de sessenta desenhadores de animação sob a direcção de onze realizadores, supervisionados estes por Ben Sharsteen e Walt Disney, Fantasia é ainda hoje um dos filmes mais conseguidos no que toca à criação de imagens para ilustrar a música – e, como tal, um exemplo oposto a todos os outros que ilustram este concerto. As oito sequências que resultaram desta máquina de produção dão corpo a uma obra então experimental (e por vezes brilhante) no domínio do desenho animado.

 

Giuseppe Verdi

A Força do Destino (Abertura)

Estreada em 22 de Novembro de 1862 no Teatro Bolschoi Kamenny de São Peterburgo, esta ópera em 4 actos é uma das mais célebres em todo o repertório operístico e, seguramente, uma das mais magistrais obras-primas de Verdi.

O libreto foi escrito por Francesco Maria Piave a partir da peça teatral espanhola Don Álvaro o la fuerza del sino, sendo a sua abertura, quando ouvida isoladamente, uma peça habitual em concertos sinfónicos.

Sujeita a várias revisões pelo punho do próprio Verdi, mesmo depois de ter sido levada à cena em diversas capitais mundiais, A Força do Destino foi apresentada finalmente na sua versão mais conhecida no Teatro La Scala de Milão, em 1869.

 

Uma Abelha na Chuva

POR, 1972

Real. Fernando Lopes

(com Laura Soveral, João Guedes,

Zita Duarte)

A exemplo do uso fortemente intrincado dos diálogos, da música e dos ruídos em outros momentos da banda sonora do filme de Fernando Lopes, não é de leitura imediata a inesperada inserção deste muito conhecido excerto musical na construção de uma das mais elaboradas sequências de todo o cinema português.

Em boa verdade, entram neste jogo dialéctico múltiplos planos de «leitura» (visualização, audição) e seu significado convergente ou divergente, e isto a partir de vários eventos: a representação, num pequeno palco de província, de O Amor de Perdição (Camilo Castelo Branco) por um grupo de teatro amador; a circunstância de um dos actores dessa representação ser também uma das personagens do próprio filme (o cocheiro Jacinto); a transformação de um excerto da narrativa original do romance de Carlos Oliveira num «monólogo interior», tornado gestualmente sensual, da principal personagem feminina (D. Maria dos Prazeres); a montagem dos olhares de diversas figuras da estória presentes no espaço desta representação; e, finalmente, a síntese destes diversos planos de entendimento criada pela associação dramática (que não deixa de ser também cultural) de uma trama exógena (A Força do Destino), ópera contemporânea do romance de Camilo Castelo Branco.

 

Hector Berlioz

A Danação de Fausto – Marcha

Húngara

Eis mais um exemplo, por excelência, da utilização de música composta para um determinado «programa» como peça funcional para um outro «programa» totalmente distinto.

Mais habitualmente ouvida em salas de concerto do que em teatros de ópera, dada uma certa indefinição entre os géneros ópera e cantata sendo mesmo descrita, pelo próprio Berlioz, como uma lenda dramática A Danação de Fausto, escrita para quatro vozes solistas, foi inspirada na sua génese pela leitura de uma tradução do poema dramático Fausto (Johann W. Goethe) e estreada na Opéra Comique de Paris em 6 de Dezembro de 1946. Este muito conhecido trecho orquestral está situado na terceira cena da primeira parte da obra.

 

A Grande Paródia

(La Grande Vadrouille)

FRA, 1966

Real. Gérard Oury

(com Bourvil, Louis de Funès,

Claudio Brook)

Nesta tragicomédia de Gérard Oury, um dos maiores êxitos de bilheteira do cinema francês de todos os tempos, protagonizada por alguns dos seus mais famosos comediantes, as peripécias da acção passam-se durante a II Guerra Mundial, quando a tripulação de um bombardeiro da RAF britânica abatido nos céus de Paris tenta escapar com a ajuda de membros e simpatizantes da Resistência para a parte do território ainda não tomada pelo ocupante nazi.

 

Nino Rota

Banda Sonora Original

Sendo mais conhecido pela generalidade do público como um dos mais criativos compositores do cinema mundial (a par do seu compatriota Ennio Morricone), é certo que encontramos entre as obras compostas por Nino Rota diversas óperas, bailados, música de concerto e música para o teatro.

Entretanto, o nome de Rota está também naturalmente associado a filmes que fizeram história, desde logo muitas das obras inesquecíveis de Federico Fellini como O Sheik Branco (1952), Os Inúteis (1953), A Estrada (1954), As Noites de Cabíria (1957), A Doce Vida (1960), Amarcord (1973) ou Ensaio de Orquestra (1978) – mas também ao cinema de outros mestres, como Visconti, Monicelli, Vidor, Clément, sem esquecer a célebre trilogia O Padrinho (Francis Ford Coppola).

Tal como em outras peças musicais saídas do seu punho, a banda sonora original para Fellini, Oito e Meio (1963), de que ouviremos neste concerto um excerto muito conhecido, denota uma especial paixão pela música popular do seu país e pela evocação do som tão singular das bandas filarmónicas, embora o arranjo que ouviremos seja, naturalmente, para orquestra sinfónica.

 

Fellini, Oito e Meio

(8 ½)

ITA, 1963

Real. Federico Fellini

(com Marcello Mastroiani, Anouk

Aimé, Claudia Cardinale)

Geralmente considerado um filme autobiográfico – e a figura central da trama, desempenhada por Marcello Mastroiani, bem como a sua composição histriónica, evocando o próprio Fellini, remetem-nos a todo o momento para essa qualidade – Fellini, Oito e Meio, tal como se intitulou em Portugal, é a estória de um realizador de cinema que procura encontrar paz e sossego após terminada mais uma obra trabalhosa e de grande êxito, sendo constantemente perturbado pela presença real ou imaginária de personagens e intérpretes dos filmes da sua vida.

 

Elmer Bernstein

Banda Sonora Original

Tendo sido dos primeiros a utilizar o jazz como elemento essencial das bandas sonoras para as quais escreveu música – e basta recordar o célebre O Homem do Braço de Ouro (Otto Preminger, 1955) –, Elmer Bernstein foi dos mais reputados compositores para o cinema a criar um estilo eminentemente americano, tanto em termos temáticos como até no sentido geográfico do termo. São conhecidas, por exemplo, as suas obras compostas para filmes épicos de aventuras, como é o caso de A Grande Evasão (John Sturges, 1963); mas é ao western que o seu nome ficou, por maioria de razões, domínio, sem dúvida que a partitura para Os Sete Magníficos figura como uma obra brilhante e exemplar, com uma orquestração esplendorosa que nos remete para a grande influência que na música cinematográfica também exerceu um dos maiores compositores norte-americanos da área erudita: Aaron Colpand.

 

Os Sete Magníficos

(The Magnificent Seven)

EUA, 1960

Real. John Sturges

(com Yul Brynner, Steve McQueen,

Elli Wallach)

Este remake do célebre filme Os Sete Samurais, do grande mestre nipónico Akira Kurosawa, ficou célebre no panorama do western norte-americano e não apenas pelo brilhantismo que John turges colocou na transposição da estória original para uma realidade tão diversa e afastada. A circunstância ficou aliás assinalada com a oferta de uma espada de samurai por Kurosawa a Sturges depois de o primeiro ter visto o filme!

Interessante é que, dos sete mercenários contratados por camponeses mexicanos para se vingarem das pilhagens de um bando de malfeitores, apenas um acaba por revelar-se friamente sensível à venda de «serviços» em troca de dinheiro... Um dos achados do filme, reside, aliás, na caracterização interior e na composição exterior de cada um dos sete «magníficos» e seus adversários, interpretados por um punhado de actores então consagrados ou em vias de o ser, com relevo para a espantosa personagem composta por Elli Wallach.

 

John Williams

Banda Sonora Original

Tendo colaborado em mais de 60 filmes de nomeada (percorrendo quase o espectro integral dos vários géneros cinematográficos) e em cerca de uma dezena de shows televisivos (filmes, séries, ocumentários), John Williams é um dos maiores melodistas da moderna cinematografia de grande espectáculo. Fazendo integrar e desenvolver em obras de grande fôlego os inesquecíveis temas que inventa, como se de autênticos Leitmotive (na acepção clássica) se tratasse, Williams não deixa de ser, ao mesmo tempo, um orquestrador exímio, capaz de tirar o máximo partido dos mais inventivos e inesperados efeitos instrumentais.

A partitura de A Guerra das Estrelas, saga que ajudou a catapultar para os píncaros da fama, encontra-se justamente entre as suas obras mais consistentes, servindo de forma admirável esse mundo de ficção e entretenimento.

 

Guerra das Estrelas

(Star Wars)

EUA, 1977

Real. George Lucas

(com Mark Hemill, Harrison Ford,

Carrie Fisher)

Tal como o era a banda desenhada de Flash Gordon em que George Lucas inicialmente se terá inspirado, Guerra das Estrelas acabou por configurar um imenso conto de aventuras em várias partes e um fabuloso e inovador espectáculo cinematográficoenvolvido por uma banda sonora que faz estremecer a estereofonia da sala escura.

Semeado pelos «efeitos especiais» que marcaram um género eminentemente criado pelo cinema industrial e traduzindo uma das faces mais insinuantes da cultura popular urbana dominante, o seu lado mais visual poderá não provocar hoje particular surpresa ao habitual espectador de cinema.

Mas não é de subestimar, neste ou naquele momento da saga, um singular aprofundamento do «estudo psicológico» das suas personagens.




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A Festa vai ao Cinema

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Sexta-feira, 4 – 21.30 Horas – Palco 25 de Abril

O espectacular concerto de abertura da Festa deste ano terá como repertório excertos célebres das bandas sonoras de filmes representativos de várias cinematografias mundiais.
Em destaque, estarão peças musicais pertencentes ao repertório de grandes compositores da História da Música, que o Cinema utilizou, e ainda partituras muito conhecidas escritas por compositores que a História do Cinema já consagrou.
Em palco estarão a Orquestra Sinfonietta de Lisboa, sob a direcção de Vasco Pearce de Azevedo e o pianista António Rosado.
 

A música nos filmes

Existe um preceito que costuma ser usado com frequência no sentido de constituir uma delimitação quando se pretende definir e analisar a Música para o Cinema: quanto menos ela se notar, melhor ela é. Mas será que este postulado, cujo alcance se compreende, constituirá uma regra? E quantos casos conhecemos queresultam em excepções flagrantes a essa mesma regra?

Programa

OrquestraSinfonietta de Lisboa Direcção Vasco Pearce de Azevedo Vasco Pearce de Azevedo é, desde 1995, Maestro titular e director musical da Orquestra Sinfonietta de Lisboa, com a qual tem realizado estreias absolutas de obras de Eurico Carrapatoso,...