Do PEC para o pacto
No PEC 4 – afinal, o programa que o PS defende e propõe aos portugueses – preconizava-se medidas que, praticamente intocáveis, acabaram por entrar no «programa de ajustamento económico e financeiro» imposto pelos credores e aceite pelos partidos da troika da submissão, que entre si alternam governo com oposição. Aliás, logo nas primeiras sessões de negociação entre o governo demissionário do PS e o alternante PSD, Passos Coelho explicava aos jornalistas que o PEC 4 era o ponto de partida para o «programa de ajuda». Francisco Assis, que encabeça agora a lista de candidatos do PS, afirmou o mesmo na rádio TSF, a 8 de Abril de 2011.
Tudo pelo défice
Na continuação dos OE de 2010 e de 2011 e dos três primeiros PEC, o programa de Março de 2011 colocava como objectivos garantir um défice orçamental de 4,6 por cento do PIB, no final de 2011, e reduzi-lo para três por cento, em 2012, e dois por cento, em 2013. O ponto de partida era um défice que o governo colocava em 7,3 por cento, no final de 2010, e que posteriormente seria revisto para quase dez por cento.
Várias medidas adicionais deveriam vigorar ainda em 2011. Visavam o «reforço da redução da despesa pública face ao previsto no OE», num valor equivalente a 0,8 por cento do PIB (171 mil milhões de euros, em 2011), ou seja, um novo corte de quase 1400 milhões de euros (85 milhões na Saúde, 170 milhões no sector empresarial do Estado, 170 milhões em custos administrativos e operacionais da Administração Pública, 170 milhões na Segurança Social, 765 milhões em investimento público e despesas de capital).
A parte principal do PEC 4 estava nas medidas para 2012 e 2013, que serviriam para alcançar uma redução do défice num montante equivalente a 3,7 por cento do PIB (mais de 6300 milhões de euros), por diminuição da despesa (2,4 por cento) e aumento da receita (1,3 por cento). Tal exigiria, por exemplo:
- menos 42,5 milhões de euros em pensões, alargando a CES (contribuição extraordinária de solidariedade), criada em 2010;
- menos 680 milhões nos custos com medicamentos e prestações dos subsistemas públicos de saúde (além do aumento dos custos pagos pelos utentes);
- menos cinco por cento, em 2012, e quatro por cento, em 2013, nos orçamentos dos hospitais;
- menos 510 milhões por encerramento de escolas e outros cortes na Educação;
- menos 510 milhões em «consumos intermédios» na Administração Pública (incluindo uma «racionalização da rede de tribunais»);
- um «controlo da atribuição das prestações sociais» que representaria 340 milhões de euros, traduzindo-se em mais restrições no acesso às prestações, congelamento do IAS (indexante dos apoios sociais) e aumento de cobrança de contribuições dos trabalhadores;
- reduções no sector empresarial do Estado (como indemnizações compensatórias no serviço público de rádio e televisão, planos de investimentos e custos operacionais (em infraestruturas de transportes, escolas, outros equipamentos), num total de 765 milhões;
- menos 170 milhões nos orçamentos das regiões autónomas e autarquias locais;
- mais 850 milhões, por redução das deduções e benefícios em IRS (a par de alterações ao IRC);
- mais 255 milhões por «convergência» do IRS de reformados e pensionistas com o do trabalhadores no activo (nivelamento por baixo da dedução específica);
- mais 680 milhões por «racionalização» da estrutura de taxas do IVA;
- mais 255 milhões por aumento de outros impostos sobre o consumo.
Para lá das contas
No capítulo das «reformas estruturais», o programa de privatizações apontava para que fossem arrecadados 6470 milhões de euros, de 2010 a 2013, com antecipação de operações já incluídas no PEC 3.
Na Justiça, a alteração do mapa judiciário deveria ficar concluída em Setembro desse ano.
Reportando a uma decisão do governo de 17 de Março de 2011, no PEC 4 preconizava-se a dinamização do mercado do arrendamento «reforçando os mecanismos para assegurar que os proprietários têm meios à sua disposição para reagir perante o incumprimento do contrato e resolver a situação em tempo justo», ou três meses para concluir uma acção de despejo.
Prosseguindo as orientações do «plano estratégico dos transportes 2010-2020», destacava-se as medidas já em curso (desclassificação de linhas e troços da rede ferroviária, concessão do transporte ferroviário nas áreas de Lisboa e do Porto, gestão conjunta da Carris e do Metro de Lisboa e da STCP e do Metro do Porto, fusão da Transtejo e Soflusa, mexidas na legislação sobre trabalho portuário, privatização da EMEF e da CP Carga).
No PEC 4 figuravam diversas medidas para o mercado de trabalho, assumindo dar seguimento à «reforma» de 2009. Apresentando como resultado desta a «melhoria da flexibilidade e adaptabilidade», voltava-se a invocar o aumento da competitividade da economia e a criação de emprego como objectivos de um novo ataque aos trabalhadores.
O governo assumia que iria implementar as medidas que estavam a ser cozinhadas para o «acordo» na Concertação Social, com vista a reduzir as indemnizações por despedimento, restringir o acesso ao subsídio de desemprego, bem como a sua duração máxima e o seu valor.
O aumento do salário mínimo, negado em Janeiro de 2011, ficaria dependente da avaliação da situação económica.
A extensão de acordos colectivos de trabalho (para abrangerem empresas não filiadas nas estruturas patronais subscritoras) também passaria a depender de uma avaliação do seu «impacto na competitividade dos sectores e empresas».