A caminho da guerra

Jorge Cadima

Os povos do mundo já pagaram um preço demasiado elevado

Da Ucrânia à Venezuela, de África e Médio Oriente aos mares da China, multiplicam-se os sinais de que a tendência predominante nas potências imperialistas é para a guerra generalizada, o autoritarismo mais violento e o fascismo. Seja pela via da agressão aberta e directa, seja através de grupos mercenários a soldo, os imperialismos em crise sistémica estão em guerra aberta contra os povos e em guerra surda entre si, como ainda recentemente comprovou o telefonema da «diplomata» dos EUA Victoria Nuland ao seu embaixador em Kiev. No combate contra governos que se atrevem a dar mostras de soberania, lançam mão de paleo-fascistas, cuja ligação directa às hordas nazis na II Guerra Mundial ninguém pode contestar. Tal como o fundamentalismo religioso mais retrógrado e reaccionário é kosher na Líbia ou na Síria, também o anti-semitismo dos fascistas ucranianos torna-se «europeu» e «democrático». A sra. Nuland confessou numa Conferência Internacional de Negócios patrocinada pela petrolífera Chevron (13.12.13) que nos últimos 20 anos os EUA gastaram mais de cinco mil milhões de dólares a subsidiar a subversão na Ucrânia. Entretanto são retiradas as ajudas alimentares aos norte-americanos com fome porque «não há dinheiro».

Quem ache que isto é exagero faria bem em dar ouvidos a alguém que vem do coração do sistema e lhe conhece as entranhas, embora seja hoje dissidente. Paul Craig Roberts (PCR) pertenceu a governos de Ronald Reagan e foi vice-editor do Wall Street Journal. Hoje escreve que «a União Soviética servia de entrave ao poder dos EUA. O colapso soviético possibilitou a ofensiva neo-conservadora pela hegemonia mundial dos EUA. A Rússia sob Putin, a China e o Irão são os únicos entraves à agenda neo-conservadora. Os mísseis nucleares russos e a sua tecnologia militar tornam a Rússia o mais forte obstáculo militar à hegemonia dos EUA. Para neutralizar a Rússia, os EUA romperam acordos [...] expandiram a NATO para antigas partes constitutivas do império soviético […] e Washington alterou a sua doutrina de guerra nuclear para permitir um ataque nuclear inicial. […] O desenlace provável da ameaça estratégica audaciosa com que Washington está a confrontar a Rússia será a guerra nuclear» (14.2.14). Sob o título «Washington empurra o Mundo para a guerra», PCR escreve (14.12.13): «a guerra fatal para a humanidade é a guerra com a Rússia e a China para a qual Washington está a empurrar os EUA e os estados fantoches de Washington na NATO e na Ásia. […]. A única razão por que Washington quer estabelecer bases militares e mísseis nas fronteiras da Rússia é para negar à Rússia a possibilidade de resistir à hegemonia de Washington. A Rússia não ameaçou os seus vizinhos e […] tem sido extremamente passiva face às provocações dos EUA. Isto está a mudar […] tornou-se claro para o governo russo que Washington prepara um ataque inicial decapitador contra a Rússia. […] A postura militar agressiva de Washington face à Rússia e a China indicia uma auto-confiança extrema que costuma conduzir à guerra». Sobre a Ucrânia, escrevia PCR há mais de um mês (4.12.13): «A UE quer que a Ucrânia adira para que a Ucrânia possa ser pilhada, tal como o foram a Letónia, Grécia, Espanha, Itália, Irlanda e Portugal. […] Os EUA querem a adesão da Ucrânia para poderem aí posicionar bases missilísticas contra a Rússia».

O ex-governante de Reagan não reconhece que o entrave decisivo ao belicismo imperialista é a luta dos povos. Mas é mais lúcido do que muitos que se afirmam “de esquerda” quando adverte a China e a Rússia contra as ilusões e concessões. «É pouco provável que a China se deixe intimidar, mas poderá minar-se caso a sua reforma económica abra a economia chinesa à manipulação ocidental» diz PCR (4.12.13), que também alerta contra a «quinta coluna» de «licenciados programados pelos EUA que regressam à China». E é cáustico para com a tolerância da Rússia e da Ucrânia «que de forma tola permitiram que grande número de ONG financiadas pelos EUA agissem como agentes de Washington sob a capa de “organizações dos direitos do homem”, “construtores de democracia”, etc.» (14.2.13). As ilusões sobre a natureza do imperialismo e sobre a traição dos aspirantes a serventuários ricos pagam-se caro. Os povos do mundo já pagaram um preço demasiado elevado.




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