Leituras de Verão

Filipe Diniz

Temos que confessar: por vezes há falta de assunto. Um dos recursos possíveis, porque nunca é tempo perdido, é ir revisitar os clássicos. Por uma questão de método, que escrevia Lénine há 100 anos? De entre os muitos artigos publicados em 1913, dois exemplos de curiosa actualidade. Num caso se se tiver em conta que a actual primeira figura do Governo tem no currículo uns obscuros negócios de armamento. Noutro, se se considerar como a actual crise do capitalismo agudiza a tensão social mesmo entre os países mais ricos, como sucede na Alemanha onde, segundo dados do Eurostat, a população em risco de pobreza ou exclusão social sobe de 15,9 milhões em 2010 para mais de 16 milhões em 2011.

Eis então alguns trechos de dois artigos. Para os actualizar bastará recordar que, na altura, Lénine ainda não redigira a sua obra sobre o imperialismo, cuja potência dominante era então a Inglaterra.

«Centenas e centenas de milhões de rublos são gastos pela Inglaterra e por outros países com os preparativos para a guerra – naturalmente que tudo isso se faz no interesse da paz, no interesse da salvaguarda da cultura, no interesse da pátria, da civilização, etc.

Mas vemos como accionistas e directores das empresas de construção naval, de fabrico de pólvora, de dinamite, de canhões, etc., almirantes e eminentes homens de Estado da Inglaterra de ambos os partidos: o conservador e o liberal. A chuva de oiro cai directamente nos bolsos dos políticos burgueses. […]»

«Ministros e membros da câmara conservadores e liberais, quase todos eles fazem parte dessas firmas. Uma mão lava a outra. […] O mesmo se passa, evidentemente, em todos os países capitalistas. Os governos são empregados de classe dos capitalistas1”.

«A carestia da vida e a opressão dos trusts provocam uma agudização sem precedentes da luta económica, que pôs em movimento os próprios operários ingleses, os mais corrompidos pelo liberalismo. Sob os nossos olhos amadurece uma crise política até no mais “inabalável” país burguês-junker, a Alemanha2». 

É sempre útil revisitar os clássicos.

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1 VILOE 6T, T2, pp.100, 101
2 VILOE 6T, T2, p. 89




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