Sobre os partidos políticos europeus
Escrevia-se nesta coluna, na semana passada, a propósito dos partidos políticos europeus – no quadro da participação nas eleições europeias de 2014 – que a social-democracia e a direita «procuram legitimar estas estruturas supranacionais com um carácter e uma acção contrários aos interesses dos trabalhadores e dos povos no momento historicamente determinado, em que a ruptura com a UE e a sua superação é mais do que nunca condição fundamental para a emancipação dos povos e a construção de uma outra Europa». O projecto de fortalecimento dos partidos políticos europeus é um objectivo das classes dominantes e dos partidos a elas associados. Esse debate será um dos que teremos que travar até às próximas eleições, que se realizarão em Maio do próximo ano.
Independentemente das teorizações académicas que se poderia fazer em torno das temática da democracia, da participação popular e da proximidade geográfica das populações, a história recente portuguesa – o fascismo de regime centralista – dá-nos o melhor exemplo de que democracia rima com descentralização. Foi, em Portugal, o Poder Local Democrático, conquistado em Abril, que potenciou maiores níveis de participação política, uma maior proximidade entre os órgãos públicos e as populações e, portanto, entre estas e os processos decisórios.
O federalismo europeu pretende impor estruturas supranacionais – nas quais se integram os partidos políticos europeus – cada vez mais distantes e desligadas do escrutínio público, como a realidade demonstra.
A recomendação da Comissão Europeia (CE), publicada no passado dia 12 de Março, traça como um dos objectivos o reforço da «eficácia dos partidos políticos europeus», «recomendando» – antes impondo, à boa maneira da CE – que os partidos políticos «antes e durante as eleições deverão especificar em que partido político europeu estão filiados».
Está, também, neste momento, em discussão, uma proposta de Regulamento da Comissão Europeia sobre o Estatuto dos partidos políticos europeus e das fundações políticas europeias, que visa o seu fortalecimento, considerando a CE que estes são fundamentais para a «articulação das vozes dos cidadãos ao nível europeu». Partidos e fundações políticas essas que, para serem reconhecidas por este estatuto, devem, segundo o regulamento, respeitar os princípios fundadores da União Europeia – «Os partidos políticos europeus e as fundações políticas europeias associadas que pretendam obter o reconhecimento dessa qualidade a nível europeu, através do estatuto jurídico europeu, e beneficiar de financiamento público a partir do orçamento geral da União Europeia, devem respeitar certos princípios e preencher certas condições, nomeadamente os valores em que a União Europeia se funda, previstos no artigo 2.º do Tratado da União Europeia e na Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia» e seguir critérios de uniformização organizativa. «São estabelecidos princípios e requisitos mínimos para a governação e a organização interna dos partidos políticos europeus, nomeadamente para garantir o seu empenhamento em estabelecer e respeitar normas rigorosas de democracia interna.» Simplificando: os partidos políticos europeus – e, por essa via, todos aqueles que os integram – têm que respeitar princípios estipulados no Tratado (ex: o compromisso com o mercado interno e a livre circulação de mercadorias, expresso no texto) e adoptar formas de funcionamento dos partidos burgueses, como condição para o seu financiamento.
É evidente o objectivo. Esvaziar a importância dos partidos políticos nacionais, das suas especificidades e identidades próprias, e criar aglomerados políticos que se distanciem cada vez menos uns dos outros, pois a sua existência está previamente condicionada a objectivos ideológicos e de identificação com o projecto da UE. Ou seja, limitar as possibilidades de intervenção dos partidos que afirmam uma posição contra o domínio imperialista da UE, uma posição de ruptura que é, sem dúvida, a tomada de uma posição de classe.