Em Chipre como em Portugal
As decisões tomadas pela União Europeia (UE) em relação a Chipre revelam a entrada num novo patamar do desenvolvimento da crise na e da UE. Retratam de forma nua e crua os perigos que enfrentam os trabalhadores e os povos de um poder político que na UE, como em Portugal, está totalmente submetido às exigências do grande capital neste momento de profunda crise. Um poder que vem eliminando quaisquer resquícios de direitos soberanos e democráticos que ainda subsistam no emaranhado de instrumentos jurídico-políticos que enformam as relações no seio da UE. A recusa do parlamento cipriota de aceitar a primeira versão da decisão do eurogrupo fez estalar o verniz: o Banco Central Europeu (BCE) ameaçou «fechar a torneira» dos euros, seguiram-se declarações dos ministros das finanças francês e alemão, dos seus presidentes, de Durão Barroso, de vários comissários. Num mar de imensas contradições, teve lugar nova negociata e nova estratégia tendo por base as mesmas acusações: Chipre «é uma economia de casino», um «local de lavagem de dinheiro sujo da Rússia», o seu sector financeiro está sobredimensionado face ao PIB do país.
Independentemente das situações particulares que possam existir e que aparentam não ser muito diferentes das existentes em vários países da UE, os cônsules do império, ou seja as grandes potências e o grande capital, decretaram a destruição da economia cipriota impondo-lhe uma receita em muito semelhante àquela que têm vindo a impor ao nosso País: privatizações, liberalizações, destruição de serviços públicos, destruição de direitos sociais e laborais... Lá como cá, um governo da mesma família política assumiu a responsabilidade de cumprir o «desígnio nacional» que não parece ser o de garantir os direitos do povo e defender a sua soberania mas antes: aplicar a receita para Chipre não sair do euro. Permanência no euro que parece por agora suspensa pelos limites impostos ao dogma neoliberal da livre circulação de capitais na UE. Há quem afirme mesmo que, em Chipre, existe actualmente uma moeda diferente do euro, ou seja, as medidas que limitam a circulação de capitais fazem do euro em Chipre uma moeda de um valor diferente daquela que circula nos restantes países da zona euro. A limitação à livre circulação de capitais demonstra que afinal um dos dogmas sobre os quais é fundada a UE – e com fortes responsabilidades na crise na e da UE – também pode ser questionado, sempre e quando estejam em causa os objectivos visados com a sua aplicação. A maior ameaça para o povo cipriota, como para o povo português, é o poder de classe que é exercido na UE e nos nossos países. O que antes não era sequer questionável é hoje não só questionado como, com um governo ao serviço da burguesia nacional e estrangeira, poderá ser um elemento mais para a destruição da economia de Chipre. Lá como cá, a questão do poder, da sua natureza e ao serviço de que classe está esse poder é a questão chave para uma política ao serviço dos trabalhadores, do povo e do País. É por isso que para Portugal, e tendo em conta a nossa grave situação económica e social, o PCP considera que é necessário romper com a política de direita e os seus intérpretes e que apenas um governo que leve à prática uma política patriótica e de esquerda poderá servir os interesses dos trabalhadores, do povo e do País. É urgente retirar o País da recessão económica em que está mergulhado, aumentando a produção nacional, valorizando os trabalhadores, os seus salários e direitos. E para isso é urgente implementar uma política soberana que crie as rupturas necessárias com as políticas e os tratados da UE que hoje impedem o direito inalienável ao desenvolvimento do País e do nosso povo. E são necessárias convergências com outros países dentro da zona euro e na UE, reforçar e diversificar relações económicas que sejam complementares e que tenham como prioridade a produção local e nacional, a manutenção e criação de empregos com direitos. Uma das questões imediatas com que Portugal, como Chipre, estão confrontados é o «custo» económico e social da sua permanência na União Económica e Monetária, ou seja, no euro. O complexo de relações, dependências e interdependências existentes na UE e na zona euro não permitem soluções simples ou fáceis. A sua permanência no entanto afigura o aumento dessa complexidade e dificuldade em dose redobrada