Médicos com adesão quase total à greve

Luta histórica na saúde

A greve dos mé­dicos, nos dias 11 e 12, teve adesão pra­ti­ca­mente total nos hos­pi­tais e cen­tros de saúde de todo o País e ga­nhou forte ex­pressão pú­blica com a ma­ni­fes­tação de quarta-feira, em Lisboa.

O Go­verno aceitou ne­go­ciar e parar a aqui­sição de horas de ser­viço

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Em vá­rias uni­dades, os ele­vados ní­veis de adesão à greve, ve­ri­fi­cados no pri­meiro dia, re­gis­taram uma su­bida, na quinta-feira. As de­cla­ra­ções dos di­ri­gentes sin­di­cais (da FNAM e dos seus sin­di­catos, e também do SIM, que em con­junto con­vo­caram esta luta) e do bas­to­nário da Ordem (que desde o início apoiou a po­sição sin­dical) foram con­fir­mando aquilo que se ob­ser­vava a olho nu e que res­sal­tava nos no­ti­ciá­rios: ní­veis de adesão ge­ral­mente su­pe­ri­ores a 90 por cento, quer nos cen­tros de saúde e uni­dades de saúde fa­mi­liar, quer nos hos­pi­tais, par­ti­cu­lar­mente nas con­sultas e in­ter­ven­ções ci­rúr­gicas agen­dadas (uma vez que as ur­gên­cias, como ser­viços mí­nimos, foram es­cru­pu­lo­sa­mente as­se­gu­radas, com os pro­fis­si­o­nais des­ta­cados a exi­birem o seu apoio à greve).

O mo­tivo mais pró­ximo para a con­vo­cação desta jor­nada foi o con­curso pú­blico lan­çado pelo Mi­nis­tério da Saúde, para con­tra­tação de dois mi­lhões e meio de horas de tra­balho mé­dico através de em­presas de tra­balho tem­po­rário e ao mais baixo preço por hora. Mas esta foi, afinal, mais uma peça que veio acen­tuar o des­con­ten­ta­mento por vá­rios anos de po­lí­ticas de «ema­gre­ci­mento» do Ser­viço Na­ci­onal de Saúde. O corte de verbas tem re­flexos na re­mu­ne­ração de todo o pes­soal, mas também nas con­di­ções em que fun­ciona o SNS pú­blico, ao mesmo tempo que abre campo aos grupos pri­vados, que vêem na Saúde mais uma fonte de lucro.

Assim, como in­sis­ten­te­mente foi sa­li­en­tado pelos di­ri­gentes mé­dicos, a greve de 11 e 12 de Julho não li­mitou os seus ob­jec­tivos à de­fesa da dig­ni­dade da pro­fissão, abar­cando igual­mente a con­tes­tação das sub-con­tra­ta­ções e a de­fesa in­tran­si­gente do Ser­viço Na­ci­onal de Saúde, que foi cons­truído com o es­forço dos vá­rios pro­fis­si­o­nais e deu ao País in­di­ca­dores que co­lo­caram Por­tugal entre os me­lhores a nível mun­dial.

Com­pro­misso

O mi­nistro Paulo Ma­cedo, que nos dias que an­te­ce­deram a greve se des­do­brou em anún­cios de in­flexão pe­rante a co­mu­ni­cação so­cial, acabou por aceder ao pe­dido que a FNAM e o SIM lhe en­vi­aram dia 12, para uma reu­nião no dia se­guinte. Nesta reu­nião, já não com­pa­re­ceram apenas os se­cre­tá­rios de Es­tado, mas também o mi­nistro (au­sente nas reu­niões re­a­li­zadas desde o início do ano e que le­varam a FNAM a alertar, em me­ados de Abril, que o con­flito seria ine­vi­tável, face ao com­por­ta­mento anti-ne­go­cial do Go­verno).

O com­pro­misso al­can­çado nesta sexta-feira, 13, de não pro­ceder à con­tra­tação de «horas» en­quanto, até 31 de Agosto, não for de­cla­rado o total de vagas mé­dicas a pre­en­cher por con­curso, ficou fir­mado em papel tim­brado do Mi­nis­tério. Mas a «nota», subs­crita pelo mi­nistro, pela FNAM e pelo SIM, foi di­vul­gada pela fe­de­ração e não surgiu no portal do Go­verno (aqui, uma in­for­mação sobre de­cla­ra­ções do mi­nistro até des­ta­cava que «a con­tra­tação de mé­dicos à hora con­ti­nuará “nos pró­ximos anos”, para su­primir ne­ces­si­dades»).

Nesse do­cu­mento, o mi­nistro e três se­cre­tá­rios de Es­tado, a par dos re­pre­sen­tantes sin­di­cais, de­claram «re­co­nhecer a ne­ces­si­dade do per­ma­nente re­forço do Ser­viço Na­ci­onal de Saúde e da me­lhoria da qua­li­dade dos cui­dados de saúde pres­tados aos ci­da­dãos» e con­cordam «con­cluir o pro­ce­di­mento ne­go­cial da con­tra­tação co­lec­tiva da car­reira mé­dica até 31 de Agosto de 2012, de­sig­na­da­mente apro­vando a ta­bela re­mu­ne­ra­tória das 40 horas e pro­ce­dendo à al­te­ração do re­gime de tra­balho em ser­viço de ur­gência».

O Go­verno as­sumiu ainda que «de­cla­rará o total das vagas de postos de tra­balho mé­dico do Ser­viço Na­ci­onal de Saúde, a pre­en­cher por pro­ce­di­mentos con­cur­sais, que devem de­correr nos termos dos ins­tru­mentos de re­gu­la­men­tação co­lec­tiva do tra­balho mé­dico em vigor, por forma a evi­den­ciar o ca­rácter re­si­dual do de­no­mi­nado “Con­curso das Horas de Tra­balho Mé­dico”». O Mi­nis­tério da Saúde com­pro­meteu-se «a não pro­ceder à con­tra­tação de “horas” nesse âm­bito e até à con­clusão do pre­sente pro­ce­di­mento ne­go­cial da con­tra­tação co­lec­tiva, a não ser em casos de na­tu­reza ur­gente de­vi­da­mente fun­da­men­tados».


So­li­da­ri­e­dade com os mé­dicos em greve

Uma de­le­gação da CGTP-IN, com­posta por Ar­ménio Carlos, Se­cre­tário-geral, José Au­gusto Oli­veira e José Carlos Mar­tins, da Co­missão Exe­cu­tiva, ma­ni­festou «so­li­da­ri­e­dade» e «total apoio» à luta da classe mé­dica, tendo par­ti­ci­pado, no dia 11, na grande ma­ni­fes­tação de mé­dicos em greve, junto ao Mi­nis­tério da Saúde, «luta exem­plar» que pa­ra­lisou os ser­viços de saúde por todo o País, sem pre­juízo de serem ga­ran­tidos os in­dis­pen­sá­veis cui­dados ur­gentes de saúde aos do­entes deles ca­re­cidos».

«Os mé­dicos lutam pelas suas car­reiras, es­ta­bi­li­dade e dig­ni­dade pro­fis­si­onal, contra a pre­ca­ri­e­dade e os ne­gó­cios do tra­balho tem­po­rário na con­tra­tação de pro­fis­si­o­nais pre­cá­rios, que sem es­ta­bi­li­dade não as­se­guram con­ti­nui­dade, im­pos­si­bi­li­tando os in­dis­pen­sá­veis laços de co­nhe­ci­mento e con­fi­ança com os do­entes», sa­li­enta, em nota de im­prensa, a In­ter­sin­dical, que va­lo­riza a luta «em de­fesa do Ser­viço Na­ci­onal de Saúde (SNS)», o qual «temos de manter e me­lhorar para que ga­ranta cui­dados de saúde de qua­li­dade e aces­sí­veis aos por­tu­gueses, con­ver­gindo nessa exi­gência com a luta de sempre da CGTP-IN em de­fesa do SNS e do di­reito cons­ti­tu­ci­onal à saúde».

De­fender o SNS

A ma­ni­fes­tação contou ainda com a pre­sença de Paula Santos, de­pu­tada do PCP na As­sem­bleia da Re­pú­blica. «Sem car­reira mé­dica, sem vín­culo pú­blico, não é pos­sível ga­rantir a con­ti­nui­dade do SNS uni­versal e geral», re­feriu a di­ri­gente co­mu­nista, fri­sando que o que es­tava ali em causa «não é só os di­reitos destes pro­fis­si­o­nais às suas car­reiras», mas, so­bre­tudo, «a de­fesa dos utentes, a de­fesa do SNS como con­sagra a Cons­ti­tuição da Re­pú­blica».

No pri­meiro dia da greve, 11 de Julho, o Se­cre­ta­riado da Di­recção da Or­ga­ni­zação Re­gi­onal de Braga do PCP também emitiu uma sau­dação à luta dos mé­dicos, onde acusa o Go­verno PSD/​CDS de atacar vi­o­len­ta­mente o SNS e o di­reito geral e uni­versal dos por­tu­gueses à Saúde.

«Os pro­fundos cortes do Or­ça­mento do Es­tado na Saúde e nou­tras áreas so­ciais, im­postos no pacto de agressão e acor­dados pelo PS e pelos par­tidos do ac­tual Go­verno no me­mo­rando as­si­nado com a troika, estão a levar mais fundo a de­gra­dação e perda de qua­li­dade do SNS no ca­minho da sua li­qui­dação», acusam os co­mu­nistas de Braga, dando conta que no dis­trito «são mi­lhares de ci­da­dãos que di­a­ri­a­mente deixam de poder re­correr aos cui­dados de saúde, seja pelo en­cer­ra­mento de uni­dades e ser­viços de saúde pró­ximos (ma­ter­ni­dades, va­lên­cias hos­pi­ta­lares, cen­tros e ex­ten­sões de saúde), seja pelo custo in­com­por­tável e mul­ti­pli­cação de taxas mo­de­ra­doras nos hos­pi­tais pú­blicos e cen­tros de saúde, seja pela falta de mé­dicos e ou­tros pro­fis­si­o­nais, pela re­ti­rada de am­bu­lân­cias do INEM e de apoios ao trans­porte de do­entes não ur­gentes, pelo ra­ci­o­na­mento ou re­cusa de meios fun­da­men­tais de di­ag­nós­tico e tra­ta­mento».

Utentes com a luta

Também o Mo­vi­mento de Utentes de Saúde Pú­blica do Dis­trito de Évora ma­ni­festou so­li­da­ri­e­dade com a ini­ci­a­tiva e os ob­jec­tivos da greve dos mé­dicos, tendo exi­gido do Go­verno, de acordo com o que está es­ta­be­le­cido na con­tra­tação co­lec­tiva, que re­a­lize «con­cursos pú­blicos nos vá­rios es­ta­be­le­ci­mentos pú­blicos de saúde, com vista a re­cru­ta­mento de mé­dicos e en­fer­meiros, não re­cor­rendo sis­te­ma­ti­ca­mente a em­presas de alu­guer de mão-de-obra sem ne­nhuma ga­rantia de qua­li­dade e de di­reitos pro­fis­si­o­nais que con­tratam».




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