As freguesias são de Abril
O Avante! dá nota noutras páginas da extraordinária manifestação em defesa do poder local democrático e contra a extinção de freguesias que inundou Lisboa no sábado passado, 31 de Março, com mais de 200 mil participantes cheios de combatividade e alegria.
Como não podia deixar de ser, a operação de desvalorização da manifestação, na comunicação social e não só, começou cedo. Sendo a redução do número de autarquias uma imposição do pacto de agressão, foram convocados os habituais especialistas em justificar o injustificável para tentar menorizar e apagar a força real desta manifestação.
Recorreram a três linhas essenciais de desvalorização: o número, os participantes e o preço das camionetas. Uns, afinaram pelo diapasão do costume sempre que há manifestações desta dimensão no nosso País, desvalorizando o número das participações, para poder chegar à conclusão de sempre – neste Portugal de brandos costumes o povo não luta, é submisso e medroso. Vê-se.
Outros apressaram-se a classificar a manifestação como um desfile etnográfico, insistindo nos habituais pormenores caricaturais, desta vez cobertos de um bafiento preconceito suplementar contra o povinho rústico que veio à cidade mostrar o seu atraso.
Desta vez, porém, ensaiaram um argumento novo: aqui d’el-rei que foi o erário público a pagar as camionetas em que o povo se transportou. Tentando desvalorizar esta e condicionar lutas futuras, falaram como se órgãos democraticamente eleitos – que é o que são as Juntas de Freguesia – não tivessem toda a legitimidade do mundo para decidir aplicar os seus meios próprios a apoiar a deslocação das populações. Estes comentadores de serviço são em regra os mesmos que defendem a utilização do dinheiro dos contribuintes em praticamente tudo: para tapar buracos no BPN e no BPP, para sustentar parcerias público-privadas, pagar juros à troika, indemnizar repetidamente a Lusoponte, transportar concorrentes para o Preço Certo ou figurantes para os pic-nics da Sonae. Ou seja: o dinheiro dos contribuintes pode servir para tudo – menos para a participação popular. Pois enganam-se: as freguesias são de Abril e fazem muitíssimo bem em defendê-lo.