As freguesias são de Abril

Margarida Botelho

O Avante! dá nota noutras páginas da extraordinária manifestação em defesa do poder local democrático e contra a extinção de freguesias que inundou Lisboa no sábado passado, 31 de Março, com mais de 200 mil participantes cheios de combatividade e alegria.

Como não podia deixar de ser, a operação de desvalorização da manifestação, na comunicação social e não só, começou cedo. Sendo a redução do número de autarquias uma imposição do pacto de agressão, foram convocados os habituais especialistas em justificar o injustificável para tentar menorizar e apagar a força real desta manifestação.

Recorreram a três linhas essenciais de desvalorização: o número, os participantes e o preço das camionetas. Uns, afinaram pelo diapasão do costume sempre que há manifestações desta dimensão no nosso País, desvalorizando o número das participações, para poder chegar à conclusão de sempre – neste Portugal de brandos costumes o povo não luta, é submisso e medroso. Vê-se.

Outros apressaram-se a classificar a manifestação como um desfile etnográfico, insistindo nos habituais pormenores caricaturais, desta vez cobertos de um bafiento preconceito suplementar contra o povinho rústico que veio à cidade mostrar o seu atraso.

Desta vez, porém, ensaiaram um argumento novo: aqui d’el-rei que foi o erário público a pagar as camionetas em que o povo se transportou. Tentando desvalorizar esta e condicionar lutas futuras, falaram como se órgãos democraticamente eleitos – que é o que são as Juntas de Freguesia – não tivessem toda a legitimidade do mundo para decidir aplicar os seus meios próprios a apoiar a deslocação das populações. Estes comentadores de serviço são em regra os mesmos que defendem a utilização do dinheiro dos contribuintes em praticamente tudo: para tapar buracos no BPN e no BPP, para sustentar parcerias público-privadas, pagar juros à troika, indemnizar repetidamente a Lusoponte, transportar concorrentes para o Preço Certo ou figurantes para os pic-nics da Sonae. Ou seja: o dinheiro dos contribuintes pode servir para tudo – menos para a participação popular. Pois enganam-se: as freguesias são de Abril e fazem muitíssimo bem em defendê-lo.

 



Mais artigos de: Opinião

O «bom caminho»

A apresentação pela Comissão Europeia da terceira avaliação da aplicação do mal dito «programa de assistência financeira» a Portugal dificilmente poderia ser mais elucidativa quanto aos objectivos e natureza do pacto de agressão. Peter Weiss,...

Privilégios e excepções

Isto do valor das palavras anda cada vez mais embaralhado – e não por acaso. Atentemos na palavra privilégio, que já não se aplica àqueles que vivem, cada vez melhor, do trabalho roubado aos outros, mas tão somente a qualquer coisa que limite a liberdade dos capitalistas,...

Heróis

Em todas as batalhas há heróis e as que se inserem na luta de classes não são excepção. Ao contrário de outros que, justa ou injustamente, povoam o nosso imaginário colectivo, os heróis destas últimas batalhas não figurarão nos livros...

O caminho para a paz e os seus inimigos

Aqueles que planearam e anseiam por fazer na Síria o que fizeram na Líbia têm vindo a ver, até ao momento, os seus criminosos intentos gorados. A coberto de uma resolução do Conselho de Segurança, que consideram «histórica», os EUA e a NATO, com o...

A luta. O Partido. O Congresso

Ao lançar a preparação do XIX Congresso, o Comité Central assinalou que ela devia ser feita em andamento, ou seja, que «o processo da sua preparação e realização deve inserir-se no trabalho geral do Partido, integrando as suas exigências específicas com o desenvolvimento da luta de massas, a intervenção e o reforço do Partido», assumindo, em toda a plenitude, a importância e a singularidade da sua realização, «numa fase da vida nacional marcada pelas consequências nefastas decorrentes da natureza exploradora do capitalismo e da sua crise estrutural, do processo de integração na União Europeia e da política de direita das últimas décadas agora expressas no pacto de agressão subscrito pelo PS, PSD, CDS-PP com o FMI, a União Europeia e o BCE, com o apoio do Presidente da República».