O pacote da exploração
Na apreciação da proposta de lei sobre a revisão do Código do Trabalho, a CGTP-IN prova que o Governo produziu um pacote legislativo de exploração e empobrecimento.
Todas as medidas visam baixar o valor do trabalho
Analisando medida após medida, a central demonstra que os custos salariais não são o principal problema da economia nem das empresas e que pagar menos aos trabalhadores não gera maior competitividade nem produtividade.
A posição da CGTP-IN, assumida no quadro da apreciação pública da Proposta de Lei N.º 46/XII, foi divulgada à comunicação social anteontem, último dia desta fase do processo legislativo, que teve origem próxima no «compromisso» firmado na Concertação Social por patrões, Governo e UGT.
Em declarações de dirigentes e em comunicados sindicais, nestas quatro semanas de apreciação pública, ficou assegurado que a luta dos trabalhadores e dos sindicatos para evitar que as intenções plasmadas no diploma sejam postas em prática, irá continuar a ter como palco principal as empresas e locais de trabalho, mesmo que a maioria parlamentar imponha a aprovação da proposta do Governo. Com a greve geral, amanhã, esta resistência ganha uma mais ampla dimensão imediata e firma raízes para os próximos combates.
Nem alvo, nem tiro
Na primeira parte do documento, fazendo uma apreciação geral da proposta de lei, a CGTP-IN observa que «o verdadeiro objectivo de todas as alterações é a diminuição dos custos com o trabalho», mas «o problema fundamental da competitividade das empresas e do País não reside nos custos excessivos com o trabalho».
Hoje em dia, «o problema mais grave que as empresas enfrentam não é o aumento da produção, mas sim vender o que já produzem, num contexto de quebra acelerada do rendimento disponível». A Intersindical salienta que «a economia portuguesa depende sobretudo de actividades dirigidas ao mercado interno» e que «o consumo privado representa, por si só, dois terços do Produto Interno Bruto e é responsável pela maioria do emprego». Citando um inquérito recente do INE, a central nota que «o principal obstáculo à produção ou à actividade das empresas reside nas insuficiências da procura», factor que «está claramente a aumentar em resultado das medidas de austeridade».
Além de descrever mal o alvo, o Governo procurou disfarçar a verdadeira direcção do tiro.
As alterações ao Código do Trabalho – modificado pela última vez há apenas três anos – visariam fomentar a produtividade e a competitividade da economia nacional e criar emprego, assegurando a protecção do trabalhador. As declarações que «cinicamente» – como acusa a CGTP-IN – foram inscritas no Preâmbulo da proposta são concretizadas em sentido completamente inverso. As alterações «têm como objectivo essencial ampliar desmesuradamente o poder patronal, entregando aos patrões mais poder para despedir, para alterar os horários a seu belo prazer e generalizar a precariedade, reduzir os salários e outras formas de retribuição, destruir a contratação colectiva, substituindo-a pela negociação individual de trabalho, eliminar feriados e dias de férias, tendo como consequência um enfraquecimento sem precedentes da posição dos trabalhadores na relação laboral», como se verifica ao analisar cada uma delas.
E, em vez da propalada criação de emprego, «a conjugação da recessão com o enfraquecimento da legislação de protecção dos trabalhadores e com a redução de indemnizações pode fazer acelerar os despedimentos».
Com elevado desemprego e longa duração do trabalho, «não será de esperar que possa haver criação de emprego com estas medidas». A CGTP-IN alerta que «o resultado será, antes, um prolongamento da recessão em que o País está mergulhado».
Salários assaltados
A CGTP-IN frisa que «o mercado de trabalho português não é rígido», pois tem já elevada incidência de contratos não permanentes, os quais representam mais de 70 por cento das novas contratações. Em média, a remuneração-base por hora de um trabalhador contratado a termo é 25 por cento inferior à de um efectivo nas mesmas funções.
Ora, a facilidade da contratação a termo já permite hoje que as empresas substituam trabalhadores com contratos permanentes, mais direitos e salário mais elevado, por trabalhadores com vínculos precários e salários mais baixos, «mas não ao ritmo desejado pelo patronato». Ao propor medidas tendentes a facilitar o despedimento, o Governo reforça «o papel do desemprego como ponto de passagem para a precariedade e a redução dos salários».
O valor da remuneração por hora seria reduzido também com a eliminação de quatro feriados e três dias da majoração das férias, pois isso iria aumentar o tempo efectivo de trabalho, estimando a Inter que, com aquelas duas medidas, as mesmas horas de trabalho poderiam ser obtidas com menos 98 mil trabalhadores.
A aplicação dos regimes de adaptabilidade e «bancos de horas» poderiam provocar perdas de rendimento que, para alguns trabalhadores, superariam por ano o valor de três salários.
A central volta a lembrar que, «se a duração do trabalho fosse o determinante da competitividade, o País seria altamente competitivo», uma vez que «em Portugal, cada trabalhador efectua, em cada ano, cerca de 48 horas mais do que um trabalhador na média da UE a 15 e cerca de 76 horas mais do que na Alemanha».