Os jornalistas combatentes de Baba Amr
Terá sido a repressão de Baba Amr a maior ficção desde o 11 de Setembro? É o que Thierry Meyssan procura demonstrar neste primeiro artigo sobre o assunto em que aborda a alegada evasão de jornalistas ocidentais e mostra que alguns deles faziam parte do exército sírio «livre».
Os jornalistas evacuados de Baba Amro publicarão a sua própria versão dos acontecimentos. Continuarão a mentir como até agora fizeram.
Os países membros da NATO e do Conselho de Cooperação do Golfo (CCG) não conseguiram lançar um ataque convencional contra a Síria. No entanto, andaram a prepará-lo durante dez meses, conduzindo uma guerra de baixa intensidade, acompanhada de uma guerra económica e mediática. A cidade de Homs tornou-se um símbolo deste confronto. O chamado exército «sírio» livre tomou os bairros de Baba Amr e Inchaat para aí proclamar um emirado islâmico, o que revela bem qual é seu projecto político.
Com o apoio da Rússia, que continua traumatizada pela experiência do emirado islâmico de Itchkéria [Tchetchénia], e da China – ambos empenhados em que Damasco proteja os seus cidadãos – o Exército Nacional Sírio iniciou o assalto em 9 de Fevereiro, depois de se terem esgotado todas as possibilidades de mediação. Já derrotado, o exército «sírio» livre entrincheirou-se numa zona de cerca de 40 hectares, que foi imediatamente cercada por forças do Governo, acabando por cair no dia 1 de Março. Para se vingarem, os últimos elementos armados do emirado massacraram cristãos em duas aldeias que atravessaram, antes alcançarem o refúgio no Líbano.
Durante todo este período, os principais media foram utilizados para camuflar a realidade sórdida e cruel deste emirado, substituindo-a por uma ficção de revolução reprimida. Com um cuidado particular procurou-se fazer crer que milhares de civis foram bombardeados pela artilharia e mesmo pela aviação síria. No coração do sistema de propaganda esteve um Centro de Imprensa, coordenado por jornalistas israelitas e utilizado pelos canais de televisão ao serviço da Coligação, nomeadamente a Al-Jazeera (Qatar), Al-Arabiya (Arábia Saudita), France24 (França), BBC (Reino Unido) e CNN (Estados Unidos).
Entre a versão da NATO e do CCG, por um lado, e a da Organização de Cooperação de Xangai, por outro, a opinião pública no Ocidente e no Golfe pode legitimamente interrogar-se sobre quem diz a verdade. Vamos procurar expor elementos decisivos para estabelecer a verdade. Baseamo-nos em vídeos difundidos pelas cadeias ocidentais e dos países do Golfo, testemunhos de sobreviventes recolhidos pela Rede Voltaire na Síria e documentos descobertos no Centro de Imprensa do emirado.
A face dupla dos repórteres ocidentais
Vários jornalistas ocidentais bloqueados no emirado lançaram apelos de auxílio na Internet. Dois deles apresentaram-se feridos e um terceiro parecia de boa saúde. Os respectivos governos fizeram do seu resgate uma questão de princípio. A França enviou um funcionário para negociar com os rebeldes. Outros estados, designadamente a Rússia, procurando fazer baixar a tensão no Levante, ofereceram-se como intermediários.
Eu próprio participei pessoalmente nesse esforço colectivo. Na verdade, uma jornalista recusou uma primeira oportunidade para ser evacuada com a Cruz Vermelha. Receando cair numa armadilha, a jornalista não agarrou a mão que lhe foi estendida. A minha missão tinha duas vertentes. Em primeiro lugar estabelecer um contacto com os meus compatriotas, informá-los do contexto político-militar e facilitar a sua entrega a um funcionário francês incumbido de lhes dar protecção diplomática. Depois, devia informar aqueles que trabalham a favor da paz na região sobre o desenvolvimento exacto dos acontecimentos e avaliar a boa vontade dos protagonistas.
Como é sabido, as negociações fracassaram. Os delegados dos serviços de informações dos diferentes estados envolvidos puderam constatar que as autoridades sírias e as organizações humanitárias fizeram tudo o que estava ao seu alcance, e que o bloqueio era exclusivamente imputável ao exército «sírio» livre.
E qual não foi a surpresa, real ou fingida, dos diferentes negociadores quando, de repente, fomos informados de que os três jornalistas que havíamos tentado evacuar de Homs, e um outro que não quis aceitar a nossa ajuda, tinham atravessado as linhas do exército «sírio» livre e do Exército Nacional Sírio e se dirigiam pelos próprios meios para o Líbano.
Após um momento de confusão e de verificar que as iniciativas paralelas da Rússia não tinham tido melhor sorte que as nossas, apurámos que um comando de uma grande potência ocidental havia evacuado os quatro jornalistas e talvez outras pessoas, enquanto nós arriscávamos inutilmente as nossas vidas. Nestas condições não sinto qualquer obrigação em guardar reserva sobre os pormenores deste caso. Excluirei apenas as referências aos funcionários e personalidades envolvidos para que possam continuar a trabalhar pela paz, embora a menção de certos detalhes pudesse ser pedagógica para os nossos leitores.
Seguramente que os evacuados de Baba Amr publicarão a sua própria versão dos acontecimentos em abono da propaganda atlantista. Continuarão a mentir como até agora fizeram. É precisamente por isso que faço questão de testemunhar sobre o que vi para romper a teia de desinformação que tem sido tecida em tornos destes acontecimentos.
Segundo a versão mediática actual, uma revolução terá sido reprimida selvaticamente. Jornalistas ocidentais, unicamente movidos pela sua vontade de informar, terão chegado para ver e testemunhar. Os insurgidos foram-se entrincheirando progressivamente no bairro de Baba Amr e aí sobreviveram três semanas sob um dilúvio de fogo. Na terça-feira, 22 de Fevereiro, o respectivo Centro de Imprensa terá sido bombardeado com artilharia (lança-mísseis múltiplos GRAD, também conhecidos como «órgãos de Stáline» ou katiuskas). Marie Colvin (Sunday Times) e Rémi Ochlik (IP3 Presse) terão sido mortos durante o bombardeamento, enquanto Édith Bouvier (Le Figaro Magazine) e Paul Conroy (Sunday Times) terão ficado feridos. William Daniels (ex-Figaro Magazine e Time Magazine) ficou junto deles, enquanto Javier Espinosa (El Mundo) se separou do grupo.
Entretanto, os sobreviventes divulgaram quatro vídeos na Internet que nos contam uma história muito estranha.
A morte de Marie Colvin e de Rémi Ochlik
Soubemos da morte de Marie Colvin e de Rémi Ochlik por um vídeo fornecido pelo Exército «sírio» livre. Os seus corpos foram encontrados após a queda do emirado e identificados pelos embaixadores de França e da Polónia (representante do seu homólogo norte-americano). Marie Colvin era conhecida por se vestir bem e pelo contraste da fineza dos seus adereços femininos com a dureza da venda que lhe tapava o olho direito perdido. O vídeo em que vemos apenas os corpos estendidos de costas para cima é autêntico e foi validado pelos vários media que o divulgaram. Os dois jornalistas aparecem em uniforme de militar. Devemos interrogar-nos por que razão este detalhe, que não condiz com a condição de não combatente dos jornalistas num campo de batalha, não suscitou questões por parte do público nem comentários indignados por parte dos profissionais.
Édith Bouvier e Paul Conroy «feridos» no hospital
No segundo vídeo, o doutor Ali, representante no emirado do Crescente Vermelho sírio, um dentista de bairro que se dedicou corajosamente a tratar os feridos, apresenta Édith Bouvier e Paul Conroy, deitados em camas do que parece ser uma enfermaria hospitalar. Depois, um soldado do exército «sírio» livre, que é apresentado como «doutor Mohamed», de bata azul e com um estetoscópio, faz um comentário revolucionário.
Três aspectos devem ser salientados neste vídeo: Édith Bouvier recusa revelar a sua identidade, o que no entanto é revelado aos telespectadores, e tenta esconder a sua cara. Paul Conroy desvia constantemente o olhar, manifestando inquietação e reprovação.
O «doutor Mohammed» é uma estrela dos vídeos da oposição síria. Desempenha o papel de médico revolucionário. Exprime-se numa linguagem imprecisa, sem nenhum vocabulário médico, mas com referências salafistas.
Tudo leva a crer que o «doutor Mohammed» utilizou a situação para envolver o médico do Crescente Vermelho e os dois jornalistas numa pequena encenação, dramatizando o caso de forma ultrajante.
Num terceiro vídeo, o fotógrafo britânico Paul Conroy aparece sozinho, deitado num divã, após ter recebido cuidados médicos. Pede auxílio, mas faz questão de sublinhar que é um convidado, não um prisioneiro.
Parece tão pouco à vontade como da primeira vez e passa algumas indicações aos telespectadores. Apela às «agências globais» a intervir, uma vez que «trabalham no terreno para os mesmos objectivos». Que «agências globais» são estas que teriam o poder de evacuá-lo do emirado? Só pode tratar-se de agências públicas, sejam intergovernamentais como as da ONU, ou nacionais como as agências de informações. Que significa «trabalhar no terreno para os mesmos objectivos»? Não pode estar a referir-se à actividade das Nações Unidas, já que estas não estão vocacionadas para fazer jornalismo. A única interpretação possível é que está a apelar às agências de informações aliadas, invocando a sua ligação a uma agência de informação britânica.
Ao contrário de Marie Colvin, de quem é fotógrafo nas suas reportagens para o Sunday Times, Paul Conroy não enverga uniforme militar no campo de batalha. Não precisa dele para ser identificado.
O «doutor Mohammed» intervém então para nos dar conta do seu diagnóstico. Na véspera, Paul Conroy terá sido ferido na perna por um míssil GRAD. Mostra-nos uma perna envolta numa ligadura imaculada. Apesar da extrema gravidade da ferida ainda fresca, a perna não apresenta o menor inchaço. O «doutor Mohammed», fazendo jus ao seu título, realizou um prodígio médico.
No final da sua intervenção, Paul Conroy acrescenta uma mensagem para tranquilizar «a sua família e os amigos em Inglaterra»: «Estou perfeitamente bem». Se o sentido oculto da frase escapou ao «doutor Mohammed», aqueles que sabem que Paul Conroy é um irlandês do Norte, e não inglês, não terão dificuldade em decifrá-la. O «fotógrafo» dirige-se à hierarquia da agência militar britânica para a qual trabalha, assinalando que esta comédia não os deve induzir em erro: ele está de boa saúde.
Desta vez é Paul Conroy que parece utilizar a encenação do «doutor Mohammed» para fazer passar a sua mensagem, muito embora esteja supostamente imobilizado pelo ferimento.
Num quarto vídeo, gravado e difundido no mesmo dia, Édith Bouvier, deitada na sua cama de infortúnio pede auxílio: 1) pede «o estabelecimento de um cessar-fogo» e 2) «uma viatura hospitalar que a transporte até ao Líbano», para que possa ser rapidamente tratada.
Mas dado que as necessidades manifestadas correspondem a uma trégua [e não a um cessar-fogo] para permitir a passagem de uma ambulância ou de um transporte de modo a ser tratada num hospital, tais reivindicações são totalmente incongruentes.
1) Um cessar-fogo é um acordo que suspende todas as hostilidades entre as partes durante uma negociação política, enquanto uma trégua é uma interrupção dos combates, numa zona determinada e durante um período determinado, para permitir a passagem de pessoas ou de material humanitário.
2) Além disso, o transporte para o Líbano implicaria uma amnistia pelo delito de imigração ilegal, uma vez que Édith Bouvier entrou clandestinamente na Síria ao lado dos rebeldes.
É claro que estas duas exigências não são justificadas, mas correspondem à criação de um «corredor humanitário», tal como é entendido pelo ministro dos Negócios Estrangeiros, Alain Juppé.
Alain Juppé é infelizmente conhecido pela facilidade com que inverte os papéis e pelo uso que faz dos «corredores humanitários». Em 1994 obteve do Conselho de Segurança das Nações Unidas uma resolução autorizando a operação Turquesa, ou seja, a criação de um «corredor humanitário» para permitir que a população hutu do Ruanda não fosse por seu turno massacrada, como vingança dos crimes cometidos pelo Hutu Power, principalmente contra a população tutsie. Sabemos hoje que esse corredor não foi humanitário, mas uma forma de a França evacuar os responsáveis pelos genocídios, misturados com civis, livrando-os de responder pelos seus crimes. Desta vez, Alain Juppé procurava evacuar os grupos armados responsáveis pelas matanças na Síria.
Deve-se, pois, constatar que Édith Bouvier não exprimiu necessidades pessoais, mas que as suas exigências correspondem aos interesses do exército «sírio» livre, que a França defende.
Não surpreende que a jornalista se faça porta-voz de Alain Juppé. Foi contratada para o grupo Figaro por Georges Malbrunot. Este último, segundo as autoridades sírias, foi durante os anos 80 o agente de ligação da DGSE [Direcção Geral da Segurança Exterior, agência francesa de informações externas] com os Irmãos Muçulmanos. Foi preso em Hama e entregue às autoridades francesas, a pedido expresso do presidente François Mitterrand.
Na sequência seguinte, o «doutor Mohammed» explica a situação, e o seu companheiro, o fotógrafo William Daniels (free-lancer na Figaro-Magazine e depois na Time Magazine), insiste em que a situação é urgente. As declarações em árabe são traduzidas para inglês por uma quarta personagem que não aparece na imagem. Por fim, um quinto interveniente, o jovem Khaled Abu Saleh, conclui o pequeno filme com uma tirada revolucionária.
Se bem que nos primeiros vídeos tanto Édith como Paul parecessem renitentes em colaborar com o «doutor Mohammed», agora Édith desempenha de boa vontade o seu papel.
O jovem Khaled Abu Saleh é o chefe do Centro de Imprensa do exército «sírio» livre. Segundo os jornalistas que utilizaram estas instalações, localizadas num edifício vetusto, o Centro dispunha de todo o material de alta tecnologia necessário. Os jornalistas podiam fazer as suas montagens e tinham à disposição equipamento via satélite para emitir em directo. Alguns ironizaram comparando o alto nível deste Centro dos rebeldes com os sistemas de transmissão arcaicos que continuam a ser utilizados pelo Exército Nacional Sírio.
Não temos nenhuma informação sobre os generosos patrocinadores que ofereceram estes equipamentos ultra modernos. Mas a actividade profissional de Khaled Abu Saleh dá-nos uma pista. O jovem revolucionário também é jornalista: correspondente permanente da Al-Jazeera, edita o seu próprio blog no site dessa estação televisiva e trabalha como free lancer na France24, onde é colaborador do programa «Les Observateurs». Ora, estas duas estações via satélite são a vanguarda da propaganda da NATO e do CCG no esforço de justificar a necessidade da mudança do regime sírio, tal como o foram em relação à Líbia.
A título de exemplo da deontologia da estação pública francesa, em 7 de Junho de 2011, a France24 emitiu em directo uma emocionante intervenção telefónica da embaixadora da Síria em França, Lamia Shakkor, anunciando a sua demissão em protesto contra os massacres no seu país. De imediato a máquina diplomática francesa exerceu pressões sobre o conjunto de embaixadores sírios no mundo para que seguissem este belo exemplo. Todavia, apesar de a directora-adjunta da redacção da France24, Renée Kaplan, ter jurado que a voz era a da embaixadora, que conhecia pessoalmente, na verdade a voz emitida era a de Fahd Alargha-Almasri, a esposa do mencionado jornalista Khaled Abu Saleh. A intoxicação foi descoberta.(1)
Sob o impulso de Alain de Pouzilhac e de Christine Ockrent-Kouchner, a France24 e a RFI (Radio France International) deixaram de ser órgãos de informação para se tornarem instrumentos do dispositivo militar e diplomático francês. Assim, em 5 de Julho de 2011, Alain de Pouzilhac, presidente director-geral do sistema Audiovisual Exterior da França (AEF), assinou um protocolo de acordo com Mahmud Shammam, ministro da Informação dos rebeldes líbios, comprometendo-se a criar órgãos de informação anti-Kadhafi e a formar o pessoal necessário para facilitar o derrubamento do «Guia» líbio. O anúncio provocou a fúria dos jornalistas da France24 e da RFI, que se sentiram instrumentalizados numa operação de propaganda. Tudo leva a crer que disposições da mesma natureza foram tomadas parta incentivar «o jornalismo cívico» dos «revolucionários sírios». Neste caso, Khaled Abu Saleh não se limitará a ser correspondente e a fazer colaborações esporádicas, mas terá um papel decisivo na fabricação de informações falsas ao serviço do dispositivo militar e diplomático da França.
Ao princípio, Édith Bouvier parecia reprovar a encenação. Depois, pelo contrário, com o seu colega da France24, colabora e grava um apelo de auxílio que visa despertar a compaixão dos telespectadores para justificar a abertura de um «corredor humanitário», do qual Alain Juppé precisa para evacuar os mercenários do exército «sírio» livre e os seus instrutores ocidentais.
Primeiras conclusões
Nesta fase da análise dos vídeos coloquei várias hipóteses de trabalho: a equipa do Sunday Times (Marie Colvin e Paul Conroy) estava ao serviço do MI6, e a enviada da Figaro Magazine (Édith Bouvier) trabalhava para a DGSE.
O «doutor Mohammed» aproveitou o facto destes jornalistas estarem acamados para gravar mais dois vídeos, e Paul Conroy decidiu enviar um pedido de auxílio aos aliados. Claramente, o colaborador da France24, Khaled Abu Saleh, montou toda esta encenação para lançar a reivindicação de Alain Juppé.
Fracasso das negociações ou mudança na negociação?
Durante as negociações tive oportunidade de prestar vários esclarecimentos que foram tomados em consideração. Mas de cada vez que evoquei as observações que faço neste artigo, responderam-me que o momento não era adequado. Parecia que o exército «sírio» livre se recusava a deixar sair os jornalistas. O urgente era salvá-los. O verdadeiro estatuto de cada um ver-se-ia mais tarde.
No sábado, 25 de Fevereiro, as negociações fracassaram. Para restabelecer o contacto com os takrifistas, os sírios procuravam um xeque moderado com o qual pudessem falar, mas todos os religiosos contactados desistiram receando eventuais represálias. Que fazer? Ficar no local à espera de um xeque para retomar as negociações? Ou regressar a Damasco para descansar em segurança?
A resposta foi dada pelas autoridades sírias, que nos convidaram a regressar, assegurando-nos de que nos informariam logo que surgisse uma nova oportunidade para negociar. De regresso à capital, uma mensagem SMS informou-nos de que as negociações estavam suspensas por 48 horas.
Tal não significava que podíamos divertir-nos, domingo e segunda-feira, enquanto colegas e compatriotas corriam perigo de morte. Outra negociação estava em curso durante essas 48 horas. Pensei naquele momento que os nossos amigos russos se tinham encarregado do assunto.
Na manhã de terça-feira fui acordado por uma amiga, repórter de guerra de um grande órgão francês, que me telefonou para me informar da chegada a Beirute de Paul Conroy e provavelmente de outros jornalistas. Fiquei estupefacto. Foi então a minha vez de acordar um alto responsável sírio que me manifestou a sua perplexidade. Ao cabo de vários telefonemas, ninguém em Damasco sabia nada ou não desejava falar do assunto.
Por fim descobri que o general Assef Chawkat tinha chegado a um acordo com uma alta personalidade francesa das suas relações para dar solução àquele imbróglio. As forças do governo sírio abriram as suas linhas durante a noite, permitindo que os conselheiros franceses e os jornalistas seguissem para o Líbano. O exército «sírio» livre só deu pela fuga pela madrugada. Vendo-se abandonados à sua sorte, os mercenários decidiram render-se e entregaram o seu arsenal, enquanto os islamitas continuaram a recusar os últimos avisos para deporem as armas. O general Assef Chawkat ordenou o assalto final e tomou o emirado em algumas horas, libertando da tirania islamita os civis que ali estavam encurralados.
A partir do seu quartel-general no estrangeiro, o exército «sírio» livre, agora reduzido a quase nada, anunciou a sua «retirada estratégica». Mas como a natureza tem horror ao vazio, o Conselho Nacional Sírio, sedeado também ele no estrangeiro, anunciou a criação de um comité militar composto por peritos sírios e sobretudo estrangeiros. Em quatro dias, a questão militar deslocou-se do campo de batalha para os confortáveis salões dos grandes hotéis parisienses.
_________________
(1)«L’Ambassadeur de Syrie en France victime d’une tentative de déstabilisation», Frédéric Lacastille, InfoSyrie, 7 de Junho de 2011.
Tradição do francês da responsabilidade da redacção do Avante!. Original disponível em www.voltairenet.org/Les-journalistes-combattants-de,onde estão igualmente disponíveis os vídeos aqui mencionados.